Brigas comuns num conflito lingüístico.
Som estes altos calores os que habitualmente empecem que o debate seja construtivo e enriquecedor. Deixemos, pois, arrefecer os miolos e apliquemos a dúvida cartesiana aos nossos conhecimentos lingüísticos. Tornemos axiomas em hesitaçons.
É axioma aceite, mesmo para reintegracionistas, achar a norma ILG-RAG umha representaçom fiel da fala popular. O reintegracionismo seria invento polo que renunciaríamos, em parte, às nossas peculiaridades lingüísticas mas, em troca, permitiria-nos aceder a umha língua extensa e útil.
E isto é, com certeza, um dos óbices do reintegracionismo pois aventuro que 90% de neofalantes abandona o castelhano polo galego-português por razons identitárias.
Porém, mais umha vez, o que nos foi ensinado como verdade irrefutável é miragem.
A forma de escrever o português moderno está alicerçada numha koiné literária medieval criada polo povo galego para a representaçom das suas falas.
Assim se explica que o advérbio bem represente à perfeiçom os falares da Galiza e nom o galego lusitano que teria de escrever baim se quigessese ser fiel à sua fala popular. O mesmo acontece com substantivos comuns como caixa que o padrom português escreve à galega e nom caxa, como corresponderia ao seu padrom fonético.
No entanto, a prova mais evidente da validez das teorias reintegracionistas é a sua perseguiçom e marginaçom. Para que reprimir ideias e práticas que fossem simples tolices inofensivas?
Entendo que grande parte de galego-falantes conscientes tenham reticências para se identificarem com o reintegracionismo.
Muitas vezes custa-nos perceber que ao renunciar ao castelám, língua de poder e de prestígio, polo galego, língua minorizada e, para o discurso dominante, minorotária, fai-se por identidade. Nom obstante, o reintegracionismo leva anos a vincar o seu discurso na utilidade da nossa língua, descuidando o factor identitário.
É evidente que viver plenamente em galego-português na Galiza é ir na contramao, a velha luita de Davi contra Golias. Muda-se para o galego, permitide-me que pegue emprestado nos formosos versos do Celso Emílio Ferreiro, em solidariedade com os que “suam e choram um pranto cotiám de borboletas”. Fai-se pola negativa radical a perder o que o engenho e criatividade deste povo fijo há centos de anos. Fai-se polo triste que supom ver morrer a expressom máxima de umha cultura. Fai-se por orgulho, por auto-estima, por afouteza. Por vontade de ser.
Ao se passar ao galego nom há escolha. O reintegracionismo ou se desconhece ou se tem umha imagem distorcida e negativa dele. Dizia o independentista cubano José Marti: “saber é poder”. Neste caso nom se sabe, portanto, nom se pode. Escreve-se à castelhana.
Identifica-se, desta maneira, como galega umha grafia construída sobre o castelám e desde a ignoráncia mais absoluta à nossa tradiçom escrita, à nossa história, a nós próprios. Identifica-se como galega umha grafia alheia carente de todo o rigor filológico, criada a finais do século XIX com mais vontade do que conhecimento.
É curioso observar como, às avessas do que ocorre em qualquer disciplina científica, os descobrimentos relacionados com a história escrita do galego nom som aproveitados. É como se ao descobrir Darwin a origem das espécies continuássemos a negar que o ser humano provém do macaco.
O galego, ao contrário que o resto das línguas romances, nom nasceu, segundo este discurso, na Idade Média, senom há menos de um século. A grafia medieval sobre a que se baseam todas as línguas romances nom é tida em consideraçom para o galego.
Assim, é singelo dizer que som línguas diferentes. Igual que se distingue um cam de um pássaro. O cam tem pêlo, o pássaro penas. O galego tem ñ o português nh.
O mesmo aconteceria se o inglês o escrevéssemos à castelhana, petuláncia que, com certeza, é possível. Ninguém diria que isso é inglês...
Às vezes penso que essa poderosa e potente força descoordenada de gente que luita pola normalizaçom da língua e que ama o galego é grande em número mas reduzida em tamanho. Como as formigas, apenas vemos cousas pequenas mas nunca enxergamos as grandes.