Mais que silenciar diante dos crimes do regime militar, o padre Jorge Bergoglio mostrou-se de uma proximidade incrível para com o sistema repressor, tendo inclusive uma carreira eclesiástica em ascensão meteórica: levou apenas três anos, desde sua ordenação, para liderar a Ordem dos Jesuítas na Argentina. Ele é diretamente envolvido em ao menos dois crimes da ditadura.
O primeiro, pelo qual foi denunciado à justiça em 2005, diz respeito a dois padres de sua Ordem, que foram seqüestrados pelos repressores em 1976: o regime militar desconfiava que fossem "subversivos" em decorrência de seu trabalho pastoral em favelas de Buenos Aires. Bertoglio então retirou a proteção eclesiástica dos sacerdotes, que foram sequestrados e torturados por cinco meses.
O segundo caso se refere a uma família que possui cinco de seus membros desaparecidos, incluindo uma grávida: ao procurar Bergoglio para denunciar a situação de seus parentes, foram por ele ignorados. A criança que estava para nascer sobreviveu e foi dada, como tantas outras, a uma influente família.
São crimes perpetrados pela ditadura, que Bergoglio poderia ter impedido, visto que tinha conhecimento, como mostra Horacio Verbitsky em seu livro "El Silencio" e Emilio Mignone em seu "Igreja e Ditadura", do perigo que corriam os padres, bem como dos sistemáticos sequestros de recém-nascidos pelos militares. Mas nada fez.
É certo que em 2012, já cardeal, Bertoglio escreveu uma carta pública se desculpando, em nome da Igreja Católica, pelo silêncio diante da ditadura. Mas não se pode esquecer que nesta mesma carta, além de praticamente igualar o terrorismo de Estado à resistência armada ao regime, nenhuma palavra foi dita sobre a cooperação da Igreja para com o sistema repressor.
A Igreja Católica perdeu uma oportunidade de se renovar. A escolha de um líder com o histórico de Bergoglio confirma não apenas um total descompromisso com relação ao direito à Memória, à Verdade e à Justiça, mas também serve como um indicativo de que as posições da Instituição, já deveras conservadoras, tendem a recrudescer.
Para além da colaboração com a ditadura, o recém-eleito pontífice já se posicionou de modo veemente contra importantes projetos de lei argentinos, como o da morte digna e o da legalização do aborto. Além disso, em 2010 manifestou-se radicalmente contra a legalização do casamento homoafetivo que, segundo ele, é "uma tentativa de destruição do plano de deus".
O nome escolhido pelo novo papa é Francisco. Espera-se que seja de fato uma homenagem ao Francisco de Assis, e não ao Francisco Franco.