Os desempregados em Portugal - 1 milhão e 400 mil em 2013 contra 480 000 em 2008 - são o número mágico que faz com que o trabalho se tenha transformado numa tortura, em que o medo de o perder é permanente; atrás dele vem a aceitação de salários mais baixos (quedas reais na ordem dos 30%), jornadas de trabalho maiores, trabalhos repetitivos e humilhantes, aceitação de tarefas que não estão contratualizadas, trazer trabalho para casa, à noite, ao fim-de-semana. “Livres” de estar presos permanentemente ao patrão, público ou privado, que usa o nosso tempo, todo - como e quando quer.
Quem trabalha, trabalha cada vez mais horas, com mais intensidade, e por isso cada vez pior. Enquanto mais de um milhão de pessoas se sujeita à humilhação de depender de programas assistencialistas ou da família para sobreviver. O paraíso da troika, do Governo, é este: fazer de toda a gente trabalhadores precários, que, a qualquer momento, ficam desempregados.
Ninguém vai escapar se continuar a caminhar só. Há reformas por invalidez a serem retiradas. Anuncia-se a intenção de descer o salário mínimo (que já é de miséria), mais cortes nas reformas. Os despedimentos de estivadores, de funcionários públicos, no sector privado, na RTP, na Lusa, são também o afundar da segurança social, até aqui o mais superavitário de todos os orçamentos, porque quem devia trabalhar está desempregado ou é precário, e por isso não desconta o suficiente.
É urgente unificar comissões de trabalhadores, desempregados e reformados. Para discutir a agora sobre esta ideia simples, que hoje parece tão difícil de compreender - emprego para todos.
Parece difícil porque o senso comum crê, e essa ideia passa todos os dias nos media como uma metralhadora, que riqueza e lucro são a mesma coisa. Ora, em economia, riqueza não é lucro. O emprego para todos não diminui a produção de riqueza no país, pelo contrário, aumenta-a porque colocamos a produzir 1 400 000 pessoas que são uma força de trabalho em potência (e formada para tal) mas não utilizada. E porque aqueles que estão a trabalhar passam a ser ainda mais produtivos porque trabalham melhor, justamente porque trabalham menos. O que ganhamos? Tudo: humanidade, tempo para viver, amar, passear, e, acima de tudo, pôr fim a esta tortura diária de não saber se amanhã vamos ter como sobreviver.
É urgente deixar os grilhões do passado, que nos impedem de ser consequentes, creio. Reconquistaremos uma utopia que ponha fim a esta dualidade tremenda, uma chantagem, na verdade, de que temos que aceitar viver com o pão e o salário mínimo, e nada mais, porque a alternativa é um regime estalinista onde também nada mais do que pão foi assegurado, com prisões e repressão. Uma sociedade que sabe que ninguém é livre entre desiguais mas que a liberdade não pode jamais ser questionada, está dentro das nossas possibilidades, não?
Quem paga a factura do sonho? A Galilei (BPN), o Grupo Melo, Mota Egil e Espírito Santo, Belmiro de Azevedo, Soares dos Santos, Amorim, Ricardo Salgado, António Mexia, Ricardo Espírito Santo, todos os boys que fizeram da política – que deveria ser a arte de tomar conta das nossas vidas – um desfile de medíocres. E, claro, pagam todos os Melos que falam francês, alemão, inglês e que vivem dessa renda fixa de capital, chamada por aqui de “dívida pública”.
E como fazemos nós para trabalhar sem eles? Vai ser difícil, afinal até aqui com eles a nossa vida tem sido um paraíso…