A Assembleia salientou que erradicar o analfabetismo, especialmente nos países pouco desenvolvidos, necessitava da cooperação mundial e que a sua completa erradicação seria um dos objetivos prioritários da comunidade internacional. Todos sabiam naquela altura que não era fácil lográ-lo. A partir daquela altura, cada 8 de setembro celebra-se o “Dia Internacional da Alfabetização”.
A “Galáxia Gutemberg” ficou deslocada pela “Galáxia Marconi”, e já estamos na era dos computadores. Porém, a milhões de pessoas no mundo não lhes chegou ainda a dita de colher um papel nas mãos e saber interpretá-lo. E muitíssimos mais milhões sabem ler, mas põem-se nervosos quando têm um papel nas mãos. E muitos mais não se põem nervosos porque nunca pegam num papel. É provável que tampouco possam representar o papel da sua vida nem ser eles mesmos. E assim, nunca hão chegar a ser pessoas.
Em 1958 a própria UNESCO definia que analfabeto absoluto era aquela pessoa incapaz de ler e de escrever, compreendendo-a, uma breve e singela exposição de feitos relativos à sua vida quotidiana. E que analfabeto funcional era aquela pessoa capaz de ler e escrever, mas que não tem o hábito de servir-se da leitura e da escrita para a satisfação de necessidades da vida quotidiana. Mais tarde apareceu de forma impetuosa no mundo desenvolto o iletrismo, esse neo-analfabetismo de jovens escolarizados, indicador do desajuste entre a hegemonia cultural do audiovisual e as formas tradicionais de socialização e aprendizagem. E federico Mayor Zaragoza, diretor-geral da UNESCO, chegou a dizer: “O mundo mais grato e mais seguro só será possível se os que adquirem e acumulam conhecimentos suficientes para construi-los são, ao mesmo tempo, capazes de comparti-los com a humanidade no seu conjunto (…). Só esta solidariedade humanista planetária, há abrir ou reabrir para milhões de seres humanos no mundo a possibilidade de aceder ao ato crucial da leitura, que lhes vai permitir adquirir as aprendizagens indispensáveis para um livre e rico exercício da sua criatividade”.
É importante analisar os dados sobre este problema. Ler e escrever é condição para viver de forma plena no mundo, mas o analfabetismo é um dos males do nosso tempo e está estreitamente vinculado à condição económica. Perto de mil milhões de pessoas, a quinta parte da humanidade, é analfabeta. Delas, 20 milhões estão nas nações desenvoltas –uns 2 milhões no Estado espanhol-; a grande massa regista-se na Ásia, África e América Latina. Em nenhum caso se contam os analfabetos funcionais, esses que esqueceram o que aprenderam. Nem aos que sabendo ler ou escrever, nem escrevem nem leem. A geografia do analfabetismo é um decalque da pobreza, salvo em escassas circunstâncias e países, como é o caso modelo da Cuba, país que ocupa o primeiro lugar no mundo na eliminação quase total do analfabetismo entre os seus cidadãos.
Três quartas partes dos analfabetos encontram-se na Ásia, mas é a África onde a percentagem é mais alta: a metade dos jovens e adultos são analfabetos. América Latina conta com um pelotão de 45 milhões de analfabetos que se mantém estável. As mulheres sofrem mais a escuridade do analfabetismo que os homens, e como exemplo temos a Índia. No chamado Terceiro Mundo, um em cada quatro homens é analfabeto e uma em cada duas mulheres não sabe nem ler nem escrever. Nos 33 países menos desenvoltos, um terço das pessoas é analfabeta. Mais de 100 milhões de crianças de 6 a 11 anos estão ainda hoje sem escolarizar e continuarão sendo analfabetos em próximas décadas, apesar dos intentos de erradicar o analfabetismo desde o ano 2000.
O caso da Cuba é verdadeiramente exemplar. Já em 1961 este país das Caraíbas foi declarado primeiro território livre de analfabetismo na América Latina depois de uma excelente campanha, cuja vigência chega mesmo hoje como grande esperança a mais de 25 países envoltos numa cruzada contra a ignorância. Por isto, para apoiar este novo capítulo da minha série, e lembrar o Dia Internacional da Alfabetização, que se celebra no mundo cada 8 de setembro, escolhi o filme mais adequado, titulado “O Brigadeiro”, realizado em 1977 pelo diretor cubano Octavio Cortázar. A sua ação decorre durante a campanha de alfabetização realizada na Cuba a princípios dos anos sessenta, e na qual intervieram como voluntários milhares de jovens e adolescentes.
FICHA TÉCNICA DO FILME:
CAMPANHA DE ALFABETIZAÇÃO CUBANA: UM TRIUNFO VIGENTE:
(Nota: O autor deste depoimento é jornalista da Redação Nacional da Prensa Latina).
Havana (Prensa Latina): Cuba foi declarada em 1961 primeiro território livre de analfabetismo na América Latina depois de uma campanha, cuja vigência chega hoje como esperança a 26 nações envolvidas em uma cruzada contra a ignorância. A diretora do Museu Nacional da Campanha de Alfabetização, Luisa Yara Campos, destacou à Prensa Latina o grande mérito da revolução de transformar 69 quartéis em escolas.
Esse passo, comentou, veio junto à necessidade de alfabetizar crianças, adolescentes e jovens, mas existiam poucos professores na nação caribenha. Daí que o dia 22 abril de 1960 o Comandante em Chefe Fidel Castro, líder da Revolução, convocou estudantes e trabalhadores a se transformarem em mestres voluntários. Em 26 de setembro de 1960 Fidel Castro anunciou nas Nações Unidas que em Cuba se realizaria uma campanha de alfabetização, que erradicaria o analfabetismo em menos de um ano, recordou a experiente professora. Esse desafio da nova Cuba -incrível para muitos- não escapou do ódio manifestado contra o Governo Revolucionário pelos Estados Unidos e de imediato apareceram as primeiras vítimas do terrorismo de Estado praticado por Washington, um deles, o alfabetizador Conrado Benítez, assassinado em 5 de janeiro de 1961 com apenas 18 anos de idade, lamentou a historiadora. Fidel Castro, durante o ato de convenção do quartel Leoncio Vidal na Cidade Escolar Abel Santamaría em Santa Clara em 28 de janeiro 1961, convocou 100 mil estudantes maiores de 13 anos de idade. Foram mais de 105 mil com uma idade média de 14 a 16 anos, ainda que tinha alguns com idades entre nove e 13 anos, além de dois meninos de sete anos com terceiro grau, acrescentou Campos. Neste empenho da Revolução participaram 268 mil 420 alfabetizadores, deles 34 mil eram mestres e o resto, donas-de-casa, aposentados, estudantes e trabalhadores, contou Campos. Ratificou que o verdadeiro protagonista da Campanha de Alfabetização foi o povo, que chegou aos lugares mais intrincados do país, os presídios e até aos barcos de pescadores.
Destacou a solidariedade internacional, pois a Cuba chegaram voluntários da Guatemala, Venezuela, Argentina, Bolívia, Peru, Haiti, França, Itália, Espanha e Estados Unidos. Um episódio -que faz parte da história da Campanha de Alfabetização- foi a fracassada invasão mercenária à Praia Girón (Baía dos Porcos) em abril de 1961, organizada pelo Governo dos Estados Unidos. Mas a agressão militar não deteve aquela batalha popular contra a ignorância e a Campanha de Alfabetização seguiu seu curso e pôs a prova o espírito revolucionário de seus protagonistas, ressaltou a especialista. Prévio ao ataque a Girón (Baía dos Porcos), em 15 de abril de 1961, foram bombardeados os aeroportos de San Antonio de los Baños e Ciudad Libertad com o objetivo de inutilizar a pequena força aérea do país e evitar sua resposta ao desembarque posterior. Bem perto do segundo aeródromo, nesse mesmo dia, um importante grupo de jovens partiu ao acampamento no qual receberiam um breve treinamento metodológico para realizar sua tarefa educativa.
Eles eram membros do destacamento Conrado Benítez, -cujo nome honrava ao alfabetizador assassinado por contrarrevolucionários- e aqueles jovens saíram quase com o início da batalha em Girón para alfabetizar camponeses iletrados. Quando os mercenários chegaram à Ciénaga de Zapata estavam ali 30 alfabetizadores em um plano piloto na zona, pois eram parte de um estudo que o governo antecipava para organizar aos 100 mil alunos que Fidel Castro convocou para esta tarefa de caráter nacional. Durante a invasão, dois deles -um de 14 e outro de 19 anos de idade- foram feitos prisioneiros pelos atacantes que integravam a brigada mercenária organizada e financiada pela Agência Central Inteligência dos Estados Unidos (CIA), afirmou a especialista. A despeito dos duros combates na Praia Girón, a Campanha de Alfabetização continuou seu curso e muitos de seus protagonistas que se encontravam próximos ao lugar estiveram dispostos a mudar seus materiais de ensino por um fuzil, recordou Campos. Mas a ordem de Fidel Castro foi clara: a campanha alfabetizadora nunca deveria ser interrompida por mais violentos que fossem os combates contra os invasores.
A Campanha cubana de Alfabetização multiplicou sua essência e Cuba participou desde a década dos anos 70 na cruzada de outros povos contra a ignorância. Daí a presença de professores cubanos na Nicarágua a pedido do presidente Daniel Ortega em seu primeiro mandato e em Angola à solicitação de um pedido do extinto presidente Agostinho Neto. O exemplo mais recente é a posta em prática em diferentes países dos métodos cubanos de alfabetização “Eu, sim posso” e “Eu, sim posso continuar”, que com elementos das cartilhas utilizadas em Cuba em 1961, já beneficiou 26 nações. Para este fim -prosseguiu Campos- o programa foi dotado com elementos audiovisuais, vocabulário adequado à cada país, e foi traduzido em vários idiomas e línguas originárias. Hoje assim como em Cuba -assinalou orgulhosa a diretora do Museu Nacional da Campanha de Alfabetização- erradicaram o analfabetismo, Venezuela, segundo país na América Latina, além da Bolívia e Nicarágua.
Mobilização internacional pressiona Unesco para adoção de método cubano de alfabetização:
Há alguns meses, vem se intensificando em encontros internacionais sobre educação de jovens e adultos o debate a respeito do método cubano de alfabetização “Yo, sí puedo”, aplicado em diversos países da América Latina e responsável, segundo o governo venezuelano, pela erradicação do analfabetismo naquele país. Por um lado, os governos cubano e venezuelano pressionam a Unesco para que o método seja adotado como o “programa global de alfabetização” no âmbito da Década da Alfabetização. Por outro lado, especialistas chamam a atenção que esse argumento seria incoerente com o que propõe a Década de Alfabetização das Nações Unidas.
A pesquisadora Rosa María Torres, ex-Ministra de Educação do Equador, posicionou-se a respeito em mensagem enviada à Comunidade Educativa, comunidade virtual de debate. Segundo ela, “não é possível pensar um ‘método global de alfabetização’. Quem trabalha e se especializa nesse campo vem afirmando há muito tempo que não existe e não pode existir ‘O’ método de alfabetização. Isto que vale tanto para jovens e adultos como para crianças (…) está expressamente dito no documento-base da Década da Alfabetização das Nações Unidas e na ‘visão renovada’ de alfabetização e de leitura e escrita pleiteada pela citada década”.
Enquanto isso, a Frente Internacional de Apoio ao programa contabilizava em sua página na internet (www.frenteinternacional.yosipuedo.com.ar) perto de 4 mil adesões a uma carta endereçada ao diretor geral da Unesco e argumenta que “se trata de um método acessível economicamente, didaticamente flexível, efetivo, simples e com resultados positivos a curto prazo”. Seus participantes realizaram nos dias 7 e 8 de setembro, na Bolívia, um encontro para discutir uma agenda de trabalho e o desenho de uma campanha internacional que “propicie a governos e organismos internacionais reconheçam e apoiem a aplicação do programa ‘Yo, sí puedo’”.
No Brasil, o vice-cônsul de Cuba e representante do Ministério de Educação daquele país, Adolfo Núñez Fernández, disse que “se está fazendo todo o possível para que a Unesco reconheça o ‘Yo, sí puedo’ como método ideal para ensinar a ler e escrever os quase 800 milhões de analfabetos do mundo”. Ainda que a Unesco não tenha se manifestado oficialmente sobre esse debate, chama a atenção o fato do Instituto Pedagógico Latinoamericano y del Caribe (IPLAC), elaborador do “Yo, si puedo”, ter sido agraciado esse ano com o Prêmio Rey Sejong, que anualmente destaca programas de alfabetização de adultos em todo o mundo. Em 2006, também foram premiados projetos do Paquistão, da Turquia, do Marrocos e da Índia.
É interessante notar que o debate internacional sobre a existência de um método ideal de alfabetização esteve de alguma forma presente na pauta da imprensa brasileira no começo do ano, quando o Ministério da Educação anunciou a reorganização das Diretrizes Curriculares Nacionais para as séries iniciais do Ensino Fundamental. Foi o ponto de partida para o início de uma polêmica sobre a forma mais adequada para o ensino e aprendizagem da leitura e escrita.
Sobre o método cubano:
Uma das principais caraterísticas do “Yo, sí puedo”, segundo Carlos Martinez, professor cubano responsável por acompanhar sua implantação no Piauí, é partir do que é conhecido pelos estudantes, que são os números, para entrar no que é desconhecido, que são as letras. “Isso faz com quem eles não esqueçam as letras”. Essa corresponde à segunda etapa do método, após as dez primeiras aulas dedicadas a familiarização, desenvolvimento da expressão oral e habilidades psicomotoras e garantia da representação gráfica dos números de 0 a 30. Nas aulas seguintes, aprende-se uma letra, que corresponde a um número, até se alcançar a apresentação de uma palavra ou idéia e produção de novas palavras e ideias.
Como já destacou a edição 82 do Informação em Rede, o método cubano formou as primeiras turmas brasileiras no início de 2006 em três cidades do interior do Piauí e, a exemplo de outras turmas alfabetizadas no âmbito do programa Brasil Alfabetizado, ainda não teve seu resultado avaliado. Segundo o vice-cônsul cubano, após essa experiência piloto, “o MEC ainda não informou se vai adotá-lo em outros estados. Estamos aguardando uma definição”.
TEMAS PARA REFLETIR E REALIZAR:
Depois de olhar este filme, utilizando a técnica de dinâmica de grupos do “cinema fórum”, debater sobre os aspetos fílmicos do mesmo, o roteiro e a linguagem cinematográfica utilizada pelo diretor cubano Octávio Cortázar, os planos, os movimentos de câmara, os “travellings”, os “flashs backs”, o uso do tempo e do espaço, a montagem e a trilha sonora e outros recursos fílmicos que aparecem na fita.
Organizar um debate-papo sobre a taxa de alfabetização dos países do mundo e analisar o mapa-múndi que aparece na Wikipédia.
Elaborar uma monografia sobre tão importante tema. Na mesma devem incluir-se mapas e fotos, textos, frases, pequenas histórias sobre campanhas destacadas de alfabetização em diferentes países e também métodos didáticos para alfabetizar o povo, como os de Paulo Freire, o cubano e o do nosso país da década dos sessenta-setenta. O trabalho terá que incluir também propostas e estratégias práticas, que podem ser realidade em aqueles países nos que a taxa de analfabetos/as ainda é muito elevada.