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António Barata

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O reino do faz-de-conta

António Barata - Publicado: Segunda, 06 Setembro 2010 02:00

António Barata

Neste regresso de férias, a discussão e aprovação do próximo Orçamento de Estado é um dos temas quentes em que, governo e oposição já começaram a alinhar argumentos e a marcar terreno.


Com muito pouca seriedade, é verdade. Sem coragem nem saber e competência para enfrentarem o problema da falência económica e financeira do país, a discussão e as propostas deles reduzem-se a miseráveis exercícios retóricos e ao faz-de-conta.

Enquanto a comunicação social nos vai distraindo com as pulhices em torno do seleccionador nacional, o sempre eterno caso de pedofilia envolvendo gente fina e casapianos e os habituais incêndios de Verão, os nossos líderes partidários e governamentais vão-nos tapando os olhos com questões tão bacocas como a da revisão constitucional; a saber como vão Manuel Alegre, o BE e o PS entender-se numa candidatura presidencial que tanto é apoiada (para já) pelo parido do governo (PS) como pelo da oposição da esquerda moderna e desempoeirada (o BE); se o candidato do PCP vai apoiar ou não Alegre na segunda volta ou quando Cavaco se resolve a formalizar a sua candidatura. Ao mesmo tempo que Sócrates, na sua patética campanha de demonstração de que o país está a recuperar e de que a economia está a entrar no bom caminho, vai inaugurando creches construídas maioritariamente com dinheiros privados e anunciando a construção de mais 100, como se passasse pela construção de creches a salvação do país. Do Eurostat vêm números que situam o desemprego acima dos 10%, um número que não se registava desde 1952, mas nada disto merece a tenção do governo e das oposições, que se limitam a produzir os circunstanciais rotineiros discursos – o governo diz que o Eurostat está enganado e as oposições que o governo vive no país das maravilhas. Para que tudo continue na mesma, com os de cima a passarem ao lado da crise e aumentarem os seus rendimentos, cavando ainda mais fundo o fosso que separa os ricos dos pobres, e a esbanjarem em carros, habitações de luxo, féria milionárias, etc. Ao mesmo tempo que para os despossuídos não param de crescer as privações – desemprego, aumento de impostos, carestia, redução drásticas das prestações, ajudas sociais e subsídio de desemprego – que serão agravadas já no próximo ano, com o esgotamento do prazo de atribuição do subsídio de desemprego às centenas de milhares de trabalhadores que se viram lançados na rua com a crise.

Governo e oposições falam do Orçamento de Estado como estivessem em condições de decidir o que quer que seja. Não por ignorância, mas por conveniência política. Todos eles sabem que o Orçamento de Estado (OE) que vão aprovar foi feito à sua revelia e de acordo com as imposições da EU, em particular, da Alemanha. O OE que vão aprovar tem como preocupação central não a salvação da economia nacional ou o bem-estar dos portugueses, mas a salvação do euro. Há um pacote de 750 mil milhões garantidos pela Alemanha para esse efeito, o qual impõe a redução dos défices nacionais para os famigerados 3% – e quem não quiser, que se vá embora. Pelo ao que governo, parlamento e oposições – porque aceitam jogar este jogo e nem sequer lhes passa pela cabeça denunciá-lo e menos ainda contrariá-lo – não lhes resta outra saída que não seja o de assinar por baixo.

Por mera conveniência Sócrates acredita naquilo em que ninguém acredita – que neste segundo semestre se vão repetir os resultados menos maus da execução orçamental do primeiro semestre. Resultados conjunturais, conseguidos não à custa da redução dos gastos do Estado (que aumentaram 4,3% na despesa efectiva e 5,6% na corrente primária) ou da reanimação económica, mas do aumento dos impostos indirectos e de algumas exportações. Como aumentar a carga fiscal é problemático e nada garante que as exportações continuem a crescer (tudo depende do comportamento da economia alemã), tudo isto não passa de fantasias. Também por conveniência, as oposições fingem que os pressupostos em que assenta esta discussão são verdadeiros, e que tudo se resume a boa ou má governação e à vontade de avançar ou não com medidas de regulação dos mercados. Há muito que a soberania nacional é uma ficção. Se antes da adesão à EU e da adesão ao euro ela era mitigada, depois disso passou a ficção – em Portugal os governos, seja qual for a sua cor, já não são outra coisa que meras comissões executivas de Bruxelas.

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