Pataca é o mais vulgar, baloca um regionalismo do Barbança e batata minoritário mas, ao mesmo tempo, padrom no poderoso espaço lusófono. Porém, talvez o poético castanha-da-terra represente a mundividência mais autenticamente galaica.
No afastado século XVI, Pero Vaz de Caminha informava no primeiro texto escrito em galego na América que os portugueses ao pisarem o novo continente decidiram testar a disposiçom dos índios tocando gaita-de-foles e tamboril. Aliás, neste novo mundo logo descobrirám uns frutos secos aos que chamarám, como os galegos farám depois com as batatas, de castanhas. Foi essa idiosincrasia lírica galego-portuguesa, essa cosmovisom comum, a origem das denominaçons castanha-de-caju e castanha-do-pará.
Ao conhecer o Brasil, qualquer galego ou galega observadora comprovará como pequenas realidades do mundo rural da Galiza protagonizam o quotidiano dos grandes centros urbanos do gigante latino-americano. Eis a broa convertida em fast-food nas lanchonetes ou nos congelados do supermercado; o rodízio do moinho tornado formosa metáfora nas churrascarias, pizzarias ou restaurantes japoneses ou a corriqueira capoeira, gaiola de capons, transformada numha espetacular arte-marcial de origem africana. “O que mais me impressiona do Rio é que às vezes me fai sentir na minha aldeia”, confesou-me umha vez um conterrâneo amigo.
Da ótica do povo russo o arco da velha tem oito cores, para os maias os seres humanos somos feitos de milho e os índios do Amazonas, como os esquimós com a cor branca, distinguem a mais várias tonalidades de verde. A perspectiva de galegos e portugueses é enxergamos castanhas onde outros simplesmente vem outras cousas. Os gauleses, por exemplo, vírom maçás -pomme de terre- quando a batata chegou à França. Eram tam comuns os castanheiros nos nossos montes que mesmo o específico souto -conjunto de castanheiros- substituiu o geral bosque em muitas terras da Galiza e Portugal.
Hoje alguns meninhos e meninhas da Galiza, com sorte, aprendem o que som as castanhas-da-terra. Porém, decerto, ninguém lhes deixa enxergar castanhas nos anacardos ou nos coquitos de Brasil, respectivos nomes castelhanos para a castanha-de-caju e da castanha-do-pará. Para falar verdade, estes frutos exóticos, alheios até há pouco ao nosso dia a dia, nunca fôrom batizados na Galiza. Mas, será que há algo mais galego que um gaiteiro, um tamborileiro e umhas castanhas? Di o ditado popular, cada um fala da feira como lhe vai nela. Está na hora de reparar que portugueses e brasileiros falam da feira bem parecido a nós.
Foto: Vendedor de rua de castanha-de-caju na avenida Rio Branco do Rio de Janeiro. Arquivo do Diário Liberdade.