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040615 imarquezColômbia - ANNCOL - [Alfredo Molano Jimeno, El Espectador] O chefe da Delegação de Paz das FARC falou sobre as tensões que a Mesa de Diálogos vive pelos fatos de guerra.


Numa das rodadas mais tensas nos mais de dois anos de processo de paz entre o Governo e as FARC, o chefe da Delegação de Paz da guerrilha explica que, após a morte de mais de 40 guerrilheiros na última semana, a confiança da Mesa está mal ferida e assinala que só um cessar-fogo bilateral pode ajudar a que o processo avance com maior celeridade. Também fala do assunto da justiça transicional, da Assembleia Nacional Constituinte e do avanço de um acordo sobre uma comissão da verdade. Afirma que o diálogo com os militares imprimiu um melhor ritmo à Mesa, e pede pela rápida instalação de um processo de paz com o ELN.

Se fala de que a Mesa entrou num momento de estancamento... O que há de certo?

É assim. Eu diria que estamos atravessando uma turbulência. Havíamos conseguido aproximar-nos numa visão em torno à comissão de esclarecimento da verdade. No ciclo anterior dissemos que esperávamos que nesta rodada poderíamos dar ao país a notícia de sua composição. Porém os fatos ocorridos no campo militar lamentavelmente adiaram este assunto e é que essa comissão vai nos mostrar as responsabilidades que cada quem tem. Se se vai falar de justiça, se necessita da verdade porque aqui se fala de justiça, porém aplicável aos "maus", mas não dos responsáveis supremos, que é o Estado. No dia em que o Estado assuma como o máximo responsável, creio que teremos começado a suprimir o caminho da guerra.

Há mais de um ano se discute o ponto de vítimas, por que tem parada a discussão?

O tema de justiça se atravessou como uma mula morta no caminho dos acordos. Há que remover esse obstáculo e dedicar-nos a resolver o tema das vítimas. Neste processo se deram coisas novas, como as audiências com as vítimas do conflito. Porém, ocorre que não se move nada a favor das vítimas. Enquanto discutimos o tema, continuam matando defensores de direitos humanos reclamantes de terra, continuam perseguindo aos líderes do movimento social. A Marcha Patriótica já leva mais de cem mortos.

Porém, ademais pusemos sobre a mesa uma combinação de propostas para discuti-las, que são mais de 140. Porém estão represadas ainda que, sim, houve alguns avanços. Agora estamos falando da comissão da verdade, que é um instrumento muito importante para levantar o freio à discussão. Ao mesmo tempo, estamos discutindo assuntos relativos ao fim do conflito, enfocados em dois aspectos: o cessar-fogo e a deixação das armas. Aí se está fazendo um bom exercício e ganhamos muito em confiança e, ainda que pareça incrível, tem havido uma grande sintonia entre os altos oficiais da Força Pública e os Comandantes guerrilheiros. A que se dá entre os guerreiros e estamos muito satisfeitos de poder falar com os destacados oficiais designados pelo Governo e com eles pudemos constatar que eles querem a paz como a querem a maioria dos colombianos.

Quando se fala de justiça, inevitavelmente, alguém pensa no cárcere, você crê que se isso se resolve se poderia avançar na paz?

O que ocorre é que se tem pretendido difundir que as FARC rechaçam as ideias de justiça transicional. Nós outros buscamos uma justiça combinada entre as partes. Entendo a justiça transicional como um acordo político. Porém, em Colômbia se tem dado que o Governo, de maneira unilateral apresentou, sem ter em conta a seu igual na mesa, se foi pelo atalho do Marco Jurídico para a Paz. Isso não deixa um bom sabor. Nós outros cremos que podemos encontrar uma fórmula de reconciliação sobre as bases de verdade histórica, justiça transformadora, reparação integral e não repetição. Creio que ali está a chave para sanar as feridas. Necessitamos remover as estruturas injustas que geraram o levantamento armado, como direito universal. Tudo isto está ligado a transformações estruturais, que estão contempladas na agenda de Havana. A paz da Colômbia não se resolve traçando linhas vermelhas.

Quais são essas linhas vermelhas que se apresentaram?

Diz o Governo que não está em discussão a política econômica, porém é que a Colômbia não pode estar condenada à injustiça, ao saqueio dos recursos naturais por parte das transnacionais, e dos políticos corruptos. Não nos opomos à extração mineiro-energética, porém a queremos a serviço do povo.

E no tema de sanções, que se viu como a noz do problema da justiça, quais são as alternativas que vocês apresentam?

Os colombianos devemos refletir sobre a mensagem que as vítimas nos trouxeram. Elas disseram que vinham despojadas de ódio e de vingança, a pedir-nos que não nos levantássemos da Mesa até firmar o acordo final. Isso é o que há que entender. Nos disseram que as benditas pesquisas dizem que a maioria pede cárcere para as FARC e alguém se pergunta se não estarão mal apresentados os questionários das pesquisas. Que passaria se lhes perguntam se estão de acordo com que a casta política corrupta vá para o cárcere? Nós outros não viemos a Havana para intercambiar impunidades. Há que abrir as portas à margem nacional de apreciação, que nos convida a fazer uma reflexão em torno às origens do conflito, porque um tribunal internacional não conhece nossa história, nossos costumes. Não sabem que aqui houve uma época de violência que produziu 300.000 mortos e não se pagou por eles nem uma missa. Há que extrair as fórmulas de nossa história e encontrar os responsáveis. Aí falaremos de justiça.

Porém, diga-me, quais são as fórmulas de justiça que vocês propõem?

O problema radica em pensar a justiça como um tema punitivo. O importante é levar adiante este processo e conseguir a paz. É um tribunal estrangeiro, que não conhece Guapi, nem Quibdó. Se é uma instituição razoável, tem que fazer-se a um lado por falta de elementos de juízo. Agora, a pergunta sobre o cárcere a devolvemos: pergunte aos dirigentes políticos, aos ex-presidentes, aos empresários. Será que eles estão dispostos a pegar cárcere?

Porém, que garantías jurídicas podem ter sem o aval da justiça internacional?

É que aqui se disse que com vigência do Tratado de Roma é impossível as anistias gerais e os indultos, porém isso não é certo. Onde está o documento que diz isso? Esse tema está aberto à observação dos diferentes países, porém, como em Colômbia há obcecados em colocar detrás das grades a guerra, punitivistas de última hora que inventam ficções jurídicas que dizem que se não cárcere não há nada. Porém, falemos de determinadores. Imagine-se a um general falando de falsos positivos, que vai dizer?, que é produto de uma diretriz presidencial, e o presidente vai para o cárcere? É que não se tem apreciado o assunto, porque este não é um processo jurídico, é um processo de paz.

Então vocês veem a Assembleia Constituinte como a única garantia jurídica dos acordos?

Se necessita de um cadeado jurídico e isso só o dá uma Assembleia Nacional Constituinte. Que seja o povo, o constituinte soberano o que diga de que maneira se resolve isto. Uma paz estável e duradoura tem que ser o resultado de um grande acordo político, no qual participemos a maioria dos colombianos e isso só se consegue numa constituinte.

Porém, como seria essa constituinte?

Se necessita que nos ponhamos de acordo em três aspectos: o conteúdo, a composição e a duração. Uma constituinte para a paz, para isso a queremos. Não para blindar ninguém. O povo é sábio e saberá resolver esta situação.

Explique esses três aspectos...

O conteúdo terá que ver com as ressalvas que não pudemos nos pôr de acordo na Mesa; também sobre os temas de discussão e das reformas ao sistema eleitoral, à justiça, à democracia etc. Em segundo lugar, temos que acordar uma composição. Nós outros propusemos que se criem circunscrições especiais para os que nunca foram ouvidos, por exemplo, que os campesinos, os jovens, os afros ou os indígenas elejam seus representantes. E a duração, que pode ser de seis meses. Aí está a constituinte, onde os guerrilheiros devemos marcar presença, derivada do próprio acordo. Isso abre um horizonte muito extenso.

E não é perigoso que nessa constituinte, em vez de ampliar-se, se apequene a democracia?

Estamos falando de um acordo político prévio. No fundo, é preciso estar louco para opor-se à paz. Suspeitamos da loucura de Uribe, porém talvez não o esteja. Nós temos que fazer mudanças estruturais em Colômbia. Não estamos dizendo que se imponha um modelo, dizemos que há que fortalecer a democracia. Por que não pode haver um representante dos trabalhadores na junta do Banco da República? É que estão acostumados à exclusão. Se pode adotar uma política econômica que dignifique o povo.

Que impactos tiveram na Mesa os últimos acontecimentos de guerra em Colômbia?

Estremeceram a Mesa e Conversações. Porém os que estamos neste processo sentimos que é necessário dedicar nossos esforços para superar este mau momento. Os garantidores do processo, Cuba e Noruega, expressaram sua preocupação por perder os acordos alcançados e sugerem trabalhar na desescalada do conflito e propõem a necessidade de avançar para o cessar-fogo bilateral e nisso damos uma resposta positiva.

A desescalada demonstrou que os únicos gestos duradouros são os acordados pela Mesa, e não as decisões unilaterais das partes...

Porém, o que podíamos fazer se o Governo se nega ao cessar-fogo bilateral aduzindo que outorgaria vantagens militares à guerra? Declaramos por várias vezes cessar-fogo unilateral, o último por tempo indeterminado. Foram cinco meses de cumprimento cabal, se evitaram muitas mortes e atos de guerra, permitimos que as multinacionais petroleiras fizessem sua devastação, porém o Governo aproveitou para desdobrar suas forças. Para ocupar territórios de controle guerrilheiro. Foram muitos os guerrilheiros mortos neste cessar-fogo unilateral.

Porém a morte dos soldados do Cauca foi a que produziu a reativação dos bombardeios...

Quem não vê esses episódios desde o ponto de vista militar não o entende. Isso foi em defesa própria. Houve um desembarque de tropas que avançavam contra nossas unidades, então se produziu este resultado. Agora o presidente diz que se cometeram erros militares, e isso terá que esclarecer. Então veio o ataque a Guapi, no qual morreram 27 guerrilheiros e isso acabou de derrubar o cessar unilateral e foi contra nossa vontade. O Governo nos provocou durante cinco meses. Pinzón fez até o impossível para sabotar este esforço e o conseguiu.

Como solucionar isso?

Com o cessar bilateral de fogos. É que nos mataram mais de 40 guerrilheiros, entre eles os comandantes Román Ruíz e dois delegados da Mesa que estavam cumprindo tarefas de pedagogia de paz em unidades guerrilheiras, que são Jairo Martínez e Emiro.

Isso em que afeta o plano de desminado humanitário?

Pois, em que, a cada vez que se vão a fazer estas operações, que exigem o translado de guerrilheiros da Mesa à Colômbia, os que estamos em Havana ficamos tensos porque pode surgir qualquer situação. Porém, o importante é que este acordo tem se levado de maneira muito responsável por parte dos generais que estão na Mesa. Porém a confiança está minada.

Que significa para a guerrilha trabalhar com seu adversário no campo de batalha?

Já estamos trabalhando juntos e para nós outros isso tem sido decisivo porque vai nos permitir fazer uma tarefa eficaz. Porém há algo absurdo em tudo isto e é que se tem pretendido que só a guerrilha semeia minas e não é. O Exército abandona artefatos explosivos. Há uns dias os plenipotenciários apareceram com a bota da calça arregaçada pela morte de uma menina que supostamente tinha pisado numa mina. Pois, vão se encarregar de desarregaçar a calça porque a informação diz que se tratava de uma granada de morteiro abandonada pelo Exército. E é que em Buenos Aires [Cauca] não há campos minados. Esperamos que comece seriamente o desminado para beneficiar as comunidades.

Vocês também falaram que nos bombardeios de Guapi foram exterminados os guerrilheiros, que provas têm?

Os sobreviventes ouviram seus companheiros feridos clamando por auxílio e os militares os eliminaram com tiros de misericórdia. Por isso pedimos que uma equipe de forenses internacionais nos informem o que se passou e seria bom que se fizesse o mesmo com o cadáver de Alfonso Cano, que foi assassinado em estado de indefensabilidade.

O que o encontro com altos oficiais da Força Pública tem contribuído com a Mesa?

Tem significado uma oportunidade muito grande para propulsionar o processo de paz. Entre guerreiros os acordos fluem com mais facilidade. Aí não há retórica. Um militar não pode mentir para um guerrilheiro, nem um guerrilheiro para um militar sobre assuntos do campo de batalha. Ademais, tem sido um bom exercício conhecer-nos. Isso nos tem permitido constatar que somos gente do povo, humildes, e se acrescentou a vontade de buscar o fim do conflito. Esta guerra tem sido entre pobres. Os guerrilheiros não ouviram os disparos dos filhos dos presidentes ou empresários. As batidas se dão nos bairros pobres.

A cada vez que se conhece uma visita de Timochenko a Havana, em Colômbia se arma um escândalo...

Se Timochenko viaja a Havana não é para reunir-se com Gabino, é para reunir-se com as FARC. Ele é o chefe das FARC e com ele se acordam as decisões sobre o rumo da Mesa, como o faz o Governo. Eles, a cada oito dias, vão à Casa de Nariño a prestar contas ao Presidente. Nós outros não temos essa possibilidade. É mais difícil que viajemos à Colômbia do que ele venha. Alguns se escandalizam, porém, então, como vamos tomar decisões para chegar ao entendimento com o Governo? Nós não temos um avião para ir falar com Timoleón, que tem que estar conduzindo os blocos no país.

Se falou de uma reunião entre Timochenko e Gabino, para as FARC é imprescindível que o ELN se incorpore ao processo de paz?

Sim, sem nenhuma dúvida. Necessitamos que o ELN contribua para a construção da paz. Tem muito o que dizer e se necessita para preparar o terreno para levantar o novo edifício da Colômbia.

Que falta para esgotar o ponto das vítimas?

Sentar-nos a redigir acordos. Nós não somos o problema, já apresentamos nossas propostas. Quiséramos que fosse o mais rápido possível, porém isto não se resolve com um cronômetro na mão. Oxalá neste tema de vítimas não se apresentem desacordos. E estamos de acordo em que se necessita acelerar a marcha da paz.

Novos ares em Havana

Depois de várias semanas de tensão gerada pela reativação do conflito armado em Colômbia, com a qual se deram importantes baixas tanto de guerrilheiros como de militares que puseram as negociações num ponto de não avanço, os negociadores do Governo e das FARC tomaram um novo ar na discussão e ratificaram na sexta-feira, numa rodada de imprensa, o compromisso de continuar com o diálogo até conseguir a firma do acordo para a terminação do conflito.

Com este renovado ânimo conciliador, se deu a chegada de dois novos negociadores do Governo: a chanceler María Ángela Holguín, a encarregada de articular os acordos com os compromissos normativos internacionais que o país tem, e o empresário Gonzalo Restrepo, quem tem como missão estabelecer estratégias para a reinserção laboral dos guerrilheiros que deixem as armas e evitar a alta porcentagem de reincidência delinquencial que os desmobilizados têm.

O histórico desminado conjunto

Um dos avanços mais importantes alcançados na Mesa de Negociações de Havana e que se pôs em prática sem estar firmada a totalidade do acordo é o desminado. O plano piloto, segundo disse o chefe negociador do Governo, Humberto de la Calle, foi na vereda El Orejón, em Antioquia, onde asseguram que há mais minas que população civil.

"É uma primeira mostra do que se pode conquistar mediante o trabalho coordenado, já que pela primeira vez um batalhão do Exército colombiano e as FARC em forma conjunta levam a cabo ações que favorecem a uma população afetada em forma dramática", disse De la Calle, quem também fez referência ao cumprimento das FARC quanto à entrega de mapas de localização das minas, sobre o qual assegurou que para isso estão os acordos, "para cumpri-los".


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