A definição final de "terrorista" resulta não de fatores objetivos, não de uma análise profunda ou de uma teoria bem acabada, mas no grau de interesse que um Estado, por exemplo, tem de um determinado assunto, em um determinado local e se estes "terroristas" porventura dificultam a consecução dos objetivos deste ator estatal ou destes grupos poderosos.
Não há como, valendo-se das teorias ou definições mais aceitas, caracterizar qualquer grupo como terrorista, senão aceitando que há largo espaço para interpretação e para a inclusão de convicções políticas. As mesmas definições poderiam ser usadas contra os mesmos Estados que delas se apropriam para caracterizar grupos contrários aos seus interesses.
Quando falamos em interpretação, obviamente temos em mente que todos que fazem parte do círculo próximo ou compartilham de ideologia semelhante a um determinado grupo provavelmente discordariam da definição de "terrorista" dada, geralmente, por um Estado interessado, mas é fácil notar que o termo por vezes é empregado levianamente ou mesmo dificilmente serviria para caracterizar lutas de libertação nacional1.
É possível ainda argumentar, também, que as teorias mais aceitas sobre o terrorismo não abarcam todas as diferenças culturais existentes, além de não diferenciar o tipo de luta travada por um determinado grupo. Qual o tratamento dado aos civis, ou mesmo quem seria civil em uma determinada situação? Numa ocupação militar, como definir quem são os civis?2
É fácil encontrar os que considerem legítimo o uso de táticas ditas terroristas por parte do Hamas ou do Hezbollah (que, por vezes, se valem das mesmas táticas israelenses, mas por não serem representantes de um Estado perdem a "razão" ou a "legitimidade"), mas ao menos no mundo ocidental é de difícil racionalização as ações da Al Qaeda.
Enquanto os grupos palestinos têm como objetivo o de retomar o que lhes foram roubados, possuem um raio de ação específico e delimitado, a Al Qaeda busca um objetivo de dominação/destruição global e a imposição de seus ataques e objetivos até áreas sem qualquer relação aparente entre qualquer fator legitimante.
No fim de toda discussão, fica sempre a ideia de que o "terrorismo" se define ultimamente pela legitimidade frente a atores internacionais e a opinião pública. Mas como lidar com opiniões e interesses mutáveis?
O "status" de terrorista possui início, meio e fim, e comumente um grupo abandona o caráter terrorista que lhe foi imposto por outros Estados quando este assume o poder e passa a ser um ator de mesma grandeza. O caso da FLN argelina é emblemática.
Outros grupos são considerados terroristas apenas por alguns países ou mesmo apenas pela opinião pública e mídia, e em alguns casos são patrocinados por Estados interessados, como é o caso do Irgun ou da Gangue Stern3, grupos Sionistas terroristas atuantes na Palestina pré-1948 e logo no início da fundação do Estado de Israel que, logo depois, foram incorporados às forças armadas locais.
Durante os anos 60 e 70, época de fortes movimentos de descolonização na África, os grupos que guerreavam pela independência de seus países eram constantemente tachados de terroristas pelos Estados colonialistas e seus aliados, mas por outro lado eram apoiados oficial ou subterfugiosamente por Estados que já haviam abandonado o status de colônia.
É fato que o uso do termo terrorismo não só passa por fortes interesses políticos, como por vezes é aplicado mesmo a grupos que dificilmente se encaixariam até nas definições mais conservadoras. Não raro a opinião pública brasileira coloca o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) no hall dos grupos terroristas, pois atentam contra os interesses das elites locais, ainda que sejam constantemente vítimas de massacre e raramente respondam com alguma violência.
Portanto, concepções de terrorismo afetam a maneira pela qual os governos definem seus interesses, e os interesses também comandam a ratificação dos rótulos ou seu abandono, conforme a conveniência política. (Whittaker, 2005)
O termo terrorismo não é apenas político como politizado, usado por grupos ou Estados interessados em definir outros desta forma com o objetivo de conseguir ganhos políticos claros e definidos. Como tal, é insuficiente e incorreto. Não passa de um apelo simbólico.
Parte de artigo apresentado no VI Seminário de Ciência Política e Relações
Internacionais da UFPE, em 19 de novembro de 2010
Notas
1. Neste caso o terrorismo poderia ser interpretado como meio legítimo para a consecução do objetivo de libertar a colônia oprimida, mas não o todo a definir o grupo.
2. Israel é exemplo acabado da situação, como se definem civis em uma ocupação militar onde cada indivíduo contribui para o recrudescimento do isolamento da população palestina? Ou ainda, se por um lado é legítimo o ataque a um quartel (alvo militar), familiares que porventura estejam no quartel no momento do ataque devem ser tratados como civis?
3. Depois integrados à Hagana, o exército de Israel