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Ramiro Vidal

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A república do verbo

A repressom sobre a esquerda basca (...e as suas inevitáveis reminiscências)

Ramiro Vidal - Publicado: Sábado, 23 Abril 2011 17:51

Ramiro Vidal Alvarinho

Quando na Idade Meia o judaísmo era perseguido em toda a Europa, a Inquisiçom agia como aparelho de repressom implacável vigiando, seqüestrando e torturando sem piedade todos aqueles individuos suspeitos de nom terem abjurado de maneira sincera da maligna fé dos filhos de Adonai.


Nom apenas um podia ser objecto de repressom, repúdio público e discriminaçom por ser judeu ou nom deixar de o ser de maneirasuficientemente manifesta... um podia ser achado "culpado" de nom ser limpo de sangue, e entom havia também que estar preparado para as conseqüências.

Ao longo da história, o anti-semitismo foi um fenómeno recorrente, avivado de maneira oportunista umhas vezes polas diferentes confissons cristás, outras polas oligarquias europeias... bem conhecida é a paranoia ánti-judia alimentada polo nazismo.

Nom é o "povo judeu" a única comunidade humana que sofreu perseguiçons ao longo da história, ainda que também nom se poda negar o dramatismo e crueldade desses episódios de perseguiçom. No nosso tempo, a perseguiçom religiosa e ideológica está à ordem do dia, também a perseguiçom por motivos étnico-raciais ou lingüísticos, mesmo sexuais. Temos abundantes exemplos em todo o planeta.

Para mim seria fácil referir-me às execuçons de homossexuais no Irám, ou à perseguiçom a que som submetidas as pessoas que praticam o hinduímo ou o cristianismo no Paquistám; poderia falar da prohibiçom de línguas e religions na China, da perseguiçom dos ciganos na Kosova, ou dos campos de concentraçom na ex-Jugoslávia. Seria fácil, porque disso se fala e muito na imprensa do sistema. Som as misérias dos maus, e interessa explorá-las.

Mas na Espanha bourbónica, também há perseguiçom ideológica. Por enquanto nom há campos de extermínio com toda a parafernália de fornos crematórios, cámaras de gás e trabalhos forçados... ainda que sim haja vontade de encher os cárceres de elementos "terroristas". Por algumha cousa se começa sempre.

A Constituiçom espanhola di que ninguém pode ser obrigado a declarar sobre a sua ideologia política ou as suas crenças religiosas. Isto nom é certo. Se fores independentista basco, sim. E nem isso é necessário. Quando existe umha Lei de Partidos que reserva aos tribunais a prerrogativa de ilegalizar umha organizaçom política se esta nom condenar a violência, evidentemente está-se a entrar em contradiçom manifesta com esse artigo da constituiçom bourbónica que proclama que ninguém poderá ser obrigado a declarar sobre a sua maneira de pensar.

Porque quando se fala de violência, nom se fala de qualquer violência, neste caso. Fala-se da violência que o "inimigo público número um" exerce sobre os interesses da oligarquia espanhola e basca e sobre as estruturas do Estado espanhol, naturalmente nom da violência que os corpos repressivos desse Estado exercem sobre o povo basco, nom sobre a violência que exercem as leis do Estado burguês contra a classe trabalhadora, nom da violência que sofremos todos os trabalhadores e trabalhadoras do mundo a maos do patronato e a banca, que especulam com a nossa força de trabalho e com as nossas necessidades mais básicas...

Se houvesse que condenar a violência assim, de maneira categórica, os mesmos que tanto exigem da esquerda abertzale que tal faga teriam que ser os primeiros a darem o passo. Porque estamos a falar de partidos políticos que apoiam (e praticam) o terrorismo de Estado, que defendem que o Estado espanhol participe em guerras genocidas, que apoiam governos golpistas e ditatoriais noutras latitudes... mas a violência que há que condenar, é umha violência em concreto... aquela que se dirige às estruturas do Estado e aos seus poderes fácticos em resposta da violência que estes exercem contra o povo basco e contra outros povos.

Outras violências, nom fai falta condená-las expressamente. O Partido Popular nunca condenou o levantamento militar de 36, nem os crimes do franquismo. Grupos neo-nazis, neo-fascistas e mesmo abertamente franquistas, operam sem problema nengum no território do Estado espanhol, fam propaganda das suas ideias, manifestam-se, tenhem voz nos mass-media e tenhem umha vida legal que ninguém ameaça. Nom apenas nom condenam a violência, como a exercem e nom se importam com matar. Acodem armados e uniformados aos seus atos e, nalgum caso, a sua estrutura interna imita à de umha organizaçom militar. De facto, amparam-se na garantia de nom poderem ser obrigados a declarar sobre as suas ideias, para realizarem atividades que noutros lugares do mundo nom se lhes permitiriam; por exemplo, a publicaçom de literatura "revisionista", isto é, literatura que nega a veracidade do Holocausto.

Há um par de semanas, eu tivem umha discusom em plena rua em Madrid, a raíz de umha conversa informal com umha compatriota que trabalha para uma rotativa espanhola. Falávamos da manifestaçom que o mesmo dia da minha chegada a Madrid (para apresentar um livro de poesia, nada a ver em princípio com o tema) protagonizara a Asociación de Víctimas del Terrorismo, contra a legalizaçom de Bildu, umha coligaçom de várias forças políticas bascas que pretendem apresentar-se às eleiçons autárquicas sob esse guarda-chuva. Num momento dado, eu dixem que, evidentemente, a AVT estava a exercer como o que é, um instrumento de pressom política, e que o que pretendem é forçar um golpe institucional no Estado espanhol. A minha compatriota negava a possibilidade de que qualquer tentativa de golpe triunfasse. Eu falava-lhe das conseqüências do 11-M, e aí é que surgírom as discrepáncias mais profundas. Porque ela abalizava o mito do povo espanhol que se revelara contra a tentativa do governo Aznar de mentir à populaçom sobre a autoria do crime da estaçom de Atocha. E eu afirmava que, independentemente das manifestaçons horas antes das eleiçons gerais de há oito anos, e independentemente do resultado daquelas eleiçons, o golpe já estava dado e já triunfara.

Apenas umhas horas antes de que se produzissem as concentraçons diante das sedes do PP, o daquelas ministro do interior, Miguel Ángel Acebes figera umha comparecência pública em termos verdadeiramente golpistas. O enunciado era, dito de maneira esquemática: ponto primeiro, o atentado de Atocha é autoria da ETA; ponto segundo, todos devem condenar o atentado; ponto terceiro, todos devem admitir que o autor do atentado é a ETA, sob pena de serem ilegalizados. Naquele momento, todas as forças políticas com presença institucional no Estado espanhol, incluídas BNG e ERC, aceitárom as instruçons dadas polo Acebes, o que do meu ponto de vista as converte em tam golpistas como os que ideárom o golpe.

A partir daí pouco importa que o PP perdesse as eleiçons gerais e que se demonstrasse que fora um grupo islamista que colocara aquelas bombas em Madrid. Foi naquele episódio que se sentou o precedente para a culpabilidade preventiva por sistema do grande demo separatista basco e da negaçom da sua credibilidade já nom como interlocutor, mas inclusso como transmissor dos seus próprios posicionamentos, avaliaçons ou manifestaçons, o que já é o cúmulo da paranoia. Nom importa que Arnaldo Otegi diga numha conferência de imprensa que nom foi a ETA, já se reservam os manipuladores da opiniom pública a potestade para interpretar essas palavras se toca interpretá-las, prevalecendo por cima o dogma de que foi a ETA; nom importa que Iñaki de Juana Chaos diga que nom é da ETA, nem sequer importa que a própria ETA manifeste que de Juana já nom pertence a tal organizaçom. Como membro da ETA será tratado, porque assim convém à justificaçom de todo o processo repressivo do que foi objeto.

Assim é que Sortu nom vai poder concorrer às eleiçons autárquicas. Nom passárom o exame. Nom seguírom o guiom pré-estabelecido de condenar a violência nos termos que se lhes marcou. Talmente como nos processos inquisitoriais, nos quais se colocava no instrumento de tortura o processado para que dixesse exatamente aquilo que se lhe ordenara que dixesse. Nom chega rejeitar, nom chega criticar... há que condenar. Há que condenar umha violência determinada. Nom a violência em geral ou em abstracto... umha violência.

Ignoramos como Bildu vai apresentar a sua "nom relaçom" com a ETA e com Batasuna, ainda que já alguém tenha marcado a pauta hoje mesmo. "Batasuna polui todo o que tocar, se EA estabeleceu acordos com Batasuna, Batasuna poluiu EA". Umha formulaçom inequivocamente na linha daquela Santa Inquisiçom de terrível lembrança.


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