Tratou o Brasil, os brasileiros, o governo, como se fossem lacaios de um governante irresponsável – Berlusconi.
A expressão “terrorista” usada pela mídia privada brasileira para rotular Battisti perdeu o sentido depois do WikiLeaks e do terrorismo (sem aspas) praticado por norte-americanos e seus aliados (colônias) em todo o mundo.
Não cabe julgar politicamente a participação de Battisti no processo de resistência em determinada época a governos italianos. François Mitterrand, socialista e presidente da França por 14 anos não hesitou um só instante em conceder asilo a Battisti.
O que está no centro do palco é outro tipo de jogo. Um jogo sórdido do primeiro-ministro Berlusconi, contestado por manifestações em toda a Itália e que queria exibir a cabeça de Battisti como troféu para tentar um novo mandato.
E, ademais, é da tradição brasileira abrigar, refugiar, asilar perseguidos políticos. Foi assim com George Bidault, líder fascista francês. Com Marcelo Caetano herdeiro do salazarismo depois da Revolução dos Cravos em Portugal. Não poderia ser diferente com Battisti.
A decisão final, segundo a Constituição, é do presidente da República. Todas as medidas protelatórias foram tentadas por Gilmar Mendes. À época presidente do STF e notoriamente ligado a grupos de extrema-direita e empresários envolvidos em corrupção (Daniel Dantas).
Sequer se preocupa em disfarçar, mesmo porque lhe falta o tal “notável saber jurídico”. Tanto quanto a “reputação ilibada” para integrar a mais alta corte de justiça do País. É invenção de FHC para garantir a impunidade da turma.
A decisão de Lula foi coerente com sua história, respaldada no Direito e reforça a tradição brasileira de braços abertos aos perseguidos políticos em outros países (exceção vivida apenas no período da ditadura militar, ela própria perseguidora).
Não se pode excluir a possibilidade de setores de extrema-direita tentarem reverter a decisão através de manobras comuns e típicas a esses foras da lei. A mídia privada, com toda a certeza, vai incentivar.
No apagar das luzes de seu governo o presidente da República assume a atitude de estadista num caso como este.
O que pouca gente sabe – é lógico, a mídia privada está no bolso e esconde – é que Berlusconi tem grandes negócios no Brasil e seus tentáculos chegam a setores do mundo institucional, com a prodigalidade típica dos corruptos.
Não há cabimento no argumento que temos nossos problemas e não devemos nos ocupar dos problemas dos outros.
Battisti está preso no Brasil, buscou o nosso País para refugiar-se de ações ilegais do governo de seu país, logo é um problema nosso.
Conceder ou não o status de refugiado político não muda as condições da saúde pública ou da educação por aqui.
Uma coisa não tem nada a ver com a outra.
Mas conceder o refúgio a Battisti reforça a grandeza da política externa brasileira e das tradições de paz e liberdade de nosso País.
São coisas distintas, portanto.
Esse é o típico argumento de quem não enxerga um palmo adiante do nariz, ou se enxerga, enxerga apenas o nariz e não o todo. Não se tem notícia de nariz que caminhe por si próprio.
Battisti foi partícipe de um processo de lutas que permeava toda a Europa na década de 60 e se estendia a todo o mundo de um modo geral. Um processo decisivo na construção de estradas passíveis de se começar a abrir picadas em meio a um Estado autoritário no seu todo, mesmo em supostas democracias como a italiana.
Lula fecha com chave de ouro seu governo – ao qual cabem críticas, evidente – ao conceder refúgio político a Cesare Battisti sem se intimidar com a cara feia de um governo que preside uma colônia norte-americana na Europa, o italiano e a Itália e é antes de mais nada uma reedição trágica dos momentos pornográficos dos césares, ou histriônicos do Duce.
E não poderia ser diferente, Berlusconi é banqueiro.
Mostra um Brasil diferente daquele de FHC. Um Brasil que a despeito dos problemas, das críticas que possam ser feitas, caminhando ereto, de pé, que se espera, aliás, continue a ser assim com Dilma Rousseff.