Entretanto, em um sentido amplo, foram os ideólogos da Argentina mitrista e do Império que criaram o "Lopizmo", já no início da guerra, ao responsabilizarem o presidente do Paraguai como o grande e único responsável pelo conflito, posição compartida, 135 anos mais tarde, pelo historiador citado.
A apresentação de Francisco Solano López [1827-1870] como o exclusivo e terrível demiurgo daqueles sucessos permitia definir a guerra como operação contra o 'ditador' diabólico e pela 'libertação' do povo paraguaio, proposta já afixada no tratado de constituição da Tríplice Aliança, em 1865 – "No siendo la guerra contra el pueblo paraguayo sino contra su gobierno [...]". Essa retórica justificativa, que escamoteava os objetivos profundos da Argentina mitrista e do Império, foi retomada acriticamente pela historiografia nacional-patriótica brasileira e argentina.
A 'diabolização' de Solano López foi também funcional aos primeiros governos paraguaios constituídos após a ocupação. Ela retomava a retórica 'antiditatorial' das forças liberais e oligárquicas paraguaias, em geral refugiadas em Buenos Aires, derrotadas quando do estabelecimento do Estado francista [1813-1840] e incapazes de recuperarem plenamente o poder aos governos de Carlos Antonio López [1844-1862] e Francisco Solano López [1862-1870]. A responsabilização obsessiva do Mariscal permitia igualmente que elidissem as razões profundas de terem combatido ao lado da Tríplice Aliança, ou seja, a luta pela instauração plena de ordem liberal-mercantil no país.
Apesar dessa origem longínqua, a historiografia denominou estritamente como Lopizmo o movimento historiográfico revisionista sobretudo – mas não apenas – paraguaio, que realizou inversão radical da leitura do papel de Francisco Solano López. De responsável pelo desastre, ele foi elevado à situação de "personificación milagrera de la energia" paraguaia, nas palavras de Manuel Domínguez, verdadeiro construtor magnífico da resistência contra a invasão e destruição do país. Glorificação que, nos fatos, procedia simples inversão epistemológica de sinal da passada diabolização. O que não permite, porém, identificar, em forma simplista, as raízes e os sentidos dos dois movimentos, por além de suas identidades formais ou não.
Em ambos os casos, tratava-se – e se trata – de personificação romântica e ingênua da história, ao explicar os processos e sentidos profundos dos fatos a partir da ação providencial dos grandes protagonistas, positivos ou negativos. Uma leitura do passado que vê, por exemplo, as vitórias dos exércitos franceses a partir da genialidade de Napoleão, e não como determinação fundamental da constituição de exército nacional-cidadão pela Revolução de 1789. Ou apresenta a bestialidades do nazismo como produto da personalidade patológica de Hitler, e não como desdobramento da sanha contra-revolucionária da burguesia alemã, ameaçada pela revolução.
Apesar de suas origens e conteúdos comumente diversos, o Lopizmo positivo e o Lopizmo negativo afastam e impedem a discussão das razões e das forças sociais profundas que embalaram e determinaram aquele doloroso conflito. Paradoxalmente, impedem, até mesmo, uma apreciação objetiva do papel e influência de Francisco Solano López naquele confronto.
A talvez grande explicação para o surgimento do Lopizmo positivo seja a impossibilidade política e ideológica dos seus promotores de explicarem os conteúdos sociais, econômicos, políticos e nacionais profundos da resistência das classes populares paraguaias, mobilizadas, para o bem e para o mal, em torno de Francisco Solano López, que manteve a resistência até sua exaustão. Classes plebéias que empreenderam uma defesa desesperada da organização do país que certamente intuíam que seria destruída, como realmente o foi, através da privatização e venda das terras públicas e do literal aniquilamento físico e social da vasta classe camponesa livre, processo que permitiu a conformação do Paraguai moderno.