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Shadi Ghrawi, ambientalista libanês: 'O controlo da água está atrás da ocupação israelita'

240510_ShadLíbano - Diário Liberdade - O repórter do DL no Médio Oriente, Ângelo Meraio, entrevistou o responsável da Greenpeace em Beirute. Eis a entrevista.


Shadi Ghrawi, libanês, nascido em Damasco (Síria) em 1982. Diplomado em Engenharia Informática pela Universidade Árabe de Beirute, activo no campo do ambientalismo desde 2002, principalmente na Greenpeace. Na actualidade trabalha na Greenpeace Mediterrâneo – responsável em Beirute da sua extensa equipa directiva. Shadi também está envolvido nos movimentos locais pelos direitos humanos desde 2006.

DL - Conhecemos alguma coisa sobre a história e a realidade sócio-política do Líbano. O que acontece com o meio ambiente? Quais são os principais problemas que o país confronta?

Shadi Ghrawi - Por causa da situação geral de instabilidade política no Líbano, tanto o povo como o governo não parecem atribuir aos problemas ambientais o peso que requerem. De qualquer maneira está a notar-se um progresso na consciencialização graças às emergentes ONGs ecologistas e com uma jovem consciência no cuidado do meio ambiente.

Os principais problemas ambientais no Líbano são:

- Gestão de resíduos sólidos – O conceito "zero resíduos" deve ser introduzido no Líbano, ao menos parcialmente.

- Poluição do mar – é necessária a aplicação da regulação existente e o estabelecimento de reservas marinhas.

- Poluição do ar – um sistema eficiente de transportes públicos é o primeiro passo para a redução da excessiva cultura da utilização do carro.

- Mudança do clima – Líbano necessita adoptar gradualmente recursos renováveis para a produção de energia.

- Pedreiras – devem ser introduzidas estritas leis reguladoras e aplicadas o mais rapidamente possível.

240510_greenpeaceDL - Quais de estes problemas são comuns no Médio Oriente? Na tua opinião, quais são os mais urgentes?

A maioria dos problemas de acima são comuns no Médio Oriente. Os governos no Mundo Árabe não parecem fornecer à avaliação ambiental, ao planeamento e ao seguimento a difusão que precisam. Tal comportamento supõe uma ameaça para o meio ambiente e a saúde das pessoas que habitam o Médio Oriente. Estes assuntos vão da gestão de resíduos – aterros, incineradoras e despejos no mar em lugar de separação, reciclagem e reutilização – até aos planos de introdução de mortais possibilidades para a energia nuclear no Médio Oriente. A energia nuclear é a mais perigosa ameaça verde, possuir "pacíficas" facilidades nucleares anima a mentalidade da corrida pelo armamento nuclear e provoca tensões entre os estados na tentativa de utilizarem a energia nuclear.

DL - A água é o principal assunto, considerado pelas organizações internacionais, como fonte de conflitos territoriais e políticos no futuro. Qual é a situação no Líbano e na região?

Pelo momento a situação da água é de suficiência no Líbano e a região. No entanto, se os padrões de mudança climática continuarem a ser os mesmos, então por volta de 2025 o Líbano começará a sofrer severas carências de água; isto poderá ser obviamente aplicável a outros estados da região. Como em anos anteriores, a necessidade de água doce continua a ameaçar a segurança numa região com crescentes demandas. Por exemplo, um dos incentivos de Israel por trás da ocupação do sul do Líbano é tomar o controlo sobre o rio Litani.

DL - A energia eléctrica é um assunto importante no Líbano. O país tem restrições de energia todos os dias. Por que acontece isto? Quais são as fontes de energia e quais são as consequências da utilização maciça de geradores?

Francamente, a produção de energia eléctrica no Líbano é de facto, um desastre! Isto não é por outra razão que a dependência de combustíveis fôsseis. Mais de 96% da electricidade no Líbano é gerada por plantas de petróleo, muitas das quais nem tão sequer possuem equipamento apropriado para a filtragem das suas emissões tóxicas. O restante 4% é partilhado igualmente entre hidroeléctrica e biomassa. Os cortes de electricidade que o Líbano vem sofrendo desde o fim da guerra com Israel, no verão de 2006, está a provocar o uso extensivo de geradores o qual contribui à dupla poluição aérea e acústica.

Líbano e toda a região é rica tanto em energia solar quanto eólica. Os governos não estão a fazer o mais mínimo esforço para subsidiarem tais iniciativas e tais práticas (parecido ao que acontece num nível global) apresentam a dependência dos combustíveis fôsseis como mais barata e fácil a curto prazo. No entanto, estas são causa da mudança climática e a poluição a longo prazo (fazem ouvidos surdos ao facto de que o sol e o vento são grátis!). Plantas de concentração de energia solar (conectadas às redes de energia nacionais) são uma das soluções ideais para as necessidades energéticas no Líbano e na região. Sem deixar de comentar que é uma vergonha que utilizemos electricidade para aquecer água enquanto a maioria do Mediterrâneo sul faz uso do aquecimento solar.

DL - Alguém que visitar o Líbano repara facilmente no bastante descontrolada construção imobiliária. Está questão tem sido também um problema histórico na Península Ibérica, especialmente na costa dos Países Catalães ou na Galiza. O que podes dizer em relação ao Líbano?

A guerra civil que durou 15 anos causou uma urbanização aleatória na maioria de núcleos de povoação do Líbano, especialmente em Beirute. Este tipo de práticas permanecem vigentes neste momento mas em forma de modernos e caros prédios que só podem permitir-se as pessoas por cima da classe média alta. E o que é mais grave, o património arquitectónico beiruti está a ser destruído em massa por projectos deste género. Simplesmente porque é uma alternativa mais barata e rápida derrubar um edifício antigo em lugar de renová-lo. Muitos economistas incentivam este tipo de projectos esquecendo completamente o significado do património histórico-arquitectónico na construção da história, espírito e imagem das cidades.

240510_ARDL - Que podes dizer em relação à biodiversidade? Qual é a situação e as políticas para a preservação da fauna e da flora?

A característica concentração montanha-costa do Líbano faz possível o abrigo de uma ampla variedade de biodiversidade tanto na terra quanto no mar. Felizmente há 5 principais reservas naturais no Líbano: Bentael, Reserva natural de Horsh Ehden, Reserva natural das Ilhas Nakhil, Floresta de cedros de Tannourine e Costa de Sour (Tiro). Existe informação online sobre estas reservas naturais.

Além do mais, não se dá qualquer atenção às reservas marinhas, por esta razão a Greenpeace tem desenvolvido um estudo sobre a biodiversidade nas águas costeiras libanesas. Vai ser feito público em breve em Beirute um relatório pormenorizado; os resultados listados no relatório serão incorporados numa proposta para estabelecer uma rede de reservas costeiras marinhas. A proposta da Greenpeace vai descrever as 8 mais importantes localizações costeiras que merecem protecção por meio de uma rede de reservas. As reservas marinhas são principalmente zonas intactas, em que não há despejos, que permitem ao mar regenerar o ecossistema e preservar as reservas de peixes; onde se proíbam, como é óbvio, as actividades humanas destrutivas.

DL - Qual é o impacto dos recentes conflitos bélicos na natureza?

Já referenciei alguns impactos ambientais dos conflitos nas perguntas anteriores (na pergunta 3 em particular).

Um dos mais recentes danos ambientais que têm acontecido é o despejo de petróleo do ano 2006. Mais de 15.000 toneladas de petróleo deitadas no mar quando as forças aéreas israelitas acertaram nos tanques de fuel da planta energética de Jiyeh, no sul de Beirute. Há mais informação sobre este incidente na internet. Greenpeace desenvolveu um completo seguimento do impacto ambiental (em mar e terra) da guerra do 2006.

DL - Em que medida é a situação politica importante para o meio ambiente da região?

Muito! Isto reflecte-se nas respostas anteriores onde remarco o papel vital dos governos para fazerem as coisas acontecer. A vontade política é chave em fazer da mudança ambiental uma realidade.

DL - Que gostaria de acrescentar?

Colocando o meio ambiente a um lado, e no nível da segurança. Se o Líbano adoptar uma política de produção de energia descentralizada, por um lado com o uso de painéis fotovoltaicos nos tectos para a produção de energia e pelo outro a utilização do sistema de aquecimento solar de água – desta maneira não é preciso a electricidade para aquecer água -, isto proporcionaria ao Líbano uma capacidade de resistência perante um possível ataque às centralizadas plantas energéticas.

DL - Como vê o futuro?

O futuro tem a ver com fazer da mudança uma realidade, não há mais tempo que perder!

Com os problemas ambientais a se tornarem verdadeiramente globais (mudança climática, falta de água, poluição, etc.) Não se pode perder mais tempo, de maneira nenhuma!

A razão pela qual eu acredito em organizações como Greenpeace é porque testemunha os crimes ambientais e demanda aos políticos uma actuação sobre eles.

Entrevista e tradução de Ângelo Meraio.

Beirute, 21 de Maio de 2010.


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