Analistas políticos e econômicos conhecidos por sua identidade ideológica com o campo conservador; todos engajadíssimos na campanha de Serra; todos rigorosíssimos nos julgamentos dos movimentos mais corajosos da política externa de Lula, vão virando, sem o menor pudor, defensores ferrenhos da presidenta Dilma Rousseff.
Ah, dizem os mais céticos. Trata-se apenas de uma operação inteligente, tentando promover uma separação entre Lula e Dilma. Raciocínio válido se, na outra ponta da mídia mais ligada aos interesses do grande capital, o mesmo comportamento não viesse a ser notado no Departamento de Estado americano, e na mídia conservadora europeia.
Mais ainda; razões existem para tal atitude. É aí que entra o episódio do salário mínimo. Centrais sindicais que apoiaram Dilma, Dieese, entidades ligadas ao mundo do trabalho, todos consideram haver margem para a concessão de algo superior a R$ 545,00.
O que se constata, então, é que no contraponto da rigidez na questão salarial, uma leniência polêmica se manifestou em favor dos que sempre se locupletam numa política de arrocho: os banqueiros. Eles batem palmas para os primeiros movimentos do Banco Central, ao promover aumento da taxas de juros como instrumento para o combate a uma ameaça de alta de inflação, cujas principiais causas podem estar fora do Brasil – o aumento dos preços da commodities, matérias primas que os países do primeiro mundo compram, para devolver com o valor agregado da industrialização. Argumentos contra essa medida de austeridade são despejados às pencas, por economistas sérios, que não são ligados às consultorias dos grandes bancos, e que sobrepõem o interesse nacional aos lucros do sistema financeiro privado.
Mas não ficamos aí. No campo administrativo, os primeiros passos também dão razão à alegria conservadora. Quando um general que lhe é diretamente subordinado no Gabinete Presidencial emite conceitos inaceitáveis sobre o período ditatorial, Dilma Rousseff se limita a uma chamada verbal, particular. Quando um candidato ao Ministério do Turismo é flagrado com a utilização de verba pública para promover uma "festinha" num motel, ele deixa de ser candidato e passa a ser Ministro, para não incomodar o clã Sarney.
No entanto, quando Pedro Abramovay, responsável pelo combate ao tráfico no Ministério da Justiça dá uma excelente entrevista, abrindo debate sobre a necessidade de estabelecer uma hierarquia que não tratasse pequenos e grandes traficantes da mesma forma – ação essencial no combate à criminalizarão da pobreza – não houve hesitação. A demissão foi imediata, para gáudio da direita reacionária.
Registre-se não haver, por parte dessa observação, nenhum intento de condenar um octogenário por promover baladas. Pelo contrário, todo o apoio, desde que o faça com seus próprios recursos.
Há ainda outro item de alegria para os conservadores: a guinada brutal no comportamento do nosso Ministério de Relações Exteriores em relação às ousadias progressistas do governo Lula. Um recuo total, recebido com festa pelo Departamento de Estado, substituindo o que antes era protagonismo por uma omissão consciente diante dos grandes temas, antes sempre contando com o Itamaraty, hoje provocando um silêncio ensurdecedor, como no exemplo recente do Egito, onde nos salvamos pela iniciativa individual do nosso Embaixador no Cairo, a despeito das pífias declarações oficiais, sem eixo e sem cor, típica de colonizados.
Diante desse quadro inicial, a pergunta se coloca: a se manter a situação atual, como reagirá o Partido dos Trabalhadores? Como reagirá Lula? Retomarão o eixo programático ou acatarão tranquilamente esse passo adiante no pragmatismo despolitizador?