Elas tão santas e virgens, com o seu véu preto e blusas sem decote, com os seus grandes gabões fingindo castidade. Eles tão cavalheiros com os seus artifícios de romanos, fariseus e tudo quanto mande a Santa Bíblia, as Santas Escrituras que ordenam a submissão da mulher e que aprovam a misoginia do homem. Essas escrituras homofóbicas feitas na medida para serem abomináveis, tanto quanto o homem das neves.
São romarias de hipocrisia nas quais desfilam estupradores com ou sem sotaina. As fileiras de observadores à margem da banqueta, cuidando para que não se caia o tapete por onde passará a procissão dos agiotas. As putas santificadas em tempo de Semana Santa, como em salmoura de quarentena. Os farsantes, assassinos, genocidas e saqueadores oligarcas.
Aí estão os patriarcais que impõem as normas de duvidosa moralidade e os desfiles de embusteiros aos quais os estupradores de sotaina lavam-lhes os pés em nome do santo teatro patriarcal, enquanto eles dessangram ao povo. Aí estão os filhos do seu ring cromado, dando três golpes no peito na missa dos corruptos da igreja, do estado e da sociedade puritana e os exploradores laborais, aqueles oligarcas e empresários, os quais, ao sair, da missa continuam a fraude milionária e metidos até o pescoço no tráfico de meninas, adolescentes e mulheres para fins de exploração sexual.
Aí estão as “senhoras” que saem da missa e continuam explorando as suas empregadas domésticas e o estudante universitário que, como finalidade, quer terminar a escola para estafar a quantos necessitados cruzem os seus caminhos, e com a benção de Deus! Aí também estão os que fazem da submissão o seu estilo de vida, hábito de todo o manso acomodado que omite para o seu bem-estar pessoal.
Aí estão os que se confessam com sacerdotes acossadores que levam nas suas pesadas consciências os estupros de meninos indefesos e esses que continuam vendo o aborto como um assassinato, culpando às mulheres das suas violentações e acusando-as de provocadoras, tratando o culpado como uma pobre vítima que não pôde resistir a tanto acosso da mulher submetida e, por isso, se viu forçado a estuprá-la.
Aí estão também estes pastores de igreja, ladrões caras-de-pau que exigem o dízimo para fazer o que bem entender em nome do Deus dos cristãos. Aí está o atrevimento de colocar alto-falantes fora das igrejas para obrigar aos vizinhos a escutar os seus sermões mesquinhos. Esses que dizem que o seu deus é um deus de abundância (para eles mesmos, óbvio) enquanto dessangram aos fiéis.
São os que dizem que orando tudo se resolve, que chamam à passividade da sociedade e que metem as suas orações e as suas retóricas em louvor e em retiros espirituais, cultos e células. Esses dizem que na cadeia de oração é possível salvar o mundo (deles mesmos) e que o óleo milagroso que vendem sara com apenas uma gota o mal olhado e diminui qualquer febre sexual, a qual sem o casamento e a bendição de Deus é impura. As rezas exclusivas que vendem de casa em casa, em visita única de pastor mercantilista, pois dizem que eliminam qualquer erotismo e que salvam do pecado da perversidade qualquer aberração homossexual. Pois, que me deixem no inferno, aí nessa fogueira sou feliz me queimando a meu gosto!
São esses os que têm relações sexuais com quantas adolescentes chegarem confundidas pedindo guia espiritual. Tudo em nome do Senhor! E isso, claro, não é questionável, nem sancionável com respeito à justiça e à moral. Porque foi Deus quem apareceu para eles em forma de sapato e lhes disse que o fizessem. E eles, pois, obedeceram, já que se deve escutar a Deus (caso você não saiba que ele castiga). E leva um grande teatro se humilhando até que o fugitivo entra de novo no redil! Esses sacerdotes e pastores muito bem treinados na arte do engano e da dominação mental da massa as motivam a continuarem submissas e no total abandono da resignação celestial. São ricaços que se sentam na primeira fila da missa e do culto, mas que, ao sair, vão direto para ao motel estuprar meninas ou agridem física e emocionalmente as suas companheiras.
Para as vésperas e durante a Semana Santa é mais visível a fé dos povos desinformados, sem oportunidades de desenvolvimento, submetidos, escravizados, agredidos pelo sistema opressor, enganados por uma igreja que os utiliza para encher as suas contas bancárias. Desta forma, continuam alimentando uma religião que dizem que um dia as coisas mudarão se confiam no deus dos contos misóginos escritos na Bíblia. Também para as vésperas e durante a Semana Santa as ruas se transbordam de multidões que rezam ao deus dos abusadores patriarcais.
A este povo ao qual ensinam que ter relações sexuais sem a bendição de Deus é pecado capital, a este povo ao qual dizem que a masturbação é mesquinha (e tão boa que é!) que mulher deve obedecer ao homem e que o homem, por sua vez, pode abusar porque é a cabeça do lar. A este povo ao qual lhe dizem como se vestir, o que colocar, o que e como rezar. Essa igreja e essa religião que dizem que quem deve chegar virgem ao casamento é ela, a mulher; para o homem está “liberado” pela sua condição de garanhão. Nenhuma das duas situações anteriores! As pessoas transam quanto tem vontade e ponto final. Abaixo os prejuízos religiosos!
A esse povo ao qual com rezas o tornaram manso, tão adestrado que é incapaz de duvidar e de formular uma análise própria. Aquele que não se mobiliza porque tudo deve deixar nas mãos de Deus, quem tudo vê e tudo condena, castigando aos culpáveis e distribuindo bonança aos que lhe confiam tormentos.
Por essa razão, os sacerdotes e pastores estupradores não são denunciados, pois serão julgados por Deus. Por essa razão, eles continuam abusando dos fiéis, enriquecendo com o dízimo, as ofertas e as ajudas que o estado e a oligarquia lhes dão. Por essa razão, engravidam a meninas as quais depois eles mesmos, os fiéis e a sociedade taxarão de “caçadoras” e lhes negarão o direito legítimo ao aborto. “Que Deus nos guarde, é pecado!” Será ela a julgada e o estuprador continuará dando missa e recitando as suas mentiras no culto de domingo pela manhã.
A religião dá nojo. É jugo que há séculos não nos deixa pensar por conta própria, como uma corrente que nos escraviza moral e mentalmente; hipocrisia que é muito bem aceita pela sociedade e que não permite que os povos saibam, conheçam e utilizem o poder extraordinário que têm: o da voz e da mobilização. E, se atuassem e exigissem os seus direitos como se mobilizam para a Semana Santa com esse fervor tão passional, a história seria outra.
Porque ao longo da história existiram religiosos revolucionários, homens e mulheres de integridade, com uma consciência social inquebrantável e insubmissa. Seres exemplares que graças à fé conseguiram entrar na consciência dos povos e fazer com que vissem que a submissão só os prejudicava. Esses religiosos que não deixaram tudo nas mãos de Deus e das suas rezas são os que chamam às mobilizações e, se é necessário, a pegar nas armas para defender com sangue o que os aproveitadores querem lhes arrancar. Eles são uma classe à parte. Muitos mártires se encontram entre eles e muitos vivem atualmente.
Não estou aqui brigando com a fé, pois todos têm o direito de crer no que quiserem. Estou aqui para falar de submissão, do oportunismo, da ignorância, do engano e da investida do patriarcado misógino. E a quem a carapuça lhe servir, que vá rezar e dar três golpes no peito como um bom beato, “santinho” e hipócrita.
22 março de 2015.
Estados Unidos.
Notas:
1Animal mítico com o aspecto de cachorro da lenda mesoamericana.
2Personagem mitológico das Lendas Guatemaltecas (Leyendas Guatemaltecas). É representado como um anão com um largo chapéu e um violão que faz serenatas às mulheres e lhes trança os cabelos a fim de conquistá-las e levar a sua alma com ele.
3Espectro do folclore centro-americano. O personagem é relatado como uma mulher com o rosto escondido por um véu. Quando um homem se aproxima a ela, revela o seu rosto de cavalo (ou de caveira, em algumas versões), enlouquecendo ou matando a quem a viu.
4Personagem do folclore hispano-americano que assusta às pessoas com o seu grito e choro.
Tradução de Camila Lee para o Diário Liberdade.