Porém, advertiu que "a situação é complexa" porque Juan Manuel Santos não é confiável; "teremos que esperar para ver como evolui o diálogo". A seguir, transcrevemos integralmente a opinião de nosso destacado comunista.
Efraín Chury Iribarne: Já estamos em contato com James Petras. Bom dia! Como vai?
James Petras: Muito bem. Bom dia!
EChI: Para começar, gostaríamos de conhecer sua análise sobre estes diálogos de paz ocorridos em Havana (Cuba) , entre o governo de Juan Manuel Santos, da Colômbia, e as FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
JP: É uma coisa muito complexa já que não temos muitos detalhes, a não ser o anúncio de que o governo aceita negociar com as FARC, o que é uma mudança positiva. Em primeiro lugar, reconhecem que não é possível ganhar o conflito simplesmente aplicando a força. Segundo, reconhecem as FARC como legítima força beligerante. E, terceiro, aceitam um território neutro para as negociações, como Cuba e, depois, Noruega.
Estas são coisas positivas e que confirmam a posição das FARC de que, unicamente a partir do diálogo pode-se chegar, talvez, a um acordo.
Agora, a razão pela qual o governo mudou sua política está relacionada à nova estratégia do governo Santos.
Santos deu luz verde aos capitais mineradores e de petróleo em grande escala. Vale ressaltar que as regiões onde as minas e os poços existem são territórios muito conflituosos, tanto historicamentequanto na atualidade. Então, para a estratégia econômica de Santos, é muito importante pacificar esta área, pois espera enormes fluxos de capitais estrangeiros e, este ano é um exemplo, triplicaram osinvestimentos em mineração nos últimos três anos.
Em contraste com Álvaro Uribe, Santos acredita que o importante é a estabilidade, o investimento e a diminuição da militarização. Segundo minha análise, Santos acredita que a guerra e a militarização cumpriram sua tarefa de limitar a oposição popular; limitar ou dispersar as bases sociais das FARC, a partir dos massacres e das brutalidades da época de Uribe. É que Uribe tinha só um projeto militarista, não tinha um projeto econômico. Santos possui um projeto econômico. Por isso, em primeira instância, chegou a um acordo com (o presidente venezuelano) Hugo Chávez, em função dos interesses econômicos, de intercâmbio de produtos venezuelanos e produtos colombianos.
Este contexto, de primazia econômica, indica que o senhor Santos está mais disposto a buscar uma solução política sempre que não toque no projeto econômico, que depende muito dos fluxos de capitais estrangeiros, principalmente capitais extrativos.
Por outro lado, as FARC acreditam que agora, com os movimentos populares, com a Marcha Patriótica e com outras mobilizações populares, está em condições de apresentar o programa de transformações sociais a partir de maior acesso ao grande público.
Então, estas duas coisas juntas significam que depende muito da agenda. Primeiro, Santos está disposto a desmobilizar os grupos paramilitares, o que já começou a fazer. Segundo, está disposto a terminar ou diminuir, reduzir os massacres generalizados. Terceiro, está disposto a permitir a inserção das FARC no processo político eleitoral. Porém, o que não está disposto, o que não vai tolerar é uma reforma agrária, nem uma renegociação de contratos com o capital estrangeiro – que é o modelo extrativo – nem nenhuma posição que permita uma política que possa estender a participação popular no processo político-social. Ou seja, ele quer manter o processo dentro dos parâmetros existentes.
Agora, a que grau as FARC estão dispostas a chegar a um acordo sobre as bases de Santos, mantendo o modelo econômico, simplesmente mantendo os camponeses nos territórios fronteiriços e não cultivados, e sacrificar a política nacionalista em relação ao capital estrangeiro?
Teremos que ver. Porém, de todo modo, eu duvido que as FARC – pelo menos a maioria dos líderes e militantes – possam aceitar estas condições.
As experiências anteriores não são alentadoras. Cada vez que os militantes das FARC entraram no jogo político foram massacrados, como aconteceu com a União Patriótica. Tivemos a intervenção militar durante as negociações de 1999-2001.
Então, também pode ser uma armadilha de Santos para eliminá-los.
O outro perigo é assinar um acordo como na América Central – El Salvador, Guatemala, etc –, onde, simplesmente, a cúpula guerrilheira conseguiu prerrogativas parlamentares e nada mudou. Inclusive, aumentou a violência, pois, em que pese a desmobilização das milícias, guerrilheiros e paramilitares, agora há mais mortos que antes, durante a guerra civil de El Salvador, por exemplo.
Então, um acordo ao estilo salvadorenho é uma traição de tudo o que foi a base social da luta e é outro ponto de referência que devemos considerar.
Em suma, o fato de que existam movimentos a nível político, o fato de que as FARC tenham agora uma plataforma para articular as mudanças necessárias – como a renegociação de contratos de investimentos, mudanças em relação à propriedade de terra, atacar as raízes da colaboração militar paramilitar, etc –, me parece que principalmente o fato de ter essa plataforma agora, de apresentar uma alternativa, é muito positivo. É preciso dizer também que existem perigos em todos os lados. Santos não é muito confiável como interlocutor, não só por seu passado como Ministro de Defesa e assassinojunto a Uribe, mas também pela defesa desse novo modelo, um modelo que dá muita importância ao capital estrangeiro, à concentração de riquezas e o deslocamento de camponeses dos centros produtivos da terra.
Reitero: a situação é complexa. Por um lado, existe uma abertura com a Venezuela e, por outro, as bases militares norte-americanas permanecem na Colômbia. Por um lado, abre negociações e diálogo com as FARC. Ao mesmo tempo, assina um acordo de livre comércio com os Estados Unidos. Por um lado, está disposto a considerar a realocação dos refugiados e, por outro lado, está promovendo o agronegócio.
Então, existe uma combinação de fatores novos que, pelo menos a partir da perspectiva do passado, são diferentes. No fundo, Santos não vai trair as classes dominantes e nem os seus acordos com os Estados Unidos, ainda que vá modificar o grau de militarização para favorecer seu projeto econômico, que significa o desenvolvimentismo com amplo espaço para o capital estrangeiro. Isto é a chave. E a segurança dos investimentos é pré-requisito. E, para conseguir isto, necessita de um acordo com as FARC. Um acordo que simplesmente permita às FARC desmobilizar-se e inserir-se na política atual.
*Entrevista a Rádio Centenário, Montevidéu (Uruguai)
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)