O morticínio dos palestinos de Gaza às mãos da tropa israelita chegou, desta vez, às duas mil vítimas — muitas das quais famílias inteiras mortas dentro de casa por bombardeamentos aéreos — e a muitos milhares de feridos.
A barbaridade teve desta vez requintes de malvadez e de desplante.
Israel combinou com o agora aliado Egipto (a ditadura militar implantou-se no Cairo também sob o patrocínio dos israelitas) fechar a fronteira sul de Gaza para ter toda a população palestina à sua mercê.
A tropa israelita incitava as populações a abandonarem bairros inteiros sob a ameaça de ataques aéreos, mas cercava esses mesmos bairros impedindo as pessoas de fugirem.
Bombardeou repetidamente mesquitas e escolas, nomeadamente escolas da ONU, onde milhares de pessoas procuravam refúgio.
Declarou tréguas "humanitárias" de poucas horas e, quando as pessoas acorreram aos mercados para se abastecerem, metralhou-as.
Apontou como alvo os combatentes do Hamas, mas a esmagadora maioria das vítimas são civis. Afirmou que o seu propósito era destruir os túneis por onde o Hamas transportava armas (mascarando o facto de ser também por esses túneis que a população é abastecida dos bens de que o cerco israelita a priva), mas arrasou dezenas de milhares de edifícios em todas as cidades da faixa de Gaza, entre eles centrais eléctricas, hospitais, fábricas, serviços públicos.
Um palestino da Cisjordânia, entrevistado por uma televisão quando ainda a carnificina ia a meio, resumiu tudo numa frase: "São os novos nazis".
Apesar dos crescentes protestos da opinião pública por todo o mundo, só muito depois de a ofensiva ser desencadeada e de os seus efeitos serem amargamente sentidos pela população de Gaza é que algumas vozes oficiais reclamaram "moderação" e "proporcionalidade" aos assassinos de Telavive. E só depois de se ter tornado escandaloso o ódio dos sionistas à população civil palestina — demonstrado nos crimes de guerra praticados — só então os governos ocidentais vieram clamar por um cessar fogo, e só então a comunicação social começou timidamente a ter reservas no apoio que desde início deu aos criminosos de Telavive. (*)
Foi sempre assim com os muitos ataques levados a cabo pela tropa israelita, numa atitude que só pode ser vista como uma conivência dos governos ocidentais com a política de genocídio praticada metodicamente pelo governo de Israel nas quase sete décadas de ocupação da Palestina. Incluindo, claro, o governo português, que sobre o assunto não abriu bico.
O pretexto, desta vez, foi o rapto e morte de três adolescentes israelitas — em Junho, na Cisjordânia — que Israel imediatamente atribuiu ao Hamas, pois claro. A retaliação não se fez esperar: um palestino de 15 anos foi raptado, torturado e queimado vivo por colonos israelitas. Mas enquanto tudo ficou por provar no que respeita ao rapto dos jovens israelitas, ficou inteiramente sabido quem são os bárbaros que assassinaram o jovem palestino.
A par disto, as forças israelitas, antes mesmo do ataque a Gaza, desencadearam de imediato operações militares que causaram vários mortos e fizeram mais de 300 presos, entre eles deputados palestinos.
O que seria um caso de polícia, transformou-se de imediato numa razão de guerra. Conhecendo-se a experiência em provocações dos israelitas, pode perguntar-se se não foram os próprios serviços secretos de Telavive a montar mais um estratagema que causasse a comoção da opinião pública e justificasse o ataque militar.
Com efeito, estas operações punitivas nunca foram acções militares gratuitas. Sempre cumpriram objectivos políticos precisos em momentos escolhidos. Desta vez, como sublinhou o embaixador palestino em Lisboa em entrevista à Lusa, Israel quer pôr fim ao governo de unidade nacional firmado em Abril entre a Fatah, influente na Cisjordânia, e o Hamas que governa a Faixa de Gaza.
Logo que o acordo foi assinado, o governo israelita declarou que as "negociações" com a Autoridade Palestina ficavam em causa. Disse o chefe de governo, Netanyahu, que a AP ou se entendia com Israel ou com o Hamas, mas não com ambos.
Israel tudo tem feito para manter os palestinos não só separados geograficamente como divididos politicamente. Tudo o que lhe cheire a unidade e acção política comum por parte da Palestina é tratado a tiro. O governo de unidade confere mais força à resistência diária dos palestinos e à reivindicação de estado nacional — direito a que Israel sempre se tem oposto. É contra este direito, uma vez mais, que o ataque a Gaza se dirige.
Este facto está patente também nas conversações que decorrem no Cairo. O governo israelita põe como exigência a "desmilitarização" de Gaza, o que significa a tentativa de desarmar as forças representativas dos palestinos de Gaza e assim quebrar a resistência à colonização da Palestina que se tem mostrado mais activa e mais problemática para Israel.
(*) O papel crucial que o sionismo desempenha como ponta de lança do imperialismo norte-americano e europeu no Médio Oriente ficou bem patente na forma como EUA e UE secundaram os argumentos terroristas de Israel. Como sempre, a comunicação social deu guarida privilegiada aos argumentos do governo de Benjamim Netanyahu e aos seus porta-vozes em cada país, mostrando também como o polvo israelita/sionista está bem infiltrado e condiciona quer os meios políticos quer de informação ocidentais. No caso português, foi escandaloso o acolhimento que jornais e sobretudo televisões deram a indivíduos disfarçados de jornalistas e comentadores, como Henrique Cymerman e Ester Mucznick, que na verdade não passam de propagandistas de guerra ao serviço de Israel.