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António Barata

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Esta esquerda não serve

António Barata - Publicado: Segunda, 22 Fevereiro 2010 17:35

António Barata

Como uma fatalidade, a “esquerda” que temos empurra-nos para uma opção viciada: a de escolher como vamos ser “espremidos”. Nunca como agora foi necessária uma outra esquerda.  


Portugal não só é o país europeu com o maior fosso entre ricos e pobres, como  este  tende a crescer. Enquanto os salários dos trabalhadores portugueses são em média 50% inferiores aos da EU, os dos gestores (públicos e privados) são superiores. Se na Alemanha um gestor ganha em média 10 vezes mais que um trabalhador, no nosso país ganha 33 vezes mais.  

Vem isto a propósito  da bandalheira a que chegou o regime democrático no nosso país, com a justiça transformada numa anedota e  instrumento  de disputa político-partidária, a comunicação social instrumentalizada como nunca  e a economia transformada num negócio de “padrinhos”. Com as finanças próximas do colapso,  aí estão as  receitas  que FMI, União Europeia, gover no, patrões e analistas  propõem para  tirar  Portugal da crise es trutural em que se encontra mergulhado há mais de uma década: reduzir  os gastos do Estado despedindo, baixando salários, cortando nas reformas e outras despesas  e regalias sociais.

Recentemente, num debate do Prós e Contras, o presidente da Confederação do Comércio  Português,  brutal, sem meias palavras, disse  aquilo que o grande patronato, lóbis e fazedores de opinião  vêm dizendo de for ma  diplomática: está na altura de o governo  “mandar para a rua metade dos funcio nários públicos”, reduzir drasticamente  as reformas,  os salá rios  e as  regalias sociais. Sem isso não há  saneamento da dívida pública, competi tividade, crescimento das exportações e sal vação para a econo mia.  O  sector priva do já fez a sua parte, en cerrando empresas e despedindo —  e os números do desemprego estão aí para o mostrar, disse, com  a  sobranceria  do dever cumprido  —, chegou a  “vez de o Estado fazer a sua”. Ninguém discordou, à excepção de  Medina Carreira,  que  nos últimos tempos se tem destacado pelas desassombradas e demolidoras  análises à economia  e cáus ticas críticas à classe política, que diz reduzida a carreiristas cor ruptos, sub servientes e sem qualquer préstimo. Instado a pronunciar-se  sobre o que havia dito o  presidente da CCP, res pondeu que tal conversa é uma perda de tempo. Por quê? Porque o patronato (por viver à sombra  do Estado)  e a classe política não lhe merecem qualquer respeito nem crédito. Para ele, tal programa (com que concorda) só será aplicado no dia em que os senhores do FMI e do Banco Europeu desembarcarem no aeroporto de Lisboa para disciplinarem a “nossa” economia. A  mudança nunca virá de dentro, tal é a degradação e o peso do Estado. A  classe política  é medíocre e corrupta  e  a empresarial não está habituada a  correr riscos, mas  a viver dos favores do Estado, sob a sua protecção e  dependente das obras públicas.  São de tal maneira desqualifica dos que jamais terão a coragem e a clarividência necessária  para efectuar as reformas que se impõem, disse.

Com a “esquerda” que temos, eternamente entretida a dar moral e conselhos à burguesia sobre a melhor condução dos ne gócios, a sensibilizá-la para os graves problemas sociais e  os malefícios  decorrentes  da ganância, da preponderância do económico sobre o político, estamos condenados ao empobrecimento e a pagar os custos das crises. Como uma fatalidade, empurram-nos para uma opção viciada: a de escolher como vamos ser “espremidos”.

Nunca como agora foi necessária uma outra esquerda.


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