O plano de fundo dessa estratégia política era conjuntural. Um aumento substancial do preço dos produtos primários que os países latino-americanos tradicionalmente exportavam e uma abundância de crédito no mercado mundial criou as condições para que sem superar a dependência e o subdesenvolvimento esses países pudessem promover - com particularidades próprias - ciclos de amplo crescimento econômico com grande redução das desigualdades socioeconômicas (Venezuela e Bolívia) ou redução significativa do pauperismo relativo e absoluto sem redução das desigualdades (Nicarágua, Brasil, Chile, etc.); no plano político os principais partidos do bloco burguês não tinham condições de operacionalizar a continuidade da gestão da ordem burguesa e surgiram crises de legitimidade política ou até da ordem do capital. Certo nível de compromisso das classes burguesas era um imperativo momentâneo de acordo com a conjuntura concreta de cada país. Os partidos políticos de origem proletária que aceitaram operacionalizar a hegemonia burguesa aplicando o social-liberalismo, como o PT, acabaram como consequência se enfraquecendo, enfraquecendo sua base social, perdendo espaço no conjunto da sociedade.
Quando a base material desses projetos esgotou-se - materializado principalmente na redução do preço dos produtos primários e nos limites do ciclo econômico de crescimento que para continuar necessita de reformas profundas contra o padrão neoliberal de reprodução do capital - e a burguesia conseguiu recuperar o terreno político perdido, os projetos social-liberais (Argentina e Brasil) e nacional-reformistas (Equador e Venezuela) entraram em crise ou estão em processo aberto de falência. A derrota do candidato kirchnerista na Argentina, a política agressiva de privatizações, retirada de direitos e apoio ao conservadorismo do PT, a crise e ruptura entre movimentos sociais e Rafael Correia no Equador, a participação do Chile nas negociações do Tratado Transpacífico, a crise do bolivarianismo na Venezuela e a vitória da ala conservadora da Frente Ampla no Uruguai anunciam a crise do paradigma dominante na esquerda latino-americana. A ideia geral de um projeto pós-neoliberal de reformas profundas, mas não anticapitalistas ou de uma política neodesenvolvimentista que não romper com as reformas estruturais do neoliberalismo, mas pretende atenuá-lo em nível de política econômica, está em crise; respira com aparelhos depois da vitória eleitoral de Macri na Argentina e pode ter morte terminal na eleição do dia 6 de dezembro na Venezuela. Curiosamente o único país da onda "pós-neoliberal" que não vê seu projeto em crise é a Bolívia, onde o MAS (partido de Evo e linera) demonstra uma vitalidade impressionante. Tempos difíceis nos aguardam!