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Fidel Castro

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Reflexões do companheiro Fidel

O G-20, a APEC e a extrema-unção da credibilidade

Fidel Castro - Publicado: Sábado, 20 Novembro 2010 01:00

Fidel Castro

Quando um doente está muito grave, de acordo com a prática da Igreja Católica, após a confissão vem a extrema-unção.


Isso é o que tem acontecido com a credibilidade dos Estados Unidos nas reuniões, quase simultâneas do G-20 e da APEC. A partir disso, não se sabe o que é que virá. Talvez procedam a dar-lhe cristã sepultura ou a incinerar os restos da absurda ilusão de que seja possível manter um sistema social incompatível com a vida da humanidade, cujos membros hoje, 14 de novembro de 2010, segundo cálculos rigorosos de caráter internacional, totalizam já 6 884 milhões 307 685 habitantes. A cifra de pessoas que habitam o planeta está aumentando algo mais de 77 milhões anualmente.

Quando examinava a lista de países membros da APEC observava que é chefiada pelos Estados Unidos e pelo Japão, duas das nações mais ricas do mundo; a seguir apareciam o Canadá, a Austrália, a Cingapura e a Coréia do Sul, consideravelmente industrializadas; inclui a Rússia, um Estado poderoso, com importantes recursos naturais, científicos e técnicos, a eles soma-se um grupo dos países emergentes mais importantes, como a China, a Indonésia e outros do Sudeste Asiático banhados pelas águas do Pacífico, atingindo assim os 21 países que se reuniram no Japão nos dias 13 e 14, quase simultaneamente com o G-20, nove deles tinham participado na reunião de Seul para discutirem os problemas mais importantes. Todos os países de ambos os Foros são capitalistas, salvo a China e o Vietnã, aos quais os Estados Unidos tentaram impedir a qualquer custo sua transformação revolucionária.

Na lista de membros da APEC aparece um Estado muito pobre que não tem nada em comum com o resto dos 20 países: a Papua Nova Guiné. Procurei dados sobre esse país, situado no extremo norte do continente australiano. Até sua atual capital Port Moresby tinha chegado MacArthur no ano 1942, bem longe dos japoneses, depois que eles invadiram e ocuparam a principal base norte-americana de sua colônia nas Filipinas, localizada em Luzón, a poucas milhas de Manila.

O que é que se sabe sobre o país incluído no número 17 da lista da APEC? Sabe-se que os seus primeiros habitantes chegaram lá há 45 ou 50 mil anos procedentes do sudeste asiático, no período glacial plistoceno; eram caçadores e recolhedores. Uma segunda onda de migrantes chegou mais de mil anos depois, aproximadamente 3 500 anos antes de Cristo, e foram portadores de uma cultura mais avançada, os que praticavam a horticultura e a pesca, conheciam de navegação e dominavam a elaboração do barro na mesma época que este se desenvolvia na Babilônia.

Os europeus chegaram à Polinésia, tanto pelo Este quanto pelo Oeste; cinco mil anos mais tarde: espanhóis, portugueses, ingleses e holandeses impuseram a colonização baseada nas armas de fogo e nas espadas de ferro; conquistaram os territórios, os seus recursos e escravizaram seus habitantes.

Ainda admitindo que contribuíssem com conhecimentos e avanços de sociedades com maior desenvolvimento cultural do que algumas comunidades humanas que habitavam os territórios isolados banhados e separados pelas águas do Pacífico; no entanto, em grande parte da Ásia e do Oriente Médio existiam civilizações muito mais avançadas que a Europa daquela época. Os conquistadores impuseram a força de suas armas em territórios como a China, a Índia e o Oriente Médio, que foram o berço de civilizações milenares, quando a Europa era território disputado pelas tribos bárbaras.

As potências coloniais dignaram-se conceder a independência a Papua Nova Guiné no mês de setembro de 1975.

Segundo o censo do ano 2000, a população de Papua Nova Guiné atingiu a cifra de 5 milhões 190 mil 800 habitantes, o seu território tem uma extensão de 462 840 quilômetros quadrados.

Apesar de seus enormes recursos naturais: o petróleo, o cobre e o ouro, que constituem 80 por cento de suas exportações, a Papua Nova Guiné é o país do mundo que tem a menor esperança de vida ao nascer. A sua abundante riqueza pesqueira é explorada por empresas estrangeiras e está sendo muito afetada pelas mudanças climáticas das correntes marinhas do Pacífico. Entre os anos 1995 e 1997 a produção de café, de cacau, de chá, de açúcar e de coco diminuir consideravelmente como resultado das secas.

É o país com maior número de idiomas, atingindo a cifra de 820, o que equivale a 12% dos 7 536 idiomas que, segundo os especialistas, existem no mundo. Muitas aldeias têm a sua própria língua.

Não longe dali se encontra a República Democrática do Timor Leste, de dramática e heróica história. Foi conquistada pelos portugueses em 1512, junto da Guiné-Bissau, das ilhas de Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe, da Angola e do Moçambique, colônias portuguesas que durante séculos tiveram a mesma sorte, mais em nenhuma outra colônia o seu destino foi mais sofrido.

Quando a Revolução dos Cravos no ano 1974 deu cabo da tirania de Salazar em Portugal, membro da NATO e aliado estreito dos Estados Unidos, a Frente Revolucionária do Timor Leste proclamou a independência no dia 29 de novembro de 1975. Mas, apenas pôde desfrutá-la nove dias. No dia 7 de dezembro desse próprio ano, a tirania sangrenta de Suharto – que em cumplicidade com a CIA tinha derrocado o Governo Constitucional de Sukarno na Indonésia, assassinando centenas de milhares de comunistas e de militantes progressistas – enviou, com a aprovação prévia dos Estados Unidos, uma expedição com forças do exército indonésio para invadirem Timor Leste. Após 27 anos de luta, o povo desse país, sob a liderança da FRETILIN, voltou a instaurar um Governo Constitucional em Timor.

Não preciso explicar os estreitos vínculos históricos que existem entre o nosso país e as antigas colônias portuguesas; nossos combates contra as tropas da apartheid – a quem o governo de Reagan forneceu armas nucleares estratégicas—lhe concedem a nosso país autoridade moral para opinar sobre as decisões da APEC quando o governo dos Estados Unidos impõe medidas que afetam os interesses de todos os países, incluídos os outros membros dessa instituição.

Os Estados Unidos tentam impor à China a revalorização do yuan (renminbi, a divisa chinesa), sem levar em conta que desde que a China iniciou sua política administrada do yuan no mês de julho de 2005 foi revalorizado de 8, 28 yuanes por dólar naquela época, e hoje essa relação é de menos de 6,70 yuanes por dólar.

Segundo um artigo publicado pelo jornal Financial Times no dia 6 de outubro do presente ano, o Primeiro Ministro chinês declarou durante uma visita a Bruxelas que a revalorização do yuan já estava sendo realizada, mas que a China rejeitava oferecer garantias no que se refere à rapidez com seria executado este processo, e advertiu firmemente: "Não nos pressionem sobre a taxa de câmbio do renminbi”. Explicou que uma ação precipitada sobre este tema podia levar à falência a numerosas empresas chinesas que produzem para a exportação, criando graves conseqüências para sua economia, e concluía: “Se a China sofrer uma turbulência econômica e social, isso seria um desastre para o mundo”.
É claro que todos os países do Terceiro Mundo que têm na China um mercado seguro para suas exportações – destinadas a satisfazer as necessidades de uma população que no último censo do ano 2008 atingiu a cifra de 1 324 milhões 655 000 habitantes, quase um bilhão mais do que a população dos Estados Unidos, e uma economia que cresce a um ritmo médio não menor de 10% anual-, conseguiriam menos produtos por suas exportações para esse país e, pela sua vez, todas as que sejam exportadas para o resto do mundo, pagáveis em dólares,  obteriam  um papel moeda que vale cada vez menos.

Oitenta por cento das exportações dos Estados Unidos são serviços: os da chamada indústria de recreação e outros muitos que não satisfazem as necessidades fundamentais de nossos povos, urgidos pelas necessidades do desenvolvimento e pelos serviços vitais para a sociedade.

Num artigo publicado na Internet intitulado “Ocidente aprimora suas técnicas para agredir a China”, André Vitchek, entre outros aspectos de interesse expõe:

“As tácticas utilizadas em outra época (começar desacreditando para mais tarde tentar destruir todo governo comunista e socialista, progressista e nacionalista como a União Soviética, Cuba, a Nicarágua, a Coréia do Norte, o Chile, a Tanzânia e recentemente a Venezuela) ainda são consideradas válidas. Inclusive foram melhoradas com a passagem do tempo e com mais meios no que se refere ao pessoal e à tecnologia [...] Depois de tudo, o objetivo que o Ocidente e sua ditadura global colocaram-se é grande: A China, o país mais povoado do planeta. O fato de que a China seja um Estado historicamente pacífico e tenha conseguido sucesso em muitas áreas faz com que a tarefa seja ainda mais difícil. [...] Ocidente está (indiretamente) envolvido nas massacres do Congo/República Democrática do Congo (pelo menos a cifra de mortos atinge cinco milhões), na desestabilização do Chifre da África e de algumas zonas da América Latina, bem como na agressão contra o Iraque e contra o Afeganistão, por apenas citar algumas de suas macabras aventuras.”

“'As pessoas observam com seus próprios olhos o que a China está fazendo', explica M. Mghanga, ex deputado da Quênia e membro da Comissão de Defesa e das Relações Internacionais, poeta e preso político sob o regime brutal pró-ocidental do ex ditador Moi. 'Se você viajar através do país poderá ver chineses construindo estradas ou prédios, estádios e andares; uns projetos excelentes. Aliás, são muito cooperantes apesar da propaganda difundida por Ocidente. Na verdade, as pessoas observam o que a China está fazendo e o reconhecem. Mas, sobre o governo da Quênia é exercida uma grande pressão para que cesse sua cooperação com a China. De fato, existe uma grande hostilidade contra a Quênia. Ocidente nos castiga por causa de nossas relações estreitas com a República Popular da China. '”

A Cúpula anual da APEC começou ontem em Yokohama.

Dentro da APEC funcionam pequenos foros como o Acordo de Associação Transpacífico (TTP), de livre comércio, limitado apenas para o Brunei, o Chile, a Nova Zelândia e a Cingapura ao qual desejam somar-se os Estados Unidos, a Austrália, o Peru, a Malásia e o Vietnã. Em resumo, tudo o que sirva para vender algo: mercado, mercado, mercado.
Obama, como rei mago, anda repartindo vagas no Conselho de Segurança das Nações Unidas, como se este fosse de sua propriedade. Segundo as agências européias de notícias... “ele indicou este sábado que o Japão é o modelo de país que deveria ocupar uma vaga permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas...” já antes, no hemiciclo parlamentar de Nova Délhi , tinha dito que seu governo “vai apoiar a eventual entrada da Índia no Conselho de Segurança das Nações Unidas". O Paquistão, é claro, queixou-se amargamente dessa promessa ianque. O que ele não disse é se essas vagas são com ou sem direito a veto, como se esse privilégio antidemocrático estivesse destinado a ser eterno.

Igualmente se ignora se tão generoso oferecimento foi feito também a Lula, apesar de que mais de 500 milhões de latino-americanos  e quase um bilhão de africanos não têm representação permanente nesse Conselho. Quanto tempo ele acredita que é possível manipular o mundo dessa forma? Mas, talvez eu me equivoque e subestime Obama, se este, em sua euforia decide oferecer a todos os aspirantes o apoio dos Estados Unidos.

Naturalmente, as reuniões do G-20 e da APEC tiveram um final feliz, como nos filmes de faroeste feitos no Holliwood, como os que assistíamos quando éramos colegiais. O blá, blá, blá, conseguiu o Oscar, “Visão de Yokohama" como foi qualificada pelo Primeiro Ministro do Japão na Declaração Final da Cúpula da APEC.

Não obstante, o Presidente chinês Hu Jintao, segundo uma informação divulgada por uma agência norte-americana de notícias, mais séria, declarou: “'A recuperação não é sólida e os déficits provocam uma grande incerteza' [...] 'A situação do emprego nos países desenvolvidos é sombria e os mercados emergentes encaram pressões inflacionárias e bolhas de preços de ativos'.”

Outra agência européia, que geralmente é objetiva indicou: "O presidente chinês, Hu Jintao, disse que seu país não aceitará pressões externas para mudar de política."

Obama concluiu a sua visita à Ásia depois da reunião com “uma visita à estatua do Grande Buda de Karamakura – fundida em bronze – de 13 metros de alto e 93 toneladas, construída no ano 1252 e que retrata o Buda Amida, sentado em posição de lótus com as mãos em gesto de meditação.”

Por seu lado, o chefe das Forças Armadas Britânicas, o general David Richards disse que Al-Qaeda - assim qualifica erradamente à resistência afegã, verdadeira artífice da luta contra a NATO, que nada tem a ver com as forças que criou a CIA para lutar contra as tropas soviéticas – não pode ser derrotada “e que o Reino Unido deve estar pronto para enfrentar a ameaça de atentados islamitas, pelo menos, durante os próximos 30 anos.”

“Numa entrevista concedida ao jornal britânico The Sunday Telegraph, o general Richards declarou que o seu país deveria focalizar-se em controlar a ameaça sobre seus próprios cidadãos, uma tarefa que, disse, podia ser cumprida, em vez de tentar derrotar a militância islamita.

“'Na guerra convencional, a vitória e a derrota são claras e estão simbolizadas nas tropas marchando pela capital de outra nação (inimiga)', afirmou o chefe do Estado Maior britânico.

“Primeiramente devemos perguntar-nos: precisamos vencê-la (a militância islâmica) com uma clara vitória? Acho que é desnecessário e nunca será conseguido'.

“'Podemos controlá-la até o ponto em que as nossas vidas e as vidas de nossos filhos sejam seguras? ' perguntou-se Richards.

“'Acho que podemos', afirmou o militar.'”

“Segundo Richards, as armas reais na guerra contra Al-Qaeda são a educação e a democracia.”

“Aliás, disse que o exército e o governo britânicos são 'culpados de não compreenderem totalmente o que estava em jogo' no Afeganistão e admitiu que os afegãos estão começando a 'se cansar' da incapacidade da NATO para cumprir as suas promessas.” 

“De acordo com o jornalista da BBC Frank Gardner, os comentários do general Richards refletem um 'novo realismo' nos círculos antiterroristas do Reino Unido e dos Estados Unidos.

“Gardner assegura que se Richards tivesse dito estas palavras há cinco anos, elas houvessem sido consideradas escandalosas e derrotistas.”

"Razões de sobra tem Obama para visitar a estátua do Grande Buda de Kamakura, agora que a direita fascista ganha terreno rapidamente na Europa das correntes reformistas, inclusive na Suécia, e na sociedade de consumo ianque muitas pessoas ignoram quase tudo, e acreditam que justiça social, saúde, educação, solidariedade e paz são coisas de comunistas. Einstein, que desejava que os Estados Unidos antifascistas de Franklin D. Roosevelt tivessem a bomba atômica antes que esta fosse desenvolvida pela Alemanha nazista, jamais pôde sequer imaginar que várias dezenas de anos depois o perigo consistiria em que uma extrema direita fascista se apoderaria do Governo dos Estados Unidos".

Fidel Castro Ruz
14 de novembro de 2010
19h58


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