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Séchu Sende

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Em coluna

Prólogo de Made in Galiza para a ediçom em língua curda

Séchu Sende - Publicado: Terça, 18 Mai 2010 02:00

Séchu Sende

Olá, chamo-me Séchu Sende e sinto-me honrado de poder falar com vós. Conhecedes Galiza?


Pois aqui está, presento-vos o meu país:

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Galiza tem quase tres milhons de habitantes. Aqui podedes ve-la um pouco mais de perto:

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E aqui estou eu, com Breogán:

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Breogán é quase invisível.... É que eu, ademais de escreber livros e ser profesor de língua e literatura galega, som domador de pulgas no Galiza Pulgas Circus, o menor espectáculo do mundo.

Aqui podedes ver melhor a pulga Breogán, a saltar da minha orelha:

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O meu trabalho como escritor, como profe e como domador de pulgas servem-me para compartir as palavras da minha língua com a gente do meu país. Gostaria de falar-vos um pouco da minha língua que, se nom me equivoco, tem muito parecido com a vossa língua.

Tenho umha afilhada de 10 anos que se chama Candela que apenas fala a língua de Galiza, o galego. Como a muitas nenas e nenos, da-lhe vergonha, e ademais, na sua cidade, Vigo, quase nom há nenos e nenas que falem galego. A gente fala maioritariamente o espanhol. A nossa língua fala-se sobre todo fora das cidades. Si, duns anos para aqui, especialmente desde a dictadura de Franco, espanholista e fascista amigo de Hitler, muita gente no nosso país deixou de falar-lhe a nossa língua aos seus filhos e filhas.

Eu tenho umha filha dum ano que se chama Estrela, e hai duas semanas começou a dicer as suas primeiras palavras na nossa língua: pa, ma, cam, auga. Espero que Estrela nom deixe nunca de sonhar na nossa língua.

A nossa língua é umha língua mui especial, penso que mui parecida á vossa, em certa medida.

Eu falo umha língua que outros nom querem falar. Eu falo umha língua que outros despreçam. Eu falo umha língua que outros agredem. Eu falo umha língua que outros censuram. Eu falo umha língua que outros desejam ver desaparecer.

E milheiros de mulheres, homes, nenos e nenas falamos a nossa língua.

Eu falo a língua do meu país, da minha naçom, do meu povo, Galiza.

É curioso, Galiza é o berce do galego-portugués, e o portugués é hoje um dos cinco idiomas mais falados no mundo. Podemos falar galego com gente do Brasil, Moçambique, Angola ou Timor-Leste. A nossa língua é falada por mais de douscentos milhons de persoas. Mas...

Mas no nosso próprio país fala-se cada vez menos. E se hai poucos anos era a língua maioritária e falava galego mais do 90 % da povoaçom, hoje apenas um trinta por cento da gente nova fala habitualmente o nosso idioma. Galiza está a viver um proceso de substituçom lingüística do galego polo espanhol.

E poderia parecer que esse proceso nom tem volta atrás mas...

Mas na Galiza há muita gente que nunca deixará de falar galego e que sabemos que, com trabalho e inteligéncia, justiça e insisténcia, humanidade e confianza em nós mesmos, a nossa língua será a chave do progreso do nosso país.

Queremos cambiar a história.

O arquitecto francés Le Corbusier dixo que "A primeira proba de existéncia é ocupar o espaço". Porque as nossas palavras nos dam vida, espalhemo-las no vento, que as veja todo o mundo. Que as nossas línguas ocupem os espaços públicos e os privados, os nossos territórios íntimos e colectivos, os lugares cotiás e os sonhados. Que as nossas palavras ocupem os ecrans dos computadores, os graffitis dos muros, o peito das nossas camisolas, os coraçons de amor que pintam os adolescentes, os folhetos de publicidade, os livros de texto das nossas filhas e filhos ou as páginas das leis que devem falar na língua do povo.

Este livro quere ser um livro alegre. Um livro que faga sorrir. Ter sentido do humor ás vezes é um esforço para nom volver-se tolo. O humor libera-nos da dor, da tragédia, e permite-nos enfrontar-nos aos problemas com criatividade. Porque o humor é criativo e pode ser um arma mui poderosa. Pode ridiculizar o opresor, debilitando-o. E permite rir-nos de nós mesmos, das nossas contradiçons e debilidades para nos fortalecer. O humor é umha forma de poder e, segundo a psicologia social, o humor é um elemento fundamental nos procesos de criatividade colectiva, como é a construçom dum presente e futuros justos para a nossa língua.

Galiza debate-se entre a resignaçom e a rebeldia. Castelao, um dos nossos humoristas, políticos e escritores mais importantes do séc. XX escrebeu: Mexan por nos e dicimos que chove. Mas, como as cousas cámbiam, um intelectual punk do XXI, O Leo, actualizou essa frase: Mexan por nós e nós caghamos por eles.

Há muitos caminhos para cambiar as cousas e cada povo, cada sociedade, debe procurar os seus. Mas entre os povos do mundo há caminhos que se cruçam, caminhos que se compartem, caminhos irmaos. Alguns fragmentos deste livro forom traducidos para diversas línguas: galés, bretóm, euskera, asturiano, catalá, croata, checo, escocés, ruso, inglés...

Mas esta é a primeira traduçom íntegra do Made in Galiza a umha língua da mesma família, a família das línguas golpeadas pola história, as línguas que procuram a liberdade. Porque temos que dar-nos conta de que nom estamos sós, de que milhons de persoas por todo o planeta se enfrontam dia a dia ao mesmo desafio: dar-lhe vida á língua do seu povo. Somos a irmandade das línguas minorizadas, das palavras oprimidas.

E sabemos que quem melhor defende o nosso país som as nossas palavras, as que levamos dentro e as que compartimos. Quem melhor defende o nosso povo é a língua própria do nosso povo. Sem ela estariamos indefensos. Se falamos, lemos, escrebemos a nossa língua, ninguém poderá com nós.

Separam-nos mais de 5.000 quilometros, mas entre o Curdistam e Galiza semelha que há menos dum paso. No mapa separam-nos muitos países, mas é como se fossemos povos vizinhos. Por isso eu hoje digo: Galiza e Curdistám, povos irmaos.

Sinto-me honrado porque as palavras do meu idioma se transformassem em palavras da vossa língua. Sinto-me honrado porque as palavras do meu idioma entrem como vossas nas vossas casas, bibliotecas, escolas ou livrarias. Imagino as palavras que nacerom na Galiza cruçar umha rua num livro escrito com as vossas palavras na mao dumha rapaza vestida de azul e branco, com um broche vermelho, como a nossa bandeira. Imagino um rapaz a levar o livro na mochila, entre os botes de spray.

Sinto-me honrado por ter sido convidado ás vossas casas, e, como as minhas palavras, sinto-me tamem parte do vosso povo, da vossa naçom, cidadám das vossas cidades, aldeam das vossas aldeias. Sinto-me agradecido por terdes contado comigo para trabalhar, ombro com ombro, na construçom da vossa casa de palavras.

Que os nossos filhos e filhas nos agradeçam ter-lhes aprendido a falar a nossa língua. Que os nossos filhos e filhas nos agradeçam ter-lhes aprendido a escoitar.

Que os nossos nenos e nenas sonhem nas nossas línguas!

E já sabedes, "A vida é melhor em galego", "Jiyan bi kurdî xwes e".


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