Dos guerrilheiros galegos costuma-se dizer, sobretodo por parte de quem pretende deostá-los, que eram na realidade simples bandoleiros, delinqüentes comuns que roubavam e assaltavam sem horizonte político nengum e apenas para benefício próprio, e que adotavam tal estilo de vida por simples comodidade.
Eu nom acredito em tais afirmaçons, nom acredito nessas versons que falam do Foucelhas como de um "apanha-galinhas" ou do Piloto como de um sanguinário assaltador de casas e caminhos que praticamente matava por prazer.
O Piloto para mim é um símbolo dessa Galiza que nos ocultam; umha Galiza rebelde que se levantava contra as injustiças, que nom se resignava ante as agressons que o poder daqueles anos lhe infringia.
A lenda do Piloto começou na manhá de 10 de março de 1965, nada menos que vinte e seis anos depois de oficialmente ter acabado a guerra civil espanhola. Nesse dia, e graças à delaçom de um vizinho que observara os movimentos do Piloto nas proximidades da barragem de Belesar, a Guarda Civil organizou um dispositivo para dar caça ao temido guerrilheiro.
Cercárom-no quando se encontrava a comer pam com chouriço à beira do regato do Facheiro ou das Andorinhas. Ainda que na crónica oferecida ao dia seguinte no jornal El Progreso se figessem eco do parte da Guarda Civil, no qual se afirma que os agentes do corpo repressivo disparárom sobre ele depois de o "forajido" ter desouvido as cominaçons a entregar-se por parte do chefe do operativo, testemunhas do que aconteceu asseguram que só se escuitou um apelo à rendiçom depois de os fardados descarregarem quatro disparos que fôrom parar à cabeça e ao ventre do Piloto.
José Castro Veiga, militante do PCE, antigo aviador do exército republicano espanhol, guerrilheiro, fora selvagem e covardemente assassinado por efetivos da Guarda Civil, sem opçom a se render, fugir ou defender-se. Punha-se fim à vida de um rebelde por vocaçom, e, sem querer, ajudárom ao nascimento de um mito.
A imagem do capitám de Monforte a dar pontapés no cadáver do Piloto e a berrar "Agora apanhei-te, porco comunista!" é a síntese do que realmente significou a figura de José Castro Veiga, à margem de que evidentemente sempre haverá interessados em incidir na sua condiçom de "bandoleiro", para disipar qualquer traço de luita política na sua atitude.
Sem dúvida, o facto de viver à margem da lei obrigava o Piloto a conseguir dinheiro por métodos que obviamente nom eram legais. Segundo a sua companheira Ramona Curto, O Piloto costumava tirar cartos a gente do sistema, colaboradores com o regime fascista de Franco e, além disso, muitas vezes dava dinheiro a vizinhos necessitados.
O que está claro é que, se estamos a falar de alguém que resistiu no monte desde 1946 -ano no que regressa à Galiza após sofrer prisom em Madrid, precisamente pola sua adesom à República- até 1965, e se esta pessoa ainda é recordada e homenageada espontaneamente por vizinhos e vizinhas do lugar onde está enterrado (Sam Fiz) isto será porque nom todo o mundo via a José Castro Veiga como um malfeitor.
Um comunista é, sem dúvida, alguém que ama intensamente a humanidade, e a rebeldia de José Castro Veiga é um exemplo de amor polo povo e pola terra, um exemplo inequívoco de insubmissom convencida e conseqüente ao Estado franquista.
Nom quijo abandonar a resistência armada quando o partido deu a guerra por perdida e ordenou aos seus militantes deporem as armas. Também rejeitou a possibilidade de fugir à França, como figérom muitos camaradas dele. Continuou a sua resistência em solitário ainda que conservando parte da rede de apoios e simpatias que tivo a guerrilha enquanto ela existiu, porque quem o conhecia sabia que O Piloto nom era um malandro qualquer, mas um amigo dos fracos, dos deserdados, dos filhos do trabalho.
Mas era evidente que à partir da derrota militar oficialmente reconhecida pola direçom do PCE, a resistência do Piloto inevitavelmente se converteria na peripécia de um indivíduo no fio da cortante navalha da Espanha franquista, desafiando em solitário os esbirros do regime e a sua rede de delatores. Talvez o Piloto tivesse assumido que o seu final seria trágico e violento, e preferiu aguardar essa morte desafiando-a cada dia, batendo com contundência no inimigo. Provavelmente pensou que seria mais digno morrer assim do que entregar-se e expor-se à vil tortura, à prisom infame e à execuçom praticamente segura.
Na manhá de 10 de março de 65, no regato das Andorinhas, dous amedrontados membros da Guarda Civil dérom-lhe chumbo, sem prévio aviso, ao corpo do Piloto... a José Castro Veiga tirarom-lhe a vida, ao povo galego dérom-lhe um ícone, um referente, um herói.
Asseguram aqueles que vírom o lance, que os uniformados disparárom antes de exigir-lhe a rendiçom ao Piloto, porque se se chegam a dirigir a ele antes de disparar, o guerrilheiro apanharia a sua metralhadora e os guardas nom teriam oportunidade nengumha.
Houvo que empregar más artes para por fim poder ganhar umha batalha a aquele homem tam conhecedor daqueles caminhos e montes, e tam excelente atirador que mesmo a Guarda Civil lhe tinha verdadeiro pánico.
Se o Piloto fosse norte-americano, a sua vida seria levada ao celuloide, sem dúvida nengumha. Mesmo se fosse andaluz ou castelhano, seguramente a sua trajetória seria tema para livros, filmes ou documentários em grande quantidade. Mas isto aconteceu na Galiza e, inclusive para muita gente pretensamente progressista, na Galiza nom houvo resistência armada, Galiza foi franquista desde o mesmíssimo dia do "Alzamiento".
Precisamente O Piloto, derradeiro fogido abatido polo aparelho repressivo franquista, é a negaçom desse dogma que sustentam rigidamente os espanholistas mais furibundos, tanto os de direita como os de esquerda.
Ao Piloto já nom o vam derrotar nunca... matárom-no numha emboscada, mas ele e a sua metralhadora justiceira, terror dos exploradores, dos delatores, dos reacionários seguem a percorrer os montes e os caminhos na memória da Galiza mais rebelde, essa que recorda os seus filhos mais dignos.
Saúde, Camarada José Castro Veiga.