Mary Anne Grady Flores estava a tirar fotografias de outras oito pessoas que se estavam a manifestar na entrada da Base Aérea da Guarda Nacional Hancock Field, próximo de Syracuse, Nova York. O grupo, denominado Upstate Coalition to Ground the Drones and End the Wars (Coligação do norte de Nova York para enterrar os drones e acabar com a guerra) juntou-se ali na quarta-feira de cinzas de 2013, 13 de fevereiro, para se manifestar contra os drones armados, utilizados no programa de assassinatos dirigidos do Governo de Obama. Foi um dos muitos protestos pacíficos do grupo.
Horas antes de se entregar às autoridades, Mary Anne Grady Flores disse no programa Democracy Now!: “Era quarta-feira de Cinzas, um dia de expiação de acordo com a nossa tradição de trabalhadores católicos. E para nós era realmente importante difundir o que estava a acontecer na base, que são crimes de guerra”. Hancock Field alberga a 174ª divisão de ataque da Guarda Nacional Aérea que opera uma frota de aviões não tripulados MQ-9 Reaper, “um persistente caçador-assassino de alvos emergentes”, nas próprias palavras da Força Aérea.
Grady Flores manteve-se afastada do protesto, tirando fotos, em parte porque um juiz tinha emitido “uma ordem de restrição” contra ela e outros manifestantes por uma manifestação de 2012, em que o grupo conseguiu bloquear três entradas da base durante uma hora. A ordem foi emitida a pedido do comandante do Grupo de Apoio à Missão da 174ª divisão de ataque, o coronel Earl A. Evans. Infringir a ordem de se manter afastada da casa, escola ou “local de trabalho” de Evans constitui um delito punível com até sete anos de prisão. Mary Anne Grady Flores, ao ser presa, soube que a propriedade da base abarcava mais que os limites da entrada, e incluía o outro lado da rua, onde ela se encontrava.
“Fotografar é, naturalmente, uma atividade que é protegida pela Primeira Emenda. Manifestar-se é uma atividade protegida pela Primeira Emenda”, disse o advogado Jonathan Wallace, quando esteve na Democracy Now! juntamente com Grady Flores. Wallace é um advogado que tem trabalhado muito com o movimento de resistência aos drones: “Estas ordens de restrição são um formulário pré-impresso com espaços em branco que a polícia e os promotores completam todos os dias para proteger os cônjuges vítimas de maus-tratos”.
Uma coronel deu a sua opinião sobre o caso. Ann Wright serviu durante 29 anos nas forças armadas. Posteriormente, foi funcionária de alto nível do Departamento de Estado. Em 1997 recebeu a medalha de heroísmo do Departamento de Estado por ajudar a evacuar milhares de pessoas na guerra civil da Serra Leoa. Era subchefe de missão quando a embaixada dos Estados Unidos reabriu no Afeganistão em 2001. Em 2003, renunciou ao cargo em protesto contra a guerra no Iraque. Wright escreveu em apoio de Grady Flores: “Acho que é bastante vergonhoso e absurdo que um comandante do exército dos Estados Unidos aponte que a sua segurança pessoal é ameaçada por manifestantes pacíficos, não violentos, que protestam contra as políticas de aviões não tripulados dos Estados Unidos. Esperava que um comandante dos Estados Unidos tivesse a coragem de reunir com o grupo de cidadãos preocupados em vez de cobardemente obter uma ordem de restrição”.
Dois meses depois do protesto da quarta-feira de cinzas em que Grady Flores foi acusada de violar a ordem, a 23 de maio de 2013, o Presidente Obama pronunciou um discurso na Universidade de Defesa Nacional em apoio do programa: “Antes de lançar um ataque, deve haver a certeza quase absoluta de que nenhum civil morrerá nem ficará ferido. É o padrão máximo que devemos estabelecer”. Apesar das promessas de Obama, o número de mortes civis nos ataques dos Estados Unidos com aviões não tripulados continua a aumentar.
Raramente são dados a conhecer os nomes das vítimas. A 24 de outubro de 2012, a CIA lançou um ataque com um avião não tripulado no Vaziristão do Norte, Paquistão. Mamana Bibi, uma avó de 67 anos de idade que estava a apanhar quiabos, foi assassinada. O seu neto, Zubair Rehman, de 12 anos de idade, e a sua irmã de 8, Nabila, ficaram feridos. Depois de várias cirurgias, Zubair e Nabila viajaram para os Estados Unidos com o seu pai, Rafiq, um professor, para falar numa audiência do Congresso. Depois de deporem no Congresso vieram aos nossos estúdios em Nova York, onde os entrevistámos. Na sua declaração perante o Congresso, o pequeno Zubair disse: “Já não gosto do céu azul, de facto prefiro o céu cinzento. Os drones não voam quando o céu está cinzento... mas quando o céu está limpo, os drones regressam e com eles o medo”.
Mary Anne Grady Flores levava um lenço no dia que foi para a prisão, mas não para se proteger da neve: “Levo um lenço azul hoje. As crianças do Afeganistão enviaram este pedaço de pano para que algum dia possamos viver com a visão de um futuro de céu azul, de paz”.
Artigo publicado em Democracy Now no 21 de janeiro de 2016. Denis Moynihan colaborou na produção jornalística. Texto em inglês traduzido por Mercedes Camps para espanhol para Democracy Now. Tradução para português de Carlos Santos/Esquerda.net.