A difusão pelo mundo de uma realidade virtual é hoje uma arma decisiva no agravamento da medonha crise global que atinge a humanidade.
O controle hegemónico do sistema mediático permite ao imperialismo, através da palavra, enganar os povos numa inversão do significado dos acontecimentos históricos que responde aos seus objectivos. Umamáquina de desinformação planetária transforma a mentira em verdade, inventa crises inexistentes, diaboliza líderes políticos, empurra países para a bancarrota, mascara o crime de virtude.
Na estratégia de dominação planetária hegemonizada pelos EUA, as guerras imperiais são agora precedidas de gigantescas campanhas que visam a anestesiar a consciência dos povos, impedindo a solidariedadecom as vitimas das agressões.
Essas campanhas, cientificamente montadas, seriam ineficazes sem a cumplicidade do Conselho de Segurança das Nações Unidas, transformado em instrumento do imperialismo colectivo.
Neste inicio do terceiro milénio da Nossa Era, guerras interimperiais como as de 14-18 e 39-45 passsaram a ser improbablilissimas. As contradições entre as grandes potenciais ocidentais não desapareceram, mas não são hoje antagónicas porque a crise estrutural do capitalismo as uniu numa santa aliança contemporânea no saque aos recursos naturais de países do antigo Terceiro Mudo.
Sem a passividade da Rússia e da China, também membros permanentes do CS da ONU com direito de veto, os EUA não teriam tido as mãos livres para empreender guerras criminosas como as do Iraque e doAfeganistão.
Na monstruosa guerra cujo desfecho foi a recolonização da Líbia temos um exemplo expressivo do funcionamento da estratégia imperial com participação activa da França e da Grã-bretanha. A campanhamediática precedeu as manobras no Conselho de Segurança e o início da agressão, preparada aliás com meses de antecedência. Projectos elaborados em Washington, apoiados pelo Reino Unido e a França e, na maioria dos casos, pela Alemanha, o Japão e aliados menores como a Itália, a Espanha, o Canadá e a Austrália, são apresentadas como decisões da «comunidade internacional», entidade inexistente, invocada para dar respeitabilidade a iniciativas do imperialismo.
Cabe perguntar quem será a próxima vítima do imperialismo coletivo?
A ofensiva para derrubar o governo de Bachar Al Assad prossegue. A Síria somente não foi ainda bombardeada e invadida porque a Rússia e a China vetaram desta vez no Conselho de Segurança da ONU aResolução que, se aprovada, seria o prólogo de uma nova agressão. Mas o imperialismo não esconde que o objectivo principal da sua estratégia na Região é o Irã, acusado de «ameaça à Paz» e «inimigo da democracia».
No seu discurso sobre o Estado da União, Obama voltou a afirmar que «todas as opções estão sobre a mesa» se aquele país não se submeter às suas exigências O Pentágono elaborou nos últimos anos sucessivosplanos bélicos de ataque, alguns divulgados pela midia. A intervenção de tropas terrestres é hipótese excluída, mas o bombardeio das instalações nucleares iranianas suscita também muitas dúvidas. Os generais doPentágono admitem que bombas convencionais seriam ineficazes contra os bunkers subterrâneos de Natanz. A retaliação poderia provocar o encerramento do Estreito de Ormuz e os mísseis iranianos poderiamatingir Israel.
O recurso a armas nucleares táticas- já sugerido por Sarkozy e membros republicanos do Congresso - provocaria uma onda de indignação mundial, ampliando o isolamento dos EUA.
A Somália e as tribos pashtun da fronteira noroeste do Paquistão são com frequência bombardeadas por drones, os aviões sem piloto assassinos, comandados de distantes bases estadounidenses.
A recente intervenção norte-americana no Uganda, realizada a pretexto de combater uma minúscula seita religiosa, ficou a assinalar uma nova fase da estratégia dos EUA para o Continente. O presidente Obama apressou-se a declarar que enviará tropas para o Sudão do Sul, Congo e a Republica Centro-Africana se esses países pedirem ajuda aos EUA para «o combate ao terrorismo».
Instalar em África um exército permanente americano de 100.000 homens é a meta do AFRICA COMAND, que está a operar a partir da sofisticada base aérea instalada em Djibuti, na antiga Somália Francesa.
Afastar a China da África foi um dos objectivos da agressão à Líbia. Mais de 30 000 chineses, tecnicos e trabalhadores, foram retirados daquele pais onde a China tinha importantes investimentos.
O comportamento dos EUA traz à memória o da Alemanha de Hitler nos anos 30 do século passado. Primeiro foi a anexação da Áustria, depois Munich e a posterior destruição da Tchecoslovaquia, finalmente aexigência da entrega de Dantzig, a invasão da Polónia, a guerra mundial.
Não pretendo estabelecer analogias, mas o desprezo pelos povos e pelo seu direito à independência é o mesmo. Primeiro foi o Afeganistão, depois o Iraque, em seguida a Líbia, agora o Uganda, amanha será aSíria, talvez o Irão.
A aproximação da Rússia e da China traduz a consciência de que, se isoladas, seriam também, oportunamente, declaradas potenciais «ameaças à segurança dos EUA». Putin, no seu primeiro discurso após a reeleiçao, afirmou que enfrentará com firmeza a politica imperial dos EUA.
CAMARADAS
A escalada de leis reaccionárias nos EUA assinala o fim do regime democrático na grande república do Norte. A chamada Lei da Autorização da Segurança Nacional, promulgada por Obama, revoga na prática aConstituição bicentenária do país. A partir de agora qualquer cidadão suspeito de contatos com o terrorismo pode ser preso por tempo ilimitado e eventualmente submetido à tortura no âmbito de outra lei aprovada pelo Congresso.
Os projetos SOPA E PIPA, em discussão na Câmara dos Representantes, concebidos para controlar o Facebook, mas levantaram tamanha indignação a nível mundial que o Legislativo recuou.
A fascizaçao das Forças Armadas dos EUA nas guerras imperiais é agora inocultável.
Comentando a justificação por Obama das últimas leis, Michel Chossudovsky define os EUA como «Um Estado totalitário com traje civil».
Os EUA estão a assumir o perfil de um IV Reich. No Afeganistão, elementos do corpo de Marines exibiram publicamente a bandeira das SS nazis e não foram punidos.
CAMARADAS
Perante a estratégia imperial que ameaça a humanidade, patrocinada por um dos mais perigosos presidentes que o povo dos EUA elegeu, a pergunta de Lenin, QUE FAZER? adquire uma atualidade dramática.
A recusa da «nova ordem mundial» que o imperialismo pretende impor assumiu nos últimos anos proporções planetárias.
Seattle foi um marco histórico na rejeição do sistema de dominação que utiliza o FMI, o Banco Mundial, a OMC como instrumentos da política do grande capital.
De repente, milhões de homens e mulheres começaram a sair às ruas em gigantescos protestos contra a religião do dinheiro e as guerras de saque imperiais.
O lema do primeiro Foro Social Mundial, «outro mundo é possível», traduziu esse descontentamento e a esperança de uma mudança radical.
Mas, transcorrida mais de uma década, o próprio Foro transformou-se numa caixa de ressonância de discursos inofensivos.
No ano passado, o movimento dos Indignados na Espanha e o Occupy Wall Street nos EUA mobilizaram multidões expressando o desespero das massas oprimidas.
Mas, esses protestos, positivos, e outros, promovidos por movimentos sociais, não abalam os alicerces do poder do capital. Os jovens sobretudo sabem o que rejeitam, mas esbarram com um muro intransponível na formulação de uma alternativa. Que querem afinal?
O espontaneismo é como a maré oceânica, assim como sobe desce.
Mergulhado numa crise estrutural para a qual não tem soluções, o capitalismo está condenado a desaparecer. Mas o seu fim não tem data no calendário e a agonia pode ser muito prolongada. Desencadeia guerras de saque monstruosas e continua a manipular a consciência dos povos, através da midia e de governos de fachada democrática que são na prática ditaduras de classe.
Que fazer então?
Não serei eu, nem outros comunistas como eu, a tirar do bolso do colete a receita magica.
É minha convicção inabalável que Lenin enunciou uma evidência ao lembrar que não há revolução durável sem um partido revolucionário que a promova e lidere as massas.
Para mal da humanidade, a destruição da URSS e a implantação na Rússia do capitalismo permitiu ao imperialismo desencadear uma tempestade contra- revolucionaria que atingiu os partidos comunistas,semeando tremenda confusão ideológica. Alguns partidos com grandes tradições, como o italiano, desapareceram após varias metamorfoses. Outros, como o francês e o espanhol, social- democratizaram-se,assumindo linhas reformistas.
A criação do Partido da Esquerda Europeia contribuiu para aumentar a confusão. Não obstante a maioria dos partidos que a ele aderiram serem nominalmente comunistas, defendem estratégias reformistas. Batem-se dentro do sistema parlamentar, concentrando-se em reivindicações sobre problemas imediatos, sem dúvida importantes, mas secundarizam a luta pelo socialismo como objectivo principal.
Neutralizar a combatividade das massas, orientando as lutas no quadro institucional para o «aperfeiçoamento» do sistema é o objectivo do Partido da Esquerda Europeia.
O Partido Comunista da Grecia-KKE surge hoje no panorama europeu como a grande excepçao à tendência maioritária que privilegia a linha reformista sobre a opção revolucionária.
A sua contribuição-mais de uma dezena de greves gerais no ano passado- para a heróica luta dos trabalhadores gregos contra as politicas impostas pelos governantes dos grandes países da zona Euro - a Alemanha e a França tem sido decisiva.
Julgo útil, camaradas, afirmar neste Seminário que acompanhar os acontecimentos da Grécia, reflectir sobre eles e apoiar o combate dos comunistas gregos passou a ser um dever revolucionário para os comunistasda América Latina.
O KKE defende a criação e o fortalecimento de uma Frente Democrática anti-imperialista e anti-monopolista, uma aliança entre trabalhadores e pequenos e médios agricultores.
Num contexto histórico muito diferente, o projecto do Partido Comunista Brasileiro tem afinidades com o formulado pelo KKE.
Permitam-me, camaradas, que cite um parágrafo
do artigo da camarada Aleka Paparigas, secretária geral do KKE, publicado na Revista Comunista Internacional (Numero 2):
Desenvolvimento desigual quer dizer desenvolvimento político e social desigual, o que significa que as condições prévias para o início da situação revolucionária podem surgir mais cedo num país ou num grupo de países que, sob condições específicas, pode constituir «o elo mais fraco» do sistema imperialista. Isto é particularmente importante hoje em dia em que o desenvolvimento e as remodelações têm lugar no sistema imperialista e se intensificam as contradições tanto nos países como no sistema imperialista, portanto, entendemos que cada partido comunista e os trabalhadores de cada país têm o dever internacionalista de contribuir para a luta de classes ao nível internacional, mobilizando e organizando a luta contra as consequências das crises nacionais, com vista ao derrubamento do poder burguês, àconquista do poder pelos trabalhadores e à construção do socialismo.
Insistindo na denúncia do oportunismo, a camarada Paparigas lembra também que as reformas, por importantes que sejam, não podem conduzir ao socialismo sem uma confrontação final com a burguesia cujo desfecho seria a destruição das instituições do Estado capitalista.
A questão é fundamental. A chamada via pacifica para o socialismo foi ensaiada no Chile com o desfecho que conhecemos. Hoje, a tese é retomada na Europa por alguns partidos comunistas e na América Latina é defendida pelos teóricos do Socialismo do século XXI, nomeadamente na Venezuela bolivariana e na Bolívia.
Em textos que publiquei após participação no VI Foro de Maracaibo, em novembro do ano passado, critiquei essas posições, reafirmando a convicção de que a destruição do Estado capitalista, em choque com o poder burguês, terá de preceder a construção do poder popular. Trata-se, insisto numa questão estratégica fundamental para o movimento comunista internacional.
Este tema merecerá, estou confiante, uma atenção especial dos participantes do nosso Seminário. Na Europa o oportunismo semeia a confusão através do Partido da Esquerda Europeia. Na América Latina, tentapromover a social-democracia no Brasil, na Argentina
e no Uruguai e semeia ilusões na Venezuela, na Bolívia, no Equador e na Nicarágua.
No cerne do grande debate ideológico travado no âmbito do movimento comunista internacional uma questão continua a suscitar debate permanente: a transição do capitalismo para o socialismo. Já Lenin dizia que ela seria infinitamente mais difícil do que a tomada do poder em Outubro de 17. Até hoje não encontramos respostas satisfatórias.
Camaradas:
Há muito que não participava de um Seminário Internacional promovido por um Partido Comunista tão aberto e fascinante como este.
O Partido Comunista Brasileiro traz à memória a lenda da Fénix Renascida. Desempenhou um papel fundamental nas lutas do povo brasileiro durante mais de meio século. Uma direcção em que prevaleceu o oportunismo e o revisionismo conduziu – o nos anos 80 a um processo de auto-destruição.
Militei no PCB quando era um partido revolucionário. E é com alegria e orgulho que acompanho o seu explosivo renascimento num momento histórico em que uma crise devastadora ameaça a própriacontinuidade da humanidade. O PCB volta a situar-se na vanguarda das lutas revolucionárias no Brasil e na América Latina.
Parabéns, queridos camaradas.