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Carlos Serrano Ferreira

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Em coluna

Nicolelis e os Ratos Telepatas: implicações sociais

Carlos Serrano Ferreira - Publicado: Quarta, 13 Março 2013 21:25

Algumas pessoas são fãs de atletas ou artistas. Eu tenho de reconhecer, sou fã de Miguel Nicolelis.


Quem não sabe, ele é o neurocientista brasileiro que desde a Duke University, nos EUA, está a revolucionar as pesquisas sobre o cérebro e sua interface com as máquinas, e agora, com outros cérebros. Se alguém for capaz de fazer tetraplégicos andarem, será ele. E, até já prometeu uma data para isso: a abertura da Copa do Mundo do Brasil, em 2014.

A verdade é que muito do que será o nosso futuro está a ser moldado por Nicolelis. Por isso, é preciso estar atento a cada progresso, a cada passo dele e sua equipe. O mais recente foi amplamente noticiado, após sua publicação na conceituada revista Scientific Reports (acesse o artigo completo, em inglês, clicando aqui). Através de microeletrodos instalados nos cérebros de dois ratos, um localizado em Durham, EUA e o outro no Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edward e Lily Safra (IINN-ELS), no Nordeste brasileiro, conseguiu estabelecer a ligação entre o cérebro dos dois.

Não se quer aqui discutir o lado científico do avanço, incontestável. Contudo, é necessário refletir sobre as implicações sociais que pode trazer. É óbvio que não pelos ratos, mas pelas possibilidades que se abrem para uma comunicação telepática, mais um sonho antigo das ficções científicas que pode se concretizar – além da criação de supercomputadores de base biológica – ainda que num futuro distante. O próprio Nicolelis já aventou a possibilidade de no futuro ser criada uma internet baseada numa interface cérebro-cérebro, uma “brainet” (ainda embrionária nos testes com animais). Quais os cenários possíveis que se abrem com isso? Quais os riscos?

A ciência é capaz de produzir grandes avanços, mas o que determina seus efeitos é a utilização destes e sua regulação pela sociedade. Pois, é esta que deve – ou pelo menos, deveria – estabelecer os limites éticos da aplicação das invenções. No entanto, vivemos num mundo dominado pelos grandes monopólios econômicos, e as inovações são orientadas por eles, ao menos em sua aplicação. Por isso é necessário uma profunda reflexão, e para isso é necessário extrapolar as possibilidades a partir da realidade atual. Logo, se estamos a tratar de uma “brainet devemos partir do que existe, a internet.

Há uma utopia em torno à internet de que seria um espaço democrático. Bem, sua origem enquanto instrumento militar (ligada à DARPA) deveria ser o suficiente para mostrar o equívoco disto. Na fase inicial da grande rede, quando não era ainda um atrativo para as grandes corporações, havia um espaço democrático enorme. Mas, com o tempo… Não se pode esquecer de tudo que a Microsoft fez para tomar o mercado dos navegadores da Netscape. A realidade é que se há também espaços democráticos, a tendência monopolizante é cada vez mais superior. Mesmo que se pense no Twitter ou no Facebook como espaços de articulação de mobilizações democráticas, não se pode esquecer que estas mesmas redes sociais são espaços monopólicos. E, o que dizer do monopólio do Google entre os sites de busca – e cada vez mais abarcando outros setores do mundo ponto.com?

Qual o efeito disto? Um dos perigos concretos é o aprofundamento da ameaça atual à privacidade. Grandes monopólios não são conhecidos pelo seu respeito aos indivíduos e seus direitos. E, como provam as últimas crises, os governos nos moldes atuais são incapazes de controlá-los. Pelo contrário: são os Estados que são controlados pelos monopólios, e é aí que reside o perigo. Se eles são capazes de se esquecerem dos direitos de privacidade para criarem seus ardis de venda e de consumismo – afora as manipulações ideológicas dos monopólios de comunicação – o que fariam se houvesse uma rede ligando os cérebros? Ultrapassar as barreiras tecnológicas que seriam construídas para evitar o acesso às informações não desejadas pelos indivíduos – inclusive os pensamentos e memórias mais íntimos e concepções inconscientes – seria um objetivo dos grandes conglomerados, que com seus recursos humanos, financeiros e tecnológicos não tardariam a alcançar.

 Enquanto os grandes monopólios dominarem a sociedade, um avanço prodigioso como uma brainet seria um perigo gigantesco. O domínio sobre as mentes humanas que poderia ser colocado a serviço da manipulação dos grandes monopólios poderia estabelecer um futuro sombrio. Se lembrarmos de que por trás dos fascismos estavam os grandes conglomerados, se pode perceber que o tipo de mundo que seria moldado pela brainet se assemelharia muito com um futuro orwelliano, onde o passado seria remodelado na mente de cada indivíduo. É quase possível escutar o eco do lema “resistir é inútil” dos Borgs de star trek, grande metáfora da unidade mental sob direção fascista.

É preciso ressaltar que este cenário não é o único possível. Um cenário luminar pode ser pensado a partir dessa grande inovação caso mudanças profundas na economia e sociedade se processem. É sobre isto que tratarei num próximo artigo.


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