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Séchu Sende

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Em coluna

Haiku Molotov e 65

Séchu Sende - Publicado: Sexta, 28 Janeiro 2011 01:00

Séchu Sende

Publicamos a seguir um poema e um conto do escritor amigo e colaborador do Diário Liberdade, Séchu Sende, em que reflete sobre a luita operária da greve geral galega e o atraso da reforma na Galiza.


sechu_coquetelHaiku Molotov

Sairemos à rua

com cócteis molotov

quando cumpramos os 65 anos?

 

 

 

 


 

65

Despois de passar polo súper por pam, duas latas de sardinhas, um litro de cerveja e os iogurtes achegou-se à gasolineira por um litro de gasolina.

Manhá facia 65 anos e sorriu pensando que seguramente Lois a sorprenderia com um flam de ovo e umha velinha que apagar dum sopro.

Telefonou, Lois, si, Ola, Amália, Si, Lois, encontrei umha amiga que nom via desde há mais de trinta anos… Amália, chama-se Amália, Como tu! Si, que coincidéncia! Trabalhamos juntas há muitíssimo tempo e nom a vejo desde aquela… E convidou-me a cear… Vou tomar algo com ela e já vou para a casa… A recordar velhos tempos? Ahá. Mui bem, carinho, Um bico, Um beijinho.

Havia anos que nom lhe mentia a Lois. Nem sequera recordava qual fora a última. Talvez aquela que… Nom, nom recordava e isso que já se figera de noite e de noite sempre recordava essas cousas um pouco melhor.

Entrou a tomar um vaso de leite quente numha cafetaria e agradeceu que lhe pugessem duas galhetas para acompanhar. Apanhou o jornal, esse que levava atopando toda a sua vida em quase todos os bares, porque era o que melhor mentia, o que enganava mais disimuladamente. Chegou-lhe com ler os titulares da primeira página para recordar porque tinha aos seus pés o litro de gasolina.

Sacou um livro do peto do chaquetom e puxo-se a ler. Era um livro de contos e puido ler quatro contos e médio até que se deu conta de que apagaram o televisor e queriam fechar o bar. Já passaram tres horas!

Saiu do bar e deu umha volta pola cidade. Logo botou mao da botelha de cerveja e bebeu-na pouco a pouco, sem présa, sentada no parque que há detrás daquel edifício, baixo as magnólias. Ali acabou de ler o quinto conto, á luz dumha farola.

Era o teléfono. Que tal todo, Amália? Bem, Lois, já vou para a casa, vou de volta. Recordei muitas cousas com Amália… Que curioso que se chame igual que tu… Si, e parecemo-nos muito… Bem, recorda que manhá é sábado e tes que erguer-te ás nove… Um bico, Lois, Um beijinho, Amália.

Encheu a litrona com a gasolina e tirou do pantalom o seu pano branco com o A bordado numha esquina. Molhou-no no combustíbel. E ficou ali sentada com o cóctel molotov na mao. Era o primeiro cóctel molotov que fazia na sua vida. Era o seu próprio agasalho de sexagésimo aniversário… Se-xa-gé-si-mo, repetiu.
Esquecera algumhas cousas nos últimos tempos mas nas últimas semanas recordava a diário algo que sucedera havia já mais de trinta anos.

Aquel dia que, recordava-o perfeitamente, pensou que deveria saír á rua com um cóctel molotov junta aquela gente daquela manifestaçom contra a reforma do sistema de pensions e a idade de jubilaçom...

O que recordava perfeitamente era que ela nom figera nada. Nada mais que ler a notícia no jornal ao dia seguinte.

Ergueu-se, mais de trinta anos despois, ocultou o rostro com a bufanda, -sabia que havia cámaras espreitando as proximidades-, apanhou a litrona, prendeu o lume e, reunindo todas as forças que perdera nos últimos anos, guindou o cóctel molotov contra aquel edifício, com mais de trinta anos de retraso.

Logo afastou-se pasinho a pasinho. Tinha que descansar. Manhá havia que ir trabalhar.

sechumolotov


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