Com diferentes leituras, a formação política liderada por Pablo Iglesias teve importantes resultados em Madrid, em Valência, na Galiza e triunfou no País Basco e na Catalunha. Cientes da necessidade de solidificar os resultados obtidos nas eleições regionais, os dirigentes do Podemos piscaram o olho ao eleitorado independentista e apesar de defenderem a unidade de Espanha reiteraram o seu compromisso com uma reforma constitucional que abra caminho a referendos que permitam aos diferentes povos decidir o seu próprio futuro. O discurso das esquerdas independentistas de que a solução para a ruptura com a crise do capitalismo passava pela ruptura com o Estado espanhol foi suplantado pela ilusão de que seria mais fácil para uma nova força como o Podemos chegar ao poder e protagonizar transformações importantes. Em parte, é o que explica os avanços nas regiões onde o independentismo está mais amadurecido: Catalunha, País Basco e Galiza.
Na Catalunha, depois de negociações que incluíram o reconhecimento do direito à autodeterminação daquele povo, o Podemos conseguiu integrar a Esquerda Unida e as forças que lideram, hoje, a alcaldia de Barcelona, entre elas, a presidente Ada Colau. Outro dos factores que ajudou a formação de Pablo Iglesias foi a ausência da Candidatura de Unidade Popular (CUP). A organização independentista de esquerda tinha conquistado um importante resultado nas eleições autonómicas e é a chave nas negociações que todavia se desenrolam no parlamento catalão para eleger o governo regional. A decisão de não se candidatar ao congresso espanhol de deputados deixou um vazio à esquerda que foi ocupado pelo Podemos.
A receita aplicada na Galiza foi parecida à da Catalunha. Nas eleições regionais, com o apoio do Podemos, diferentes forças políticas coligadas arrebataram importantes cidades numa região que sempre foi um feudo do PP. Para além de perder A Corunha, Compostela e Ferrol, a direita espanhola ficou fragilizada em muitos dos municípios galegos. Agora, sob o nome En Común, a receita passou pela aproximação entre formações espanholas como o Podemos e a Esquerda Unida com organizações independentistas como a ANova-Irmandade Nacionalista, liderada por Xosé Manuel Beiras - dissidente do Bloco Nacionalista Galego (BNG) - que inclui, entre outras, a Frente Popular Galega. Apesar do PP voltar a liderar as contas eleitorais na Galiza, sofreu uma queda valente e, perigosamente, vê aproximarem-se as forças encabeçadas pelo Podemos. Mas estas são também eleições trágicas para a esquerda independentista que se recusou aliar à esquerda espanhola. Durante décadas, a presença da Esquerda Unida na política galega era praticamente inexistente. Sem grande concorrência à esquerda, era o BNG que liderava o discurso independentista que, apesar de descafeinado, tinha presença no parlamento espanhol. Curiosamente, nos últimos anos, com a saída de um importante grupo de militantes, que acabou ao lado de Beiras e do Podemos, as suas posições radicalizaram-se, o que, ainda assim, não conseguiu evitar a hecatombe eleitoral.
Extraordinária foi também a quebra de votos na esquerda independentista basca. Depois do cessar-fogo da organização armada Euskadi Ta Askatasuna (ETA) e do fim das proibições à participação eleitoral de partidos vinculados com essa linha política, as coligações lideradas pelo Sortu foram somando surpreendentes vitórias que ameaçaram o domínio do conservador Partido Nacionalista Basco (PNV). Contudo, a nova estratégia da esquerda independentista, demasiado presa à lógica institucional, começou a perder apoio nas últimas eleições. O descontentamento interno com as constantes cedências nas posições políticas, a suavização do discurso e o abandono dos espaços de confrontação tem feito crescer o perigo de uma cisão na esquerda independentista basca. A coligação EH Bildu perde, inclusive, no seu bastião, a região de Guipuscoa cuja capital é Donostia (São Sebastião), onde fica atrás não só do Podemos como do PNV. Em Navarra, onde os bons resultados da esquerda independentista basca em conjunto com os do Podemos tinham permitido, nas eleições regionais e municipais, arrancar do poder a versão navarra do PP e dar a alcaldia de Iruñea (Pamplona) ao EH Bildu, não conseguem eleger sequer um deputado. A verdade é que o discurso descafeinado da esquerda independentista basca não difere muito do que propõe o Podemos e, apesar da importante derrota, nestes dias, quem passar os olhos pelo Gara - jornal que veicula as principais ideias do Sortu - pode ver piropos ao Podemos e ao seu avanço eleitoral.
Fonte: Manifesto74