"Na África do Sul, quase 60 mil estupros são denunciados anualmente à polícia, o que é mais do dobro das denúncias na Índia (cuja população é 24 vezes maior que a sul-africana). E especialistas acreditam que o número real de estupros seja no mínimo dez vezes maior, ou seja, mais de 600 mil estupros ao ano."
Um quarto das mulheres são abusadas sexualmente antes dos 16 anos.
A ONG ainda aponta que, na maioria dos casos, a violência sexual é realizada por um homem que participa do cotidiano da vítima. Isso se dá em grande parte porque os homens crescem, em torno de 62% dos meninos com mais de 11 anos, acreditando que forçar alguém a fazer sexo não é um ato de violência, e os poucos casos que são denunciados às autoridades se perdem no descaso da polícia e acabam impunes.
Nos últimos 10 anos, de cada 25 homens acusados de estupro no País, 24 saíram livres da punição.
A AIDS é um dos graves problemas de saúde que atingem a população negra na África do Sul, além da malária, cólera entre outras. Mas é um drama particular para as mulheres.
Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), existem cerca de 33,3 milhões de pessoas infectadas com o vírus HIV em todo o mundo, das quais 15,9 milhões são mulheres. Sendo que cerca de 69% dos infectados estão na África Subsaariana.
A estigmatização do estupro
O estupro é uma das experiências mais traumáticas que qualquer pessoa pode passar. Juntamente com a reação natural de se sentir culpada, temos a sociedade, líderes religiosos e autoridades que sempre encontram todas as razões para culpar uma sobrevivente dessa violência. Por esta razão, a maioria das vítimas preferem não contar a ninguém o que aconteceu.
Uma das estigmatizações está em culpar a mulher pelo estupro, por sua maneira de se vestir, ou seja, usar uma roupa curta é motivo para querer ser estuprada, homens estupram mulheres porque elas não os satisfazem sexualmente, mulheres não devem andar sozinhas nas ruas à noite porque estão pedindo para serem estupradas.
Segundo a ONG Rape Crisis, que atua na África do Sul, é comum ouvir esse tipo de frase de homens: "Uma mulher em um lugar público é propriedade pública. Qualquer pessoa pode dormir com ela”, alguns homens até sugerem que as mulheres deveriam ter toque de recolher após às 19 horas. A atitude da polícia é um agravante nesses casos. Muitos policiais ainda traumatizam mais a sobrevivente com perguntas do tipo "Você gostou?". Ou apenas a maneira indiferente em lidar com casos de violação.
Essa opinião sobre estupro não é exclusividade apenas da sociedade sul-africana. Mas é preciso deixar claro que as condições subumanas a que as mulheres estão submetidas ali aumentam a violência e a impunidade contra as mulheres.
A lei de combate à violência doméstica e estupro existe na África do Sul desde 1998, mas existe uma barreira para as vítimas conseguirem juntar provas e dados necessários para incriminar o agressor. De acordo com o Departamento de Polícia sul-africano, a mulher que foi vítima de estupro, precisa realizar o exame de DNA entre quatro e seis horas após o incidente, não tomar banho e manter as roupas, não tocar na cena do crime, passar por um exame médico pericial e fazer a denúncia na polícia para fornecer o máximo de informações. A polícia tem um banco de dados de DNA, mas ela só consegue provas quando há quantidade suficiente de material genético (sangue, esperma e saliva, por exemplo) para análise após o estupro. E todos esses passos vêm se tornando uma barreira para que as mulheres possam fazer a denúncia e o agressor seja preso. E, segundo a ONG Rape Crisis: “Pela lei o estupro é considerado um ato grave e quem comete pode ficar preso até 20 anos, mas na prática isso raramente acontece e tudo aqui vira papel arquivado na gaveta”.
É preciso repudiar e denunciar toda e qualquer tentativa de minimizar e culpar a própria mulher pelos abusos sofridos. Mais do que leis repressoras precisamos mudar a sociedade que tenta atacar as conquistas femininas ao longo dos anos e fortalecer uma ideologia que despreza as mulheres como seres humanos dignos de todos os direitos.