França e Alemanha, cujos bancos são os principais credores, emprestam o dinheiro, na realidade, para pagar a esses bancos e não para ajudar à recuperação da economia grega que eles e o estadunidense banco J.P. Morgan, com a ativa colaboração do anterior governo da direita helénica. O atual governo social-democrata grego, encabeçado por Giorgios Papandreou, está tratando de renegociar essa dívida, que aceita em bloco como válida sem diferenciar entre a dívida legítima, a ilegítima e a usurária, pois para esses socialistas há que respeitar os abutres do capital financeiro internacional e as leis do capitalismo, que seriam tão naturais como a lei de gravidade ou o inexorável movimento da Terra. O povo grego, em troca, realiza contínuas greves gerais e manifestações de rejeição a essa aceitação pelo governo dos diktats franco-alemães, pois os trabalhadores negam-se a aumentar ainda mais um desemprego, que se abeira dos 20 por cento (os números oficiais falam de 16, mas não incluem todos os realmente desempregados) e a rebaixar ulteriormente os salários reais que vão em queda. O protesto social é enorme e vai in crescendo, porque o capital financeiro assanha-se com a Grécia imediatamente após um grande movimento que botou no lixo o governo de direita e o substituiu pelo de Papandreou, no qual tinha grandes esperanças de mudança. Como aconteceu anteriormente no caso argentino -outro país pequeno, não estratégico e relativamente marginal na economia mundial-, o reflexo particular da crise mundial do capitalismo sobre a Grécia foi utilizado pelas finanças para dar um terrível exemplo a outras economias mais importantes, como a italiana ou a espanhola, e para atacar um setor secundário mas politizado dos trabalhadores europeus e favorecer a anulação das conquistas sociais, a partir da Grécia, em todo o continente, e a rebaja dos salários reais não só helênicos, mas também de toda a Europa.
O setor mais importante da burguesia nacional grega (os financistas, os armadores e os importadores-exportadores) ligou seus interesses com os da grande capital internacional, sobretudo franco-alemão, e é seu sócio menor nos Balcães; por sua vez, os operários gregos, com sua gloriosa tradição de organização de classe e de radicalismo, com a resistência contra os nazifascistas, com a insurreição contra a monarquia e o imperialismo britânico, são um setor radical do proletariado europeu que o capitalismo mundial, depois de desmembrar a ex Iugoslávia e dominar os restos da mesma, tenta esmagar os Balcães para poder explorar melhor os trabalhadores do velho continente. Daí a importância política da luta que se livra em todas as cidades gregas.
A Argentina, faz dez anos, declarou o falência, desvalorizou a sua moeda e renegociou favoravelmente, com importantes rebaixas, sua dívida externa. Desde então, e apesar da crise, teve um importante crescimento de sua economia. As diferenças com a Grécia são muitas -em primeiro lugar, a Argentina pode utilizar o aumento do preço das matérias-primas agrícolas que produz em quantidades imensas, coisa que a Grécia não pode fazer- e esta enfrentaria dificuldades muito maiores se declarasse o default; mas em vez de condenar várias gerações de gregos a apertarem o cinto para sustentar os bancos franceses e alemães, poderia declarar nula uma dívida que nem o povo nem o atual governo contraíram. Isso obrigaria o país a sair do euro e da União Européia, a reconquistar a independência monetária para pagar os salários e o funcionamento imediato da economia (como na Argentina, depois da desvalorização do peso-dólar, quando teve que recorrer à invenção de quasimoedas locais), mas permitiria manter a independência econômica do país e atribuiria um papel maior ao setor estatal. As pressões seriam enormes, porque a banca francesa e a alemã perderiam grandes somas e os governos respetivos se veriam obrigados a salvá-las novamente, mas a Grécia contaria com o apoio dos trabalhadores de todo mundo e, designadamente, ajudaria a resistir os de Portugal, os de Espanha e, amanhã, os italianos.
Está também aí o exemplo da Islândia, pequeno país nórdico de 317 mil habitantes que tinha uma dívida equivalente a 15 vezes seu PIB, que se negou a pagar aos usurários britânicos e holandeses que emprestavam dinheiro irresponsavelmente a banqueiros aventureiros da ilha. O governo, ao princípio, resolveu pagar a dívida externa e condenar o país, por séculos, à escravatura financeira (deveria pagar sua dívida em 15 anos com 5.5 de juros). Mas o presidente, um ex comunista, recusou essa posição, o qual levou a um referendo, organizado pela pressão popular mediante mobilizações e assembleias, o qual declarou que dita dívida era impagável e, em vez de premiar os banqueiros ladrões, meteu-os presos e nacionalizou os bancos. A Islândia segue na Associação Européia de Livre Comércio e os banqueiros estrangeiros tiveram que contentar com o dinheiro que conseguiram de seus governos. Agora, o país conseguiu um acordo de pagamentos bem mais favorável (40 mil milhões de euros em 37 anos com o 3 por cento de juros, a partir de 2016, o qual representa, de todos modos, cerca de 100 euros por dia, por cabeça de habitante, durante 10 mil 950 dias) cujo pagamento também recusa. A Islândia, com um governo social-democrata e vermelho e verde, briga sempre para entrar na União Européia e contra a pressão do FMI e de seus credores e não perdeu sua independência.
Fonte: La Jornada.
Tradução: Diário Liberdade.