Em 2002, o então juiz Baltasar Garzón ordenou que se abrisse investigação contra centenas de cidadãos bascos que gerenciavam as Herriko Tabernas, acusados por ele de serem ligados ao partido Batasuna e de "financiarem o terrorismo" da ETA.
Naquela época, corria um processo longo de criminalização de forças de esquerda nacionalista, com centenas de prisões e ilegalizações, resultando em inúmeras denúncias de tortura contra ativistas de esquerda.
Garzón é acusado pela esquerda nacionalista basca de perseguição política por tornar ilegal o partido basco Batasuna (em 2003) e ordenar o fechamento de dois jornais nacionalistas, levando inclusive o diretor de um deles, Martxelo Otamendi, a ser brutalmente torturado pela polícia. Anos depois, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos condenou a Espanha por não investigar a tortura sofrida por Otamendi. Em 2012, Garzón foi expulso da carreira judicial por prevaricação.
Das iniciais 75 Herriko Tabernas investigadas, mais de 120 foram finalmente incluídas no processo ao longo dos anos até que, finalmente, 36 pessoas acabaram acusadas de financiar o partido Batasuna e a ETA, dentre eles, destacadas figuras políticas como Joseba Permach, Rufi Etxeberria e Floren Aoiz.
Sob críticas da Esquerda Abertzale (nacionalista) e de organizações como a Lokarri – que lidera o processo de paz na região frente ao fim iminente da organização armada ETA –, 20 cidadãos foram condenados pela Audiência Nacional a penas que vão de um ano e três meses a três anos de cadeia. Foi ordenado ainda o fechamento de 111 locais considerados Herriko Tabernas.
Foram 12 anos de um processo político que buscou ilegalizar toda uma opção política e visou silenciar uma parte considerável da cidadania basca. A tática do medo, das ilegalizações e torturas, mesmo após os anúncios da ETA, de seu fim iminente e da entrega de armas que começou a pôr em marcha de forma unilateral, parece não ter deixado de pairar sobre o País Basco e ativistas nacionalistas ou abertzales.
A Espanha tem tradicionalmente considerado que qualquer organização que se reivindique como sendo parte da "Izquierda Abertzale" automaticamente faça também parte da ETA e, em geral, tem buscado torná-las ilegais e, no processo, levado centenas de cidadãos bascos à cadeia sem que, por sua vez, qualquer tipo de ligação entre as diferentes organizações seja efetivamente comprovada. Trata-se, acreditam muitos, apenas de processos políticos com o objetivo de frear o processo de paz e simplesmente provocar os independentistas bascos.
O processo de paz no País Basco tem sido levado unilateralmente pela ETA e verificado pela organização Lokarri com a ajuda de um grupo de verificadores internacionais, especialistas em processos de desarmamento e paz, e sob os auspícios de um variado grupo de prêmios Nobel da Paz interessados em uma solução pacífica para um conflito que se arrasta ha mais de meio século.
É notável que não apenas a classe política espanhola se mostre refratária ao processo de paz, mas também amplos setores da justiça espanhola. É sabido que aos dois partidos dominantes da política espanhola, PP e PSOE, interessa a continuidade do conflito e o acirramento de ânimos como uma forma de neutralizar o discurso nacionalista que se fortalece a cada dia.
O processo de independência da Catalunya acendeu a luz vermelha do governo espanhol e de sua classe política, pois a animação dos catalães poderia contagiar os bascos, caso estes não tivessem mais que se preocupar com seu conflito histórico.
Como lembra a nota da organização Lokarri, "esta sentença chega em um contexto histórico marcado pelo fim da violência da ETA e pela oportunidade que a sociedade basca tem para construir uma convivência pacífica e democrática. O objetivo é conseguir que nenhuma pessoa seja ameaçada ou perseguida por suas opiniões ou atividades políticas, garantindo a liberdade e a segurança de todas as pessoas. Esta sentença não ajuda em nada a conseguir este objetivo. É um obstáculo e uma nova dificuldade para esta importante tarefa da sociedade basca".
O conflito, enfim, interessa como forma de jogar fumaça sobre um debate maior e mais importante, que é a decisão coletiva do futuro da nação basca. Em suma, a paz não interessa à Espanha, mas é primordial para que os bascos possam dar passos adiante em seu processo soberanista.
A maior parte dos condenados já cumpriu anteriormente suas penas, parcialmente ou em sua totalidade, mesmo assim, a defesa irá recorrer ao Tribunal Supremo Espanhol.