Digo isso pois neste final de semana acompanhei de perto o 3º Congresso Estadual do PSOL/SP e os acontecimentos durante a atividade são no mínimo assustadoras do ponto de vista do feminismo e do socialismo, pois por dois momentos distintos companheiros homens ocuparam o palco onde estava instalada a mesa de trabalhos do congresso, não foi a primeira vez que isso aconteceu em espaços partidários, e é deveras preocupante que a prática da truculência, intimidação, provocação e do machismo tenham se tornado recorrentes em diversos espaços da política geral, seja no PSOL, nas entidades estudantis ou movimentos sociais em geral e não será a última, esta constatação muito me preocupa.
À construção de uma política truculenta, intimidadora, provocadora somam-se uma forma de fazer política masculinizada e muitas vezes beiram o confronto físico para fazer valer suas posições. Fazer política deste jeito é fazer política de um jeito machista e isso deve ser questionado pelo conjunto da esquerda socialista, pois não é razoável resolver as polêmicas políticas desta forma, principalmente em um partido socialista. É preciso apontar que este tipo de fazer político é naturalizado até mesmo por nós mulheres e muitas vezes para tratar deste tema acaba-se fazendo um debate genérico, sem apontar os companheiros envolvidos, sob o falso pretexto da despersonalização e de que isto é algo enraizado em nossa sociedade.
Ora, o machismo é sim algo enraizado na nossa sociedade, porém não é um entidade etérea que se manifesta sozinha, sem ações concretas de imposição do poder sobre as mulheres, é importante sim apontar quais companheiros erram continuamente ao se impor em plenário de forma truculenta e machista, por que sim não respeitar o encaminhamento de uma mesa composta apenas por mulheres , como aconteceu no encontro municipal do PSOL/SP, é machismo; começar a gritar com as companheiras que se colocam numa tarefa de encaminhar um plenário batendo na mesa para impor seu encaminhamento é machismo e tumultuar o palco onde está instalada a mesa de trabalhos de um encontro ou de um congresso de forma agressiva é também uma forma machista de fazer política.
Muitos confundem o machismo e esta forma de intolerância e imposição com defesa apaixonada de posicionamentos políticos, assim como muitas vezes a sociedade taxa de crime passional o feminicídio. Não há paixão em nenhuma destas duas coisas, ambas são violências machistas, e reconhecer que em nossas organizações políticas isso existe e precisa ser combatido da forma que for é fundamental.
Infelizmente nos confrontamos muitas vezes com uma espécie de corporativismo entre as organizações políticas onde se escamoteia o debate e o confronto concreto do machismo de nossos companheiros e também companheiras como se fossem questões oportunistas – ajudando assim até mesmo a reafirmar o machismo em nossas organizações – e não como se fossem parte intrínseca da política, pois o confronto ao machismo é também uma questão política e não é menor, instrumentos de sanção a camaradas machistas iguais aos que vi neste final de semana são fundamentais para educar e disputar pedagogicamente como se combate o machismo, ou é tranquilo um camarada que intimida uma companheira continuar a representar publicamente as posições de sua organização política ou participar das reuniões de direção? Na minha concepção não é plausível isso, quando não se coloca uma medida educativa contundente de nada adianta constrangimento, pois é preciso sim impor limites em nosso partido para o que é plausível na disputa política e o que não é. E para mim machismo não é plausível na disputa política.
Ressalto que pedir desculpas de forma privada em casos de machismo público à dirigentes ou militantes partidárias ou de qualquer tipo de organização política, principalmente as socialistas e de esquerda, não resolve. Pois quando se intimida uma mulher se intimida a todas, quando se desrespeita a condução de plenário de uma camarada se desrespeita a todas. E é justamente nestes casos que é preciso se fazer a autocrítica publicamente sim e sem o papinho de que não se é machista e apenas se desculpar pelo método – como acontecido em um outro congresso estadual do PSOL há algumas semanas – é fazer a autocrítica do machismo também, o método pode estar errado, porém a motivação de se impor um método equivocado é machista.
Acredito que o debate sobre o lugar da mulher na política é o debate de fundo de toda esta questão, se realmente as organizações políticas e os camaradas tivessem este debate internalizado formulações densas sobre qual papel cumprimos na política a reflexão sobre a truculência nos espaços políticos talvez fosse mais fácil, é por isso que é preciso haver espaço de auto-organização das mulheres onde possamos tirar políticas e fazer debates entre nós sobre violência machista existente em nossas organizações políticas – bom lembrar que normalmente nos espaços de disputa política de mulheres as polêmicas nunca são resolvidas na truculência –, garantia de formação política feminista para mulheres e homens para combater práticas como as presenciadas neste último final de semana no congresso do PSOL/SP e a política de ações afirmativas para se garantir as mulheres nas direções partidárias de forma paritária são formas efetivas de se combater estas cenas dignas de um quadrinho do Bizarro e seu mundo.
É tarefa das feministas socialistas não deixar a esquerda neste país, seja onde organizem suas intervenções políticas, perpetue estas formas de atuação política. A nossa principal tarefa é pontuar e disputar espaço a cada momento em que o machismo e a hipocrisia de alguns camaradas machistas se apresentam nos nossos espaços de militância, cobrar sim um posicionamento público daqueles militantes que se portam de forma machista nestes espaços e também de suas organizações políticas, pois a violência machista não é um debate menor e cobrança não é oportunismo.