A segunda luta é a nova coluna deste portal e tem esse nome retirado do trabalho de conclusão de curso da jornalista Gabriela Moncau, formada recentemente pela PUC/SP. Este trabalho a qual me refiro trata justamente da secundarização da luta das mulheres pela esquerda socialista e isso não é exclusividade da luta das mulheres, mas acontece também com a luta antirracista e LGBT. Como a relação entre feminismo e socialismo será um dos temas permanentes por aqui, achei o nome apropriado e a homenagem necessária.
Como assim o feminismo é uma luta secundarizada?
Ora, o maior exemplo disso são as campanhas eleitorais, em especial esta última. Ano passado, tivemos nas principais candidaturas duas mulheres disputando a presidência da república e que, em relação a temas importantes para o feminismo, acabaram tucanando o debate - tanto que a atual presidenta Dilma Rousseff foi eleita capitulando a direita reacionária em temas como a legalização do aborto, casamento civil igualitário, limite da propriedade de terra e tantos outros importantes para os movimentos sociais organizados e que têm influências direta no papel da mulher na sociedade. Ou seja, são temas que possibilitariam o empoderamento real das mulheres, dando autonomia a de verdade nós.
Por não ser encarado como parte fundamental dos programas políticos, o feminismo é, sim, usado como moeda de troca, não apenas em eleições para o executivo e o legislativo, mas também no movimento sindical, estudantil, popular e nos partidos políticos. Isso acaba corroborando com uma concepção de que o feminismo é um anexo programático, um tema menor na disputa da sociedade que queremos construir; esta lógica anexista da pauta das mulheres precisa ser rompida para que realmente consigamos fazer avançar a luta feminista em conjunto com a luta da classe trabalhadora.
Sinceramente, essa secundarização do feminismo e também do antirracismo não faz muito sentido para mim, visto que as mulheres negras ainda são as mais pobres entre os mais pobres e, historicamente, são setores que protagonizaram processos anticapitalistas fundamentais - exemplo importante é a própria Revolução Russa, que teve seu processo inaugurado em fevereiro por conta da organização da greve das mulheres têxteis no interior da Rússia. Durante anos a luta das mulheres esteve intrinsecamente ligada à da classe trabalhadora; Flora Tristan já dizia, em meados do século XIX, que estas lutas andavam em conjunto, um reflexo da traição sofrida por nós na Revolução Francesa, quando a burguesia literalmente nos guilhotinou ao colocarmos que liberdade, igualdade e fraternidade eram para homens e mulheres.
Construir esta lógica de que a pauta feminista deve estar ligada diretamente à pauta socialista não é fácil. O patriarcado está arraigado na sociedade assim como nos socialistas, pois estes não vivem em uma bolha fora do mundo. Mas o resgate da não-secundarização da luta feminista nas disputas da sociedade que queremos construir, até para não se cair no embuste de que ter apenas uma figura feminina no poder é suficiente para se avançar na discussão sobre feminismo junto a sociedade. Ou é progressivo a presidenta, para comemorar o Dia Internacional de Luta das Mulheres, ir ao programa da Ana Maria Braga cozinhar e depois ir ao programa da Hebe Camargo?
É, ainda há muito pelo que lutar!