Pedir prisão de Kadafi? Nada contra. Mas por que só para ele? E o ministro do interior do Egito, já denunciado em seu próprio país pelos mesmos fatos criminosos contra a população civil? E os ditadores da Arábia Saudita, do Iêmen e do Barein, que estabeleceram uma sinistra sinergia na forma de reprimir, até com assassinatos, manifestações de protesto? E os "apóstolos" da legalidade da tortura em Guantánamo? Sem problemas. Os alvos são Kadafi, agora, e Assad, da Síria, tão logo haja uma oportunidade.
Bizarro, os Estados Unidos sequer reconhecem o Tribunal de Haia. Mas seus membros não tomam nenhuma medida que não seja do estrito interesse do Departamento de Estado. E que são tomadas por seus esbirros europeus, em permanente cumplicidade sabuja.
Naomi Klein em sua reflexão sobre a "Doutrina do Choque” é quem explica de forma notável a cretinice diplomática e judicial, que o grande capital globalizado impõe como verdade.
Com o objetivo claro de substituir ordens econômicas que ferem os interesses de suas grandes corporações, pelo modelo único criado a partir da hegemonia das teorias de Frederick Hayek e Milton Friedman na aplicação do capitalismo sem peias, os predadores têm armas livres para impor, um "recomeço". E que recomeço é esse? É o da privatização do que era público; o das restrições drásticas nos investimentos sociais e o arrocho sobre direitos do mundo do trabalho sobre o do capital. É a radicalização da ideia de que, para impor absoluta libertinagem na garantia dos privilégios do capital, qualquer trauma violento -- social ou natural -- é um instrumento a utilizar, e não a lamentar. Prova concreta de que a chamada democracia liberal é uma consumada cretinice, por absoluta incompatibilidade entre democracia e liberalismo econômico no mundo em que vivemos.
Voltando ao primeiro parágrafo; a seleção de alvos desse famigerado Tribunal, que mais se parece com cortes punitivas de regimes autoritários do que com o Tribunal de Nuremberg, é uma boa ilustração do que preconiza a teoria formulada por Naomi Klein.