A sina dos afrodescendentes nasceria do primeiro ato de "homossexualismo da história", praticado por um filho de Noé. Para o deputado federal, pastor e empresário, tais sandices não seriam racismo ou homofobia, mas teologia pura. Suas afirmações desvairadas apóiam as congêneres do deputado Jair Bolsonaro.
Na Antiguidade, a escravidão justificou-se inicialmente pela lei do mais forte. Mais tarde, Aristóteles proporia a inferioridade do "escravo" e servidão natural. Na retomada da instituição terrível, quando da luta pela Ibéria, cristãos e muçulmanos escravizaram-se uns aos outros, por negarem a verdadeira fé!
Uma explicação que não funcionou, quando os portugueses passaram a levar para Portugal, em 1444, os primeiros cativos negro-africanos. Eles não eram infiéis, pois desconheciam a doutrina reta! No luta portuguesa para racionalizar a escravidão negra, justificativas foram abandonadas por pouco funcionais, como a maldição dos negro-africanos, por descenderem de Cam. Uma história velha como o Dilúvio!
Conta a legenda bíblica que, após pousar a arca em terra seca, Noé e seus três filhos, Sam, Cam e Jafet, ocuparam o mundo purificado. Frutificando a terra, o patriarca cultivou as vinhas e descobriu o vinho. Ao beber o inebriante líquido, despindo-se "completamente dentro de sua tenda", no primeiro pileque da história!.
Nesse ponto, divergem as versões bíblicas. As mais amenas, dizem que Cam viu o progenitor nu e contou aos irmãos. As mais infamantes, que fez muito mais com o progenitor desprotegido! Ao recuperar-se da esbórnia, Noé amaldiçoou a Canaã, filho de Cam, já que os descendentes eram responsável pelos pecados dos ascendentes, na visão da época. Eles e seus descendentes seriam "escravos" dos tios e de seus descendentes.
Em meados do século 15, na Crónica de Guiné, Eanes de Zurara registrou as primeiras capturas de negro-africanos nas costas da África e as tentativas moral-religiosas de justificá-las. O que não foi fácil, os africanos nada haviam feito aos europeus, não justificando sequer uma "guerra justa".
O cronista fala da predestinação bíblica ao cativeiro. Os "negros" seriam já escravos dos "mouros", "por causa da maldição que depois do dilúvio lançou Noé sobre seu filho Cam, pela qual o maldisse, que sua geração fosse sujeita [escrava] a todas outras do mundo".
Sem muito convencimento, lembrava partilharem aquela visão diversos autores "que falaram das gerações de Noé depois do saimento da arca". Estaria justificado o tratamento como cães, dos descendentes de Cam.
A explicação bíblica foi abandonada pelos primeiros ideólogos portugueses e europeus, por não haver no livro sagrado ligação entre os filhos de Cam e os negro-africanos!
A ciência registra que as formas primordiais da espécie humana são velhas de 4 milhões ou mais de anos – não tendo a história da humanidade os 6 mil e pico anos sugeridos pela Bíblia. Propõe a origem unitária do gênero humano, com o berço no Continente Negro. Para horror dos racistas orgulhosos e envergonhados, somos todos irmãos e ... africanos!