Depois do Rio, mostras itinerantes aconteceram em capitais de seis estados. Agora o Uranium Film Festival do Rio de Janeiro está atravessando o Atlântico e chega à Portugal. Entrevista com o escritor do livro "Energias Sem-fim", Professor António Eloy, de Lisboa, que está organizando o Festival no Porto, no final de Novembro - e em Janeiro, em Lisboa.
Norbert Suchanek: Extistem usinas nucleares em Portugal?
António Eloy: Não, neste momento, e graças a uma longa luta que vem desde 1974 (após a queda do fascismo que as congeminava na sombra). Temos um pequeno laboratório, que funciona em circuito fechado e as feridas sociais e ambientais das antigas areas de mineração de urânio. Tivemos que empreender uma dura luta contra o projecto de instalação de um cemitério de resíduos radioactivos perto da fronteira, em Espanha, assim como tivemos movimentos contra centrais na fronteira, que foram canceladas.
Mas o Estado espanhol tem atualmente 6 usinas nucleares em funcionamento?
António Eloy: Temos todavia uma a cem quilometros da fronteira (A central nuclear de Almaraz, na Província de Cáceres) com uma area em Portugal sujeita a planos de emergencia em caso de acidente contra a qual colaboramos com grupos espanhóis pelo seu encerramento. Também quero referir, porque também estive activamente envolvido, a luta travada pelo fim dos enterramentos no Atlântico norte de residuos nucleares, que afectavam águas sobre jurisdição portuguesa.
Portugal foi um dos primeiros países no mundo com mineração de urânio, que começou com a exploração da mina de Urgeiriça, em 1912. Quando foi fechado a última mina de urânio em Portugal?
António Eloy: Desde o final dos anos 70 que me manifestei localmente e a nível nacional pelo fim da mineração, tendo tido até nessa altura conflitos com os sindicatos que não queriam ouvir os perigos dessa indústria. Os tempos mudaram, as minas fecharam no final dos anos 90, tendo a empresa (Empresa Nacional de Urânio) fechado suas portas em 2001, já com incapacidade de escoar o produto que continua, ainda hoje, acumulado em armazém. Nos últimos anos, a comissão dos ex-trabalhadores tem estado muito empenhada na dignificação do trabalho por estes realizado, no acompanhamento dos problemas de saúde dele resultante e na recuperação ambiental de toda a zona.
Qual é a posição da população de Portugal sobre energia nuclear e mineração de urânio?
António Eloy: Segundo os inquéritos de opinião feitos a nível europeu e em Portugal, uma fortissima maioria é contra esta forma de produção de energia. Em relação à mineração, só existe uma jazida pequena, mas explorável (em Nisa) e a população local e o municipio tem sido contrários a essa exploração.
E a posição do Governo?
António Eloy: O governo não tem considerado no seu programa a nuclear e é omisso em relação à mineração de urânio. Neste momento de forte recessão não é previsivel que haja alteração do status quo.
Existe um risco de uma nova mina de urânio em Portugal, por exemplo, em Nisa?
António Eloy: Neste momento, de descida dos preços do urânio no mercado internacional e com a população local muito consciente dos impactos é altamente improvável.
O Uranium Film Festival em Portugal pode ajudar o movimento anti-nuclear em Portugal e na Península Ibérica?
António Eloy: Claro, o debate continua neste momento, e é necessário afrontá-lo e através dele ajudar a formar opiniões menos informadas, mostrar evidências documentais e também a partir delas elaborar sobre o futuro energéticamente sustentável.
Estamos numa encruzilhada em que a nuclear está a chegar ao seu fim de vida, que sera doloroso e com grande pressão para não se extinguir, paralelo à emergencia de novas energias e à eficiencia e conservação, que devem desde logo ser fundamentais. A geotermia, com novos recursos e potencialidades, as novas eolicas, o desenvolvimento de tipologias de pilhas solares muito mais eficientes, o mar, os recursos hidricos, articulados com novas formas de mobilidade, fala-se novamente de dirigiveis e modos suaves de transporte terrestre, são temas que decorrem desta discussão.
Portugal precisa de energia nuclear?
António Eloy: Claramente não. Os riscos financeiros da energia nuclear são incomportáveis, a necessidade electrica é nula, a perturbação ambiental enorme e a oposição social incontornável. Em nenhum dos vectores de análise esta é necessária.
Obrigado pela entrevista
Norbert Suchanek, Rio de Janeiro