As críticas feitas pela Rede Feminista de Saúde sobre o programa lançado pela presidente Dilma no último dia 28 de março são bastante contundentes, resgatam uma premissa fundamental da luta feminista: a integralidade ao atendimento de saúde da mulher. O debate sobre a saúde da mulher, direitos reprodutivos e sexuais vem sendo escamoteado há bastante tempo e normalmente a discussão não é feita na sociedade e nossos direitos acabam sendo trocados por votos, conchavos políticos e afins. Nada muito diferente do que é feito com os direitos da classe trabalhadora, mas quem liga?
Existe sim uma necessidade de humanizar o parto no Brasil, para isso existe o Plano Nacional de Humanização do Parto (PNHP) e também há décadas existe o Plano de Atendimento Integral à Saúde da Mulher (PAISM) que serviu para desenvolver o Programa Nacional de Atendimento Integral à Saúde da Mulher (PNAISM) logo no começo do governo Lula. Tais planos pensam a saúde da mulher de forma completa e precisam ser colocados em prática urgentemente, porém ao invés de fazê-lo e comprar uma briga com os setores dogmáticos religiosos - com quem o governo Dilma se comprometeu para assegurar sua vitória nas eleições de 2010 -, é preferível lançar um programa que retira o empoderamento da mulher e ajuda a criminalizar mulheres.
Há duas semanas a presidente Dilma Rousseff lançou o programa do Ministério da Saúde: a Rede Cegonha, programa este que conta com um orçamento de R$ 9,4 bilhões e pretende garantir assistência humanizada à mulher desde o momento que confirmar a gravidez até o puerpério, por cima até parece uma proposta promissora, isso se não abrisse uma via expressa para a aprovação no congresso nacional para o cadastro de gravidez e também não escanteasse pelo menos 30 anos de debates e acúmulos sobre a assistência integral a saúde da mulher.
Na verdade nos deparamos com o desenrolar da capitulação que Dilma e o PT deram nas eleições de 2010 com a Carta ao Povo de Deus e o compromisso do governo não enviar ao congresso nenhum projeto de lei versando sobre questões polêmicas - por polêmico entendamos os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e os direitos civis da comunidade LGBT -, pois em nenhum momento a atual presidenta se comprometeu a não escantear a política de atendimento integral à saúde da mulher, em implementar por completo o PNAISM ou não substituí-lo por um programa baseado no marketing que municia mais um pouco aqueles que brigam pela criminalização das mulheres.
A Rede Cegonha não é resposta completa aos diagnósticos sobre saúde da mulher, acaba por colocar uma venda sobre a questão do aborto no país. Em entrevista ao Vi o Mundo Télia Negrão da Rede Feminista de Saúde bem lembra que apenas no SUS são realizados mais de 100 mil abortos por ano, não contando com aqueles realizados em clínicas clandestinas que podem chegar a quase um milhão/ano. O programa do governo federal ignora essa situação, prefere não colocar o dedo na ferida e não correr o risco de perder apoio no congresso nacional do que encarar de frente a sofrida realidade das mulheres que abortam no Brasil.
No final das contas a mulher vai confirmar sua gravidez no SUS e ser diretamente encaminhada ao pré-natal pela Rede Cegonha, acontece o que com ela se 40 semanas depois for verificado que esta mulher não pariu? Como disse para além da desumanização do evento do parto com a simbologia da cegonha o programa é um abre-alas para mais criminalização das mulheres.