Longe vai o tempo em que intelectuais, jornalistas, partidos e organizações de esquerda se mobilizavam contra o julgamento, condenação e extradição de militantes bascos no nosso país. E no entanto, a direita (a socialista e as outras) e a comunicação social, num coro previsivelmente afinado, não se cansaram de diabolizar a ETA e a guerrilha basca, de fazer tábua rasa do direito do povo basco a autogovernar-se e de amedrontar o “tranquilo povo português” com a ameaça terrorista que, mais dia, menos dia, poderá fazer ir pelos ares o mais incauto cidadão.
É também de salientar a subserviência do Estado português ao espanhol. Começou por não ver nada de mais no facto de ser desmentido sobre a quantidade de explosivos encontrados, aceitando como boa a explicação do país vizinho, que conseguiu multiplicar por dois a quantidade encontrada (se um quilograma em Portugal são mil gramas e em Espanha dois mil, isso nada tem de estranho. É mera questão técnica). Depois, as pressões para que os “terroristas” sejam extraditados rapidamente, e para o estabelecimento de acordos de colaboração entre as polícias dos dois países (anunciados com pompa e destaque na imprensa), numa demonstração clara de que a separação de poderes não é mais que mera formalidade para enganar papalvos. Assim, à pala da luta contra o terrorismo, não só os nacionalistas bascos ficam sob vigilância, como se incrementa a vigilância e criminalização de toda a actividade revolucionária na península Ibérica.
Por último, a burguesia, os seus partidos e os da esquerda parlamentar (PCP e BE) e extraparlamentar, a imprensa, a secção portuguesa da Amnistia Internacional e outros organismos que tanto se preocupam com os direitos humanos remeteram-se ao mais absoluto silêncio. Como não se trata da China nem do Tibete, da Colômbia e das FARC, de Cuba, da Coreia, nem do HAMAS, não é de bom-tom falar dessas coisas. Apesar de se saber e haver documentação em quantidade a provar que o Estado espanhol pratica a tortura de forma sistemática (não se trata de excessos de um ou outro torcionário mais desempoeirado) – espancamentos, tortura do sono, simulação de fuzilamento e afogamento, choques eléctricos, violações – e o assassinato político. Estas são denúncias que, apesar de partirem de insuspeitos organismos internacionais como a Amnistia Internacional e a Comissão da ONU para os Direitos Humanos, são sistematicamente silenciadas pelos poderes institucionais e pela comunicação social.