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Guillermo Almeyra

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Os estadólatras

Guillermo Almeyra - Publicado: Segunda, 14 Março 2011 01:00

Guillermo Almeyra

Embora haja alguns que se dizem até socialistas, na realidade são nacionalistas, identificam o Estado com o governo como se fossem sinónimos, especialmente quando este último é burguês nacionalista e confundem ainda o governo com o Líder, Chefe Máximo ou Condutor, ou o que quer que seja, porque têm traços comuns com todos os cessaristas que são nacionalistas e igualmente verticalistas.


De outra parte, acreditam cegamente no rótulo de "Não incomodar o motorista", quaisquer que forem as manobras do motorista e, por último, quando se declaram socialistas e marxistas, concebem o socialismo como sendo um mosaico, uma soma de socialismos nacionais.

São conservadores e o oposto do marxismo, para o qual a luta de libertação (nacional e social) tem um caráter histórico mundial e que considera que o Estado e a ideia da unidade nacional são expressões da alienação e que o político é a essência da vida social e nesta -e não nos círculos dirigentes- há que concentrar a análise e depositar as esperanças de mudanças democráticas e igualitarias.

São, além do mais, mecanicistas, e aplicam fórmulas eternas. Nos anos 20 a rebelião de tribos e clãs da Argélia e do Rif marroquino contra França e Espanha foi apoiada pela esquerda revolucionária mundial, tal como a defesa da Etiópia feudal e esclavagista do Negus Haile Selassie nos anos 30 contra o colonialismo invasor dos fascistas italianos. Trotsky chamou também a apoiar o México de Lázaro Cárdenas ante a ameaça de invasão anglo-estadunidense. Os estadólatras deduzem de isto todo que sempre, em todo conflito entre um país semicolonial e o imperialismo, o primeiro e essencial é se opor a este. Por isso não faltaram os que, na Argentina e nos governos "progressistas" do Peru dos militares nacionalistas (ou no governo revolucionário de Cuba, por exemplo) alinharam junto à ditadura militar argentina (que estava em guerra com seu próprio povo e era pró-imperialista), quando esta, para manter seu poder cambaleante, tentou a diversão da Guerra das Malvinas. As Malvinas, sem dúvida, são argentinas e serão recuperadas algum dia, mas argentinos -dissemos então- eram também os 30 mil desaparecidos, os exilados, os torturados, e o essencial era derrotar a ditadura para poder começar a construir um regime democrático e independente do imperialismo. Os estadólatras "de esquerda" cometem hoje na Líbia o mesmo erro malvinense.

É certo que "rio revolto, ganho de pescadores", e é verdade que o imperialismo estadunidense, em concorrência com os imperialismos europeus, trata de tirar proveito da rebelião contra a ditadura de Muammar Kadafi, para se apoderar do petróleo que hoje está em mãos de franceses e italianos. Mas os pescadores não provocam a enchente do rio. Nem as crianças podem acreditar na teoria conspirativa segundo a qual a CIA e o Mossad israelense provocaram uma rebelião de milhões de pessoas que vai desde Marrocos até Iêmen e os emiratos árabes e que já derrubou o tunesino Ben Ali, agente francês, e o egípcio Mubarak, agente dos Estados Unidos e principal sustento de Israel e carcereiro dos palestinos de Gaza, nem podem aceitar também não que essas agências estão destruindo voluntária e conscientemente todo o dispositivo criado por Washington, com os acordos de Campo David e o fortalecimiento das tiranias árabes.

Kadafi é indefensável, entre outras coisas porque, desde 1986, além de ditador e sustentador das outras ditaduras da região, é um agente do imperialismo e converteu-se em um grande investidor com dinheiro roubado. Buscar uma saída política e uma mediação, em troca, é necessário e correto, mas a condição, no entanto, de buscá-la onde seja exequível -por exemplo, a Liga Árabe- e não propondo uma comissão encabeçada por um ex presidente imperialista cujo irmão esteve também em negócios turbios com Kadafi.

Não há outro caminho digno que apoiar a rebelião, buscar uma cessação o fogo, cortar assim de raiz os pretextos para uma intervenção militar dos Estados Unidos, por livre, contra as Nações Unidas, onde o veto chinês e russo lhe impediria contar com o consenso dessa organização, e contra da vontade de seus sócios italianos e franceses na OTAN. Se Kadafi esmagasse à rebelião mau armada, não só sua ditadura seria ainda mais feroz com também aumentaria sua dependência do imperialismo. Se, em lugar disso, deixasse o poder mediante uma saída negociada, existia o risco de que um debilísimo governo de transição se submeta às grandes potências imperialistas, às quais deve vender o petróleo e das quais deve comprar alimentos e tecnologia.

Na sociedade libia -onde nos últimos 40 anos não tiveram sindicatos independentes, partidos, nem um jornal independente- as solidariedades são de clã, de tribo, regionais. A religião, salvo no caso da seita nacionalista e xenófoba dos Senoussi, que não tolerará uma ocupação ou intervenção estrangeira, e que se opõe a Kadafi, não é um fator decisivo. Na direção dos rebeldes há, portanto, desde ex ministros de Kadafi (Al Jalil), pró-estadunidenses, até ex militares nasseristas (Ao Hariri) encarcerados durante 17 anos por suas ideias à esquerda de Kadafi. Até agora essa direção se opôs à intervenção imperialista e disse que a combateria, mas se fosse encurralada não se sabe que poderia fazer. Ora, se vencesse, poderia formar um governo muito moderado frente ao capital estrangeiro. Mas o povo libio sentiria sua própria força e, sob a influência da esquerda tunecina, começaria uma rápida evolução. Sobretudo porque a estabilidade da produção petrolífera e a dominação imperialista na região foram gravemente magoadas pela rebelião, que é necessário aprofundar.

Fonte: La Jornada.

Tradução: Diário Liberdade.


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