Que o leitor não se preocupe: com esta nota, para mim, a discussão com Borón fica fechada porque, na realidade, eu não escrevi sobre um homem "com o qual tive sempre uma relação cordial- mas sobre uma espécie particularmente perigosa nos momentos em que há que ter decisões acertadas que padece o que chamo "a síndrome do ônibus" e acatam o cartaz "Não molestar motorista", porque são "homens de ordem". É o gênero de pessoas que não criticava os dirigentes soviéticos "para não fazer o jogo ao imperialismo" (o qual, certamente, se mantinha e reforçava graças a esses líderes) e que não critica nenhum dirigente revolucionário que se equivoque. E não porque não veja os erros, mas porque esse gênero de pessoas não se sente parte consciente de uma luta contra o capitalismo, delegando o pensar e o resolver em mãos desses líderes, os quais vê como chefes e aos quais serve incondicionalmente, descobrindo eventuais erros só quando o Líder já os denunciou.
Antes de passar aos insultos e "argumentos" de Borón (em seu documento "O que Almeyra não vê", em kaosenlared.net de 6 deste mês), quero lembrar duas coisas: 1) fui secretário do Comitê Argentino de Solidariedade com Cuba em 1957, dois anos dantes da entrada vitoriosa dos revolucionários em Havana e desde então defendo permanentemente a Revolução Cubana (que não identifico no entanto com a cada ato de seu governo nem com cada dirigente) e o direito de autodeterminação dos povos, como o cubano, em sua luta contra o criminoso estado de guerra permanente que lhe impõe o imperialismo; 2) fui membro, no México, do Tribunal Internacional Benito Juárez que avaliou os danos diretos e indiretos causados à economia cubana pelo bloqueio e as agressões imperialistas com a participação decisiva de conhecidos juristas e economistas cubanos, de maneira que não ignoro que, quando falamos da economia da Ilha, não nos estamos referindo à de Luxemburgo como Borón 'boroneia'.
Passemos agora a resumir a resposta dele: diz que o ataco sem razões prévias por meu "visceral stalinismo" e que o faço "com tom e estilo stalinista". Para um militante que desde 1948 combateu sempre o stalinismo e sua violência isso, independentemente do absurdo e infantil que parecer, é um insulto. Sustenta que ele sempre criticou o stalinismo em seus cursos, coisa que não duvido. Mas eu falei de outra coisa, da inexistência de um balanço teórico e de uma condenação escrita ao stalinismo tanto do governo cubano como dele, que jamais li já que a "explicação" de Fidel Castro sobre o derrube da URSS e de seu Partido Comunista (de 18 milhões de membros) segundo a qual a URSS foi "esfaqueada pelas costas" e traída por poucos dirigentes não explica nem condena nada nem pode ser levada a sério. Com tretas 'boroneia' pretendendo fazer-me dizer nada menos que Cuba teria deixado de combater o imperialismo, quando o principal contributo de Cuba para a luta de libertação colonial reside precisamente em sua heróica luta anti-imperialista pela independência nacional e quando a base principal do consenso político da maioria dos cubanos é sobretudo a decisão inquebrantável de não deixar que Cuba seja uma nova Porto Rico. é claro que eu tinha escrito que além da luta contra os Estados Unidos, em determinado momento Cuba deveu brigar também contra as pressões da União Soviética e da China, e assinalei isso para ressaltar as terríveis dificuldades que tinha devido enfrentar e a coragem com que tinha mantido um rumo sem claudicações, quaisquer que tenham sido os erros. Portanto, ao boronear deste modo quem é que Borón quer convencer?
Boron sustenta que minhas críticas servem ao imperialismo, são iguais às de Vargas Llosa e suas compinches e são próprias das grutas de Miami e que lanço uma "catarata de agravos e infúndios sobre a Revolução cubana" à qual, certamente, identifica com o projeto que critico e, de modo mais geral, com cada posição do para ele infalível governo cubano. Depois vai mais longe do que Fidel Castro, que em seu momento se autocriticou não por ter tentado conseguir uma safra recorde, mas por ter desorganizado a economia para a conseguir, e sustenta que não entendo a coragem da luta dos cubanos por sua independência e pela construção do socialismo, ainda que precisamente, por entender e sustentar essa coragem e essa revolução, estive preso num cárcere de alta segurança do "democrático" governo de Frondizi. Continua dizendo que qualifico o que há em Cuba como pseudosocialismo, quando nego que seja socialismo, porque este não se pode construir num só país. Sustenta também que o Projeto apresentado ao VI Congresso do PC cubano é só isso. Mas, na realidade, já foi oficializado na Gaceta Oficial em outubro e as discussões amplas que se realizam atualmente buscam emendar detalhes e medir o ambiente político, ainda que as medidas já se estejam aplicando e não tenham sido elaboradas com a participação prévia dos trabalhadores (coisa que Borón esquece). Este fica também horrorizado ante minha proposta de reduzir os privilégios dos altos setores burocráticos, incluídos os militares e finalmente me aconselha imitar Marx, que apoiou Lincoln, e Trotsky, que apoiou Cárdenas. Mas Marx nunca disse que Lincoln era comunista, nem Trotsky se fez cardenista. O problema de boronear é que ao o fazer se confunde o necessário apoio a todo processo progressista e revolucionário com a necessidade de o idealizar e de o identificar com os governos que não é possível criticar...
Sobre Cuba estou escrevendo desde faz meio século. Com certeza, não me considero infalível nem nas críticas nem nos elogios, mas continuarei cumprindo com meu dever de contribuir sempre para um pensamento crítico, positivo, orientado para a revolução e não me parece que deva mudar de atitude. Lamento se Boron se sentir ofendido, mas o de Cuba afeta-nos a todos de um modo dramático e não podemos olhar para outro lado enquanto outros decidem sobre os cubanos e sobre nós mesmos.
Fonte: Página13.
Tradução: Diário Liberdade.