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Democracy now!

Wikileaks, Wimbledon e a guerra

Amy Goodman - Publicado: Segunda, 11 Julho 2011 02:14

Amy Goodman

O sábado passado foi um dia ensolarado em Londres e multidões se dirigiram em massa a Wimbledon e à regata anual Henley.


Enquanto isso, Julian Assange, o fundador do site Wikileaks.org, dirigia-se de trem de sua prisão domiciliar em Norfolk, a três horas da capital, até o auditório Troxi de Londres, para reunir-se comigo e o filósofo esloveno Slavoj Zizek para participar de uma conferência pública acerca de Wikileaks, o poder da informação e a importância da transparência no sistema democrático. O evento foi organizado pelo Frontline Club, uma organização fundada por correspondentes de guerra, em parte como homenagem aos muitos companheiros mortos enquanto realizavam seu trabalho na frente de batalha. O co-fundador do Frontline Club, Vaughan Smith, olhou o pouco usual céu aberto com inquietude e disse: "os londrinos nunca vão a um evento em um lugar fechado em um dia como este". Apesar de anos de experiência brindando informação certeira em coberturas no Afeganistão ou no Kosovo, desta vez a avaliação de Smith foi equivocada.

Cerca de 1.800 pessoas assistiram ao evento, prova do enorme impacto do Wikileaks desde que denunciou a tortura e a corrupção utilizadas para derrubar governos.

Assange está na Inglaterra á espera de uma audiência judicial que será realizada dia 12 de julho, na qual se tratará de sua possível extradição a Suécia, o que é requerido por esse país para ser interrogado sobre um suposto caso de abuso sexual. Apesar de não terem sido apresentadas acusações formais contra ele, Assange encontra-se sob prisão domiciliar há mais de seis meses, carrega uma tornozeleira eletrônica e deve apresentar-se diariamente na delegacia de polícia de Norfolk.

Wikileaks foi oficialmente lançado em 2007 e tem como objetivo receber informação secreta vazada mor informantes, utilizando a última tecnologia para proteger a identidade das fontes. A organização vem obtendo um reconhecimento mundial cada vez maior com a sucessiva publicação de grandes quantidades de documentos confidenciais do governo dos Estados Unidos vinculados às guerras do Iraque e Afeganistão, e milhares de telegramas das embaixadas dos EUA em todo o mundo.

Das partes confidenciais de ambas as guerras, Assange disse que "proporcionaram uma ideia da sordidez da guerra: desde as crianças assassinadas nos postos de controle nas estradas até as milhares de pessoas entregues à polícia iraquiana para serem torturadas, passando pelo que realmente significa o chamado "Apoio aéreo próximo" (CAS, em sua sigla em inglês) e como se realiza o combate militar moderno, e a vinculação disso com outra informação como esse vídeo que descobrimos dos homens que se rendem e são igualmente atacados".

Os telegramas do Departamento de Estado estão sendo publicados pouco a pouco, gerando uma fonte permanente de vergonha para o governo dos Estados Unidos e inspirando indignação e protestos em nível mundial, já que os telegramas confidenciais revelam as operações secretas e cínicas da diplomacia estadunidense. O "Cablegate", como foi denominada a maior revelação pública dos documentos do Departamento de Estado na história dos EUA, foi uma das faíscas que incendiou a Primavera Árabe. Os tunisianos e iemenitas que viviam sob regimes repressivos na Tunísia e no Yemen, por exemplo, sabiam que seus governos eram corruptos e cruéis. Mas ler os detalhes e ver até que ponto o governo dos EUA apoia esses ditadores ajudou a iniciar a revolta.

De maneira similar, os milhares de telegramas vinculados ao Haiti analisados pelo jornal independente Haiti Liberté e pela revista The Nation revelaram a ampla manipulação estadunidense da política e da economia desse país. (Esta coluna foi mencionada em um dos telegramas sobre o Haiti, no qual se fazia referência a nosso informe sobre aqueles que criticavam a atitude do governo Obama de negar após o terremoto os vistos de 70 mil haitianos que já tinham sido aprovados). Uma série de telegramas detalha as tentativas estadunidenses de obstaculizar o envio de petróleo subsidiado da Venezuela para proteger os interesses comerciais da Chevron e ExxonMobil. Outros telegramas mostram a pressão realizada pelos EUA para evitar um aumento do salário mínimo no Haiti a pedido de fabricantes de roupas dos EUA. Estamos falando do país mais pobre do Hemisfério Ocidental.

Como consequência do papel desempenhado como redator chefe do Wikileaks, Assange recebeu reiteradas ameaças, inclusive ameaças de morte. O vice-presidente dos EUA, Joe Biden, qualificou-o como "terrorista de alta tecnologia", enquanto que Newt Gingrich disse: "Julian Assange está envolvido no terrorismo. Deveria ser tratado como um combatente inimigo e Wikileaks deveria ser fechado de forma definitiva".

De fato, as tentativas realizadas até o momento de fechar o Wikileaks fracassaram. O Bank of America teria contratado várias empresas privadas de inteligência para coordenar um ataque contra a organização que, segundo se diz, teria uma grande quantidade de documentos que revelariam atividades potencialmente fraudulentas do banco. O Wikileaks também acaba de ingressar na Justiça contra a MasterCard e a Visa, que deixaram de registrar as doações realizadas com cartões de crédito por meio de suas páginas web.

O processo de extradição coloca uma ameaça ainda maior para Assange: ele teme que a Suécia o extradite logo para os Estados Unidos. Levando em conta o tratamento recebido pelo soldado Bradley Manning, acusado de vazar muitos documentos secretos para Wikileaks, Assange tem motivos razoáveis para temer. Manning esteve fechado em isolamento durante quase um ano, em condições que, segundo muitos afirmam, são similares à tortura.

No evento em Londres, o apoio ao Wikileaks foi impressionante. Mas Julian Assange não podia ficar para conversar uma vez terminada a conferência. Tinha apenas o tempo suficiente para regressar a Norkfolk e retornar à sua detenção domiciliar. Independentemente do que ocorra a Assange, Wikileaks mudou o mundo para sempre.

(*) Denis Moynihan colaborou com a produção jornalística dessa coluna.

Tradução: Katarina Peixoto


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