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J. André L. Gonçâlez, um galego à frente da ediçom lusófona do Marxism Internet Archive

120310_jandre03.JPGDL - Numha viagem recente, visitamos e entrevistamos o companheiro José André em Madrid, onde trabalha e reside. 

 


 

Histórico militante nacionalista e comunista, José André trabalha na emigraçom espanhola, mas nom perde contacto com a realidade e os anelos de liberdade do seu país, a Galiza. 

Incorporado ao projecto do Diário Liberdade desde o primeiro dia como colaborador na secçom de Opiniom, com ele conversamos sobretodo do seu papel à frente da secçom lusófona do monumental Marxism Internet Archive. Também doutras questons políticas que vam ser de interesse para quem nos lê...

Diário Liberdade - Nos últimos anos o teu nome passou a se ligar inevitavelmente ao do Apalpador, pois foi um estudo teu o que iniciou a recuperaçom efectiva deste personagem popular galego. Porém, pouca gente sabe da tua perseverante dedicaçom à compilaçom e classificaçom de textos marxistas em galego-português. Como é o teu trabalho no MIA (Marxism Internet Archive)?

O trabalho no MIA é um trabalho voluntário, quer dizer, nom está remunerado ninguém, nem mesmo o próprio presidente do MIA. Este portal oferece textos em mais de corenta línguas e agora tenta-se alargar a outras 15 mais porque já temos as pessoas voluntárias suficientes.

A secçom em galego-português nasce pola necessidade de acrescentar para umha parte muito importante da humanidade, de muitos milhons de falantes, como é a nossa área lingüística, o número de textos marxistas. Obviamente é impossível publicar todos porque a produçom é inabrangível, mas sim, no mínimo, pendurar os principais.

Este terreno estava ocupado por muito poucas pessoas e eu decidim entrar a formar dele. Envolvim-me no projecto por duas razons: primeiro, porque a Galiza fai parte da lusofonia e, segundo, porque, infelizmente, dentro da Galiza nom há muitos textos marxistas colocados.

A Galiza tinha de estar inserida nalgum lugar neste site, e claro, era um despautério que ocupasse um lugar peculiar dado a sua estrutura lingüística e mesmo dado a sua ligaçom económica entre o nosso país e o norte de Portugal. 

O meu trabalho é fundamentalmente de traduçom. Traduzo textos de várias línguas, nomeadamente a partir do francês e doutras línguas europeias que som nas que se escrevêrom os principais textos clássicos. Cousa normal, porque os escritores marxistas som marxistas porque nascem num ambiente determinado. Se Marx tivesse nascido na floresta brasileira provavelmente teria sido um bom chefe de tribo e seria lembrado nesses lugares por muitos anos mas nom teria desenvolvido o método marxista. Isto fai que os grandes textos estejam escritos em francês, inglês, alemám e italiano que som as línguas de cultura da maior concentraçom proletária. Essa é razom pola que no Estado espanhol nom há textos clássicos marxistas, porque nom há um proletariado importante até os anos vinte.

120310_jandre04.JPGDL - Quando foi que começaste a trabalhar no MIA e quais os vossos objectivos futuros?

José André - Comecei a trabalhar no MIA há doze anos. O primeiro texto que coloquei era um texto bem raro, um estudo de Ernest Mandel, marxista belga, responsável da IV internacional e que provavelmente era o melhor economista marxista da altura, após a morte do economista polaco Rodolsky.

O texto era umha análise pormenorizada sobre os prováveis ascensos do fascismo na Europa e sobretodo, que tipo de fascismo poderia surgir. Este texto foi escrito polos anos setenta, mas é um velho texto que mantém muita actualidade. Este foi, portanto, o primeiro texto publicado no MIA em galego, quer dizer, na variedade lingüística de português da Galiza.

A respeito dos nossos reptos no futuro, estou a traduzir agora três textos fundamentais: o Capital de Marx, Os dez dias que abalárom o mundo de J. Reed e Razom e revoluçom de Marcuse.

A traduçom do Capital é um trabalho muito árduo, muito difícil, porque nom é umha obra menor. Há muitas variáveis introduzidas por Marx e as categorias filosóficas que utiliza som muito complexas. 

O livro do norte-americano J.Reed relata de umha forma muito bela e emocionante o que foi a revoluçom de outubro de 1917.

E o terceiro livro é um ensaio onde Marcuse fai umha crítica ao Heggelianismo após Heggel ligando-o com o marxismo. É umha obra que tivo um impacto muito grande no ano 68, sobretodo na França, mas que ficou relegado ao esquecimento porque depois da queda do muro de Berlim os livros, as revistas marxistas, no melhor dos casos, ficárom recluídos às últimas prateleiras das bibliotecas particulares, quando nom destinados ao lixo ou queimados. Marcuse nom é um autor maior dentro do marxismo, mas sim é fundamental para compreender Hegel.

As críticas que hoje se fam do marxismo som cópias de filósofos de terceira linha como Fukuyama. Mas ningum tertuliano de televisom, rádio ou jornais leu Hegel nem Marcuse. Ora bem, Fukuyama sim leu Hegel e Marcuse.

DL - Como avalias o trabalho feito até agora?

O arquivo que maior número de volumes tem é o MIA feito em inglês. Por peso demográfico, por peso económico. Logicamente isto permite que haja mais pessoas com disponibilidade para pendurar textos em inglês.

A segunda secçom que mais textos tem, pasmai-vos, é a secçom sueca. A Suécia é um país enormemente avançado, umha enorme fábrica. Isso liberta muita gente para pendurar textos no MIA, para além de haver um caldo de cultivo para que isto aconteça.

A terceira é a de língua galego-portuguesa. Isto tem umha razom de ser. Fundamentalmente som brasileiros e brasileiras. O Brasil está-se a converter numha grande potência económica universal decisiva dentro do cone sul americano.  A distáncia económica que existe entre o Brasil e o resto de países da América Latina, ao sul do Rio Grande, quer dizer, de México até a Terra do Fogo é enorme.

Por exemplo Bahía é umha cidade praticamente proletária. Alguns bairros de Bahía tenhem tanta populaçom como o Chile.

Isto fai que o pessoal do MIA português seja fundamentalmente brasileiro.

Na península Ibérica somos dous. Um camarada de Braga, António, e eu que som o responsável para o português da Galiza.

Aliás, o MIA é a única organizaçom internacional até hoje, de ámbito universal, que considera de umha forma natural que o português falado ao norte e ao sul do Minho e além do Atlántico é o mesmo idioma.

120310_jandre01.JPGDL - No MIA apostastes na estratégia da unidade lingüística galego-portuguesa, tínhais claro desde os inícios este caminho?

Sim, sempre o tivemos claro.

Lembro que um camarada do MIA, que mora na Brasília, doutor em traduçom e que, logicamente, estudara fundamente a língua portuguesa e as suas origens, tinha certa curiosidade polo facto de os galegos e galegas escreverem numhas páginas de umha maneira, que lhe parecia muito espanhola, e noutras doutra maneira mais acorde com o sistema lingüístico galego-português. Mas ele nom deixava de distinguir que mesmo escrito em espanhol aquilo era português.  

DL - Apesar do teu inquebrantável compromisso com o povo galego, resides desde há muitos anos em Madrid. Que razons te levárom a abandonar o País?

A razom que levou todos os galegos e galegas e que há um século definiu brilhantemente Rosalia: “Galiza está pobre, para Havana me vou...”

Nom há oportunidades para os galegos e galegas trabalharmos na nossa Terra.

Hoje a Galiza tem por volta de três milhons de habitantes. Porém, emigrantes de primeira geraçom e de segunda geraçom, que ainda mantenhem os vínculos, há polo mundo outros três milhons. Há que perguntar-se por que um país tem mais de 50% da sua populaçom fora.

Nom é o caso da Palestina, polo de agora ainda nom nos bombardeárom, mas levamos séculos a sofrer um autêntico massacre demográfico e cultural por parte do Estado espanhol, cousa que avançou a partir dos anos 50.

Ao nom haver nengum tipo de oportunidade de trabalho dentro da Galiza fai que emigremos. Eu nom som um caso raro. Sofrim o mesmo que tantos e tantas compatriotas.

DL - Também és um militante histórico do nacionalismo galego. Como avalias a actual deriva do Bloco Nacionalista Galego?

Galiza historicamente tivo três grande impulsos de actuar politicamente dentro do Estado espanhol com a sua própria voz e na defesa dos seus próprios interesses. Quando falo de interesses falo de interesses materiais, reais, que a gente pudesse comer, ter umha vida digna...

O último impulso nasce com os últimos anos do fascismo. Em toda a Península Ibérica eram anos de mudanças políticas, lembremos que naquela altura acontece a revoluçom dos cravos, e na Galiza foi articulada através de umha ideologia, a mais avançada, que é o marxismo.

O nacionalismo galego mantivo mesmo depois da queda de muitas forças políticas de esquerdas dentro do Estado espanhol, umha posiçom firme de oposiçom às oligarquias e, portanto, na defesa das classes mais depauperadas e desfavorecidas dentro da Galiza.

Mas essa força política que era um continuum, UPG, AN-PG, BN-PG e BNG, é comandada nom polas classes trabalhadoras senom pola pequena burguesia. 

É evidente que o trabalhador manual é muito complicado que chegue a dominar esse aparelho tam complexo de interrelaçom de economia, ideologia, filosofia, pensamento político... para poder dirigir essa força. Daí que seja comum que acabe sendo dirigida pola pequena burguesia.

A pequena burguesia é umha classe social que está a abalar entre a grande burguesia e o proletariado. A nossa é umha classe autónoma, com interesses de seu, bem diferenciados. Numha determinada altura há um recuo por parte dos trabalhadores e a pequena burguesia achega-se à grande burguesia.

No congresso de Ourense mudam-se os alicerces do BNG e deixa-se-lhe toda a mao livre à direcçom. 

Essa é a defesa dos interesses daqueles que vam manejar o aparelho político. A partir desse momento, o camarada António Eiriz, que agora está na Bulgária, e eu abandonamos o BNG porque a deriva direitista era evidente.

Nós ao que dedicáramos muitos anos da nossa vida tantos esforços económicos, intelectuais, e de todo o tipo, era a formar umha organizaçom que servisse os interesses do povo trabalhador galego. Nom os interesses do senhor Rei, actual proprietário do semanário A Nossa Terra.

120310_jandre02.JPGDL - O que pensas do movimento popular soberanista que se tem articulado nos últimos anos por fora do BNG?

As forças soberanistas som forças que se sustentam, fundamentalmente, na classe mais avançada, o proletariado. O proletariado é o único que pode solucionar as cousas. Seja na Galiza ou na China. Porém, o proletariado está numha situaçom muito fraca. Entom, é lógico que as forças políticas que o representam sejam também fracas. Ora bem, está-se a reorganizar o proletariado, sobretodo polos embates da grande burguesia. Há que pensar que pretendem prolongar a idade laboral aos 67 anos para aumentarem a taxa da mais-valia. Contra isto vai reagir o proletariado. A reacçom do proletariado reorganizará e reforçará as forças políticas que o representam.

Forças como Primeira Linha, que penso que é a força mais lúcida neste momento da Galiza, vai reforçar-se com o reforçamento do proletariado, nom pola vontade e inteligência, que a tem, de militantes e dirigentes.

DL - O século XX foi um século de revoluçons proletárias triunfantes mas também de grandes derrotas para a classe trabalhadora. Como lobregas o século XXI?

As classes poderosas, as classes dominantes, sabem muito bem que tenhem a perder, as classes dominadas ainda nom sabem que tenhem a ganhar.

A burguesia sabe perfectamente que qualquer tipo de revoluçom nos EUA, centro fundamental do capitalismo e do proletariado mundiais, pois é o país que tem o proletariado mais numeroso e melhor formado, ou umha revoluçom na Alemanha ou no Japom, significaria a falência do conjunto do sistema e, naturalmente, a morte como classe social e como tipo de exploraçom económica. Esta realidade deu lugar à exportaçom destas contradiçons internas ao exterior.

A revoluçom triunfa na Rússia, na China, no Vietname, em Cuba, e menos em Cuba, há umha quebra de todo isto, porque som países muito atrasados. A única vara para poder estabelecer os intercámbios económicos no mundo é a produtividade. E estes som países com umha produtividade muito baixa.

Por exemplo, um africano que quer comprar um copo nom vai gastar 1€ se pode pagar só 0.5 cts.

EUA, a UE ou Japom podem fornecer-lhe esse copo a 0.5cts porque nestes países as máquinas por trabalhador som maiores. Portanto, as contradiçons entre um proletariado enormemente poderoso nestes países, enormemente produtivo, implicaria a queda mundial do capitalismo.

Ora bem, nos EUA as classes dominantes cuidam-se bastante disto. Nos EUA nom há praticamente organizaçons proletárias, na Grande Bretanha tampoco, no Japom estám bastante perseguidas, na Alemanha mesmo algumhas estám ilegalizadas.

No caso do Estado espanhol, onde é mais provável que haja umha revoluçom? Nas zonas mais deprimidas. Pode acontecer na Estremadura, nas comunidades autónomas de Castela e Leom e Castela A Mancha, na Galiza.

É mais complicado em centros industriais como Barcelona, Madrid, Bilbo ou Sevilha.

Um levantamento neste lugares seria fundamental porque implicaria a queda do capitalismo espanhol. Isto mesmo acontece em todo o mundo.

Em relaçom às revoluçons do século XX, a quebra dos países do chamado “socialismo real” vem porque era umha dupla mentira:  nem havia socialismo, quer dizer, a classe trabalhadora nom dominava o processo produtivo, nem era real. Era todo umha autêntica farsa montada arredor de umha série de dirigentes que no nome do marxismo defendiam os seus interesses particulares. Assim com Gorbachov nom tivérom problema em mudarem aginha de camisa.

DL - Muito obrigados polas respostas. Se quigeres acrescentar mais algumha cousa para os leitores, é o momento...

Oxalá haja no futuro centenas de pessoas a escrever para o Diário Liberdade e milhares de leitores e leitoras porque isso significaria que o dia da libertaçom nacional e social que tantos galegos e galegas sonhamos para o nosso povo estaria perto.


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