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Atilio Borón

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Em coluna

A ameaça fascista na Venezuela

Atilio Borón - Publicado: Quinta, 27 Fevereiro 2014 20:05

A escalada desestabilizadora atualmente sofrida pela Venezuela bolivariana possui um objetivo inquestionável: a derrota do governo de Nicolás Maduro.


Não existe nenhuma outra interpretação de quem escreve esta afirmação. Foi expressa em reiteradas ocasiões não apenas por manifestantes da direita nas ruas, mas por seus principais líderes e instigadores locais: Leopoldo López (ex-prefeito do município de Chacao, em Caracas, e chefe do Partido Voluntad Popular) e María Corina Machado, deputada pelo Súmate na Assembleia Nacional da Venezuela. Em mais de uma ocasião referiram-se às intenções ansiadas em seus protestos, utilizando uma expressão em que, regularmente, apelam ao Departamento de Estado: "mudança de regime", forma amável e eufemística que substitui o desprestigiado termo "golpe de estado". O que se busca é precisamente isso: um "golpe de estado" que ponha um ponto final na experiência chavista. A invasão à Líbia e a derrocada e linchamento de Muammar El Gadafi são exemplos de "mudanças de regime". Há meio século os Estados Unidos propõem, sem êxito, algo similar em Cuba. Agora o estão tentando, com todas as suas forças, na Venezuela.

Esta feroz campanha contra o governo bolivariano - na realidade, um processo de fascistização de longa data - tem raízes internas e externas, intimamente ligadas e solidárias num objetivo comum: acabar com o pesadelo instaurado pelo Comandante Hugo Chávez desde que assumira a presidência em 1999. Para os Estados Unidos, a autodeterminação venezuelana afirmada sobre as maiores reservas comprovadas de petróleo do mundo, a derrota da ALCA e dos avanços dos processos de integração e unidade na América Latina e no Caribe – a UNASUL –, o Mercosul ampliado, a CELAC, Petrocaribe, entre outros, impulsionados como nunca antes pelo líder bolivariano, são desafios intoleráveis e inadmissíveis, merecedores de um castigo exemplar. Para a oposição interna, o chavismo significou o fim das regalias e negociações que obtinha por sua colaboração com o governo dos Estados Unidos e as empresas norte-americanas no saque e pilhagem da receita petrolífera, e que encontrou nos líderes e organizações políticas da Quarta República seus sócios menores e imprescindíveis operadores locais. Tanto Washington quanto seus peões estavam certos de que o chavismo não sobreviveria ao desaparecimento físico de seu fundador. Porém, com as eleições presidenciais de 14 de abril de 2013, suas esperanças se esfumaçaram: Nicolás Maduro venceu Henrique Capriles por uma porcentagem muito pequena, mas suficiente e indiscutível, de votos. A resposta destes oligarcas travestidos em notáveis figuras da república foi, primeiro, desconhecer o veredito das urnas e, depois, desencadear violentos protestos que tiraram a vida de mais de uma dezena de jovens bolivarianos, deixando cerca de cem feridos, além da destruição de numerosos edifícios e propriedades públicas. Cabe lembrar que até o dia de hoje, dez meses após as eleições presidenciais, Washington não reconheceu formalmente a vitória de Nicolás Maduro. Em contrapartida, o inverossímil Prêmio Nobel da Paz demorou poucas horas para reconhecer como vencedor das eleições presidenciais hondurenhas de 24 de novembro passado – viciadas até o indizível e fraudulentas como poucas – o candidato da "embaixada", Juan O. Hernández. O imperialismo não erra ao eleger seus inimigos: os Castro, Chávez, agora Maduro, Correa, Morales. Contrariamente ao que alguns ingenuamente defendem, não existe uma direita que seja "oposição leal" a um governo genuinamente de esquerda. Menos ainda quando se trata de uma direita manipulada por controle remoto pela Casa Branca. Caso se comporte com lealdade é porque esse governo já foi colonizado pelo capital. Em que pese a violência dos militantes da Mesa de Unidad Democrática, que defendia a candidatura de Capriles, o governo conseguiu restabelecer a ordem nas ruas. Contribuíram para isso a clara e enérgica resposta governamental e, além disso, a certeza que tinha a direção do MUD de que as eleições municipais de 8 de dezembro – que a direita caracterizou como um plebiscito – permitiriam derrotar o chavismo para depois exigir a imediata renúncia de Maduro ou, no pior dos casos, convocar um referendo revocatório antecipado, sem ter que esperar até meados de 2016, tal como estabelece a Constituição. Porém, a jogada acabou mal, porque foram amplamente derrotados por quase um milhão de votos e nove pontos percentuais de diferença.

Atônitos ante o resultado inesperado que, pela primeira vez, oferecia ao governo bolivariano a possibilidade de gerir durante dois anos os assuntos públicos e administrar a economia sem ter que envolver-se em campanhas eleitorais agressivas e com o objetivo de distrair, os antichavistas peregrinaram a Washington para redefinir sua estratégia em função das necessidades geopolíticas do império e receber ordens, dinheiro e ajudas de todo tipo para sustentar seu projeto desestabilizador. Derrotados nas urnas, agora a prioridade imediata era, como fez Richard Nixon no Chile de Salvador Allende, em 1970, "fazer ranger a economia". Daí as sabotagens, as campanhas de desabastecimentos programados e a especulação cambial desenfreada (segundo recomenda em seu manual de operações o especialista da CIA, Eugene Sharp), os ataques na imprensa, onde as mentiras e o terrorismo midiático não conhecem limite ou escrúpulo moral algum e, depois, como conclusão, "esquentar a rua" buscando criar uma situação similar à da cidade de Bengasi, na Líbia, capaz de desbaratar por completo a economia e desatar uma gravíssima crise de governabilidade que torna inevitável a intervenção de alguma potência amiga, que já sabemos quem é, para que acuda em auxílio dos venezuelanos para restaurar a ordem quebrada.

Uma após outra, todas estas iniciativas terminaram em fracasso, porém nem por isso a direita abandonará seus propósitos sediciosos. Leopoldo López acaba de se entregar a justiça e é de se esperar que esta faça cair sobre ele e sobre sua copincha, María Corina Machado, todo o peso da lei, já que carregam várias mortes em suas mochilas. O pior que poderia acontecer com a Venezuela seria o governo ou a justiça não perceber o que está escondido dentro do ovo da serpente. Em situações como estas, e diante de inimigos como estes, qualquer tentativa de "reconciliação nacional" ou de "linha branda" é o caminho seguro para a própria destruição. Os fascistas e o imperialismo só entendem a linguagem da força. López e Machado deverão receber um castigo exemplar, sempre dentro do marco da legalidade vigente. Não se devem descartar violentas manifestações para sua imediata libertação e, tampouco, se devem descartar a hipótese de que, em seu desespero, a direita possa apelar a qualquer custo, por mais absurdo que seja. Porém, o julgamento e castigo dos instigadores de tanto derramamento de sangue não serão suficientes para evitar o risco de uma brutal derrocada do governo bolivariano. A única garantia está na ativa mobilização e organização das massas chavistas para sustentar "sua revolução", com seus muitos acertos e, também, seus erros. Apenas isso permitirá evitar o perigo de um assalto fascista ao poder que colocaria um sangrento fim à gestão bolivariana, desencadeando uma onda reacionária que repercutiria por todo o continente. Assim, o que está em jogo nestas horas não é somente o futuro da Venezuela, mas o de toda Nossa América.

Publicado no dia 19/02/14 no blog do autor.

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB).


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