Foto: Apresentação da tocha dos Jogos Olímpicos Rio 2016, com a presença do governador do estado do RJ Luiz Fernando Pezão e do prefeito da cidade do Rio de Janeiro Eduardo Paes. - Pedro Ventura/Agência Brasília (CC BY 2.0)
A cidade torna-se, assim, a primeira na América do Sul a organizar as Olimpíadas e as Paralimpíadas. Aproveitando o ensejo, a peça publicitária veiculada pela Prefeitura do Rio de Janeiro tem feito uma deselegante e infantil ironia com os argentinos: “Estamos à frente da Argentina”, diz a propaganda.
Ironia que apenas demonstra a sofrível e mesquinha qualidade dos homens públicos em posição de poder na cidade e no estado do Rio de Janeiro.
Uma contrapropaganda, por outro lado, seria bem favorável aos hermanos, precisamente por não sediarem os Jogos. Senão vejamos.
Eis o “legado” dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016, até o momento: desapropriações de casas de milhares de famílias das classes populares, caos urbano – em que se torna cada dia mais difícil transitar no Rio –, degradação ambiental, especulação imobiliária e falência do caixa do governo estadual. Fiquemos exclusivamente com esse último.
Nos últimos dias, a rede de saúde mantida pelo governo do estado entrou em colapso absoluto. Falta de pagamento de funcionários, de higiene, insumos elementares e condições mínimas de funcionamento dos hospitais, tem implicado em suspensão dos atendimentos à população.
Escolas e universidades estaduais penando, meses a fio, com cortes de vagas públicas aos estudantes, pagamentos de trabalhadores terceirizados e suspensão de energia elétrica e telefones. Salários dos servidores congelados no curso do ano.
Os salários de novembro do funcionalismo estadual foram parcelados em duas vezes. O 13º salário foi pago, na quinta-feira. Detalhe: apenas 1/5 a que os servidores têm direito.
O governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) efetuou um empréstimo junto ao Bradesco, na ordem de R$ 500 milhões, afirmando pretender sanar o problema.
As decisões mais desencontradas e estapafúrdias têm sido oferecidas pelo governo estadual em relação ao 13º. A última estabelece que os servidores precisam ir ao banco assinar carta de empréstimo, a ser ratificada pelo governo.
O desrespeito com o funcionalismo e com a população, ao sistematicamente degradar os serviços públicos, têm sido a tônica.
Contudo, analisando as informações disponíveis nos orçamentos do governo estadual, desde 2010, é possível identificar uma razão importante para a penúria em que se encontram os serviços e os servidores públicos estaduais. Trata-se precisamente dos gastos com os Jogos Olímpicos e Paralímpicos.
No intervalo de tempo entre 2010 e 2014, o orçamento estadual reservou, de maneira indiferente, cerca de R$ 1 bilhão à Copa do Mundo e às Olimpíadas/Paralimpíadas.
Com menção exclusiva às Olimpíadas/Paralimpíadas, nos orçamentos de 2015 e 2016, estão previstos gastos estaduais diretos que, somados, giram em torno de R$ 2 bilhões. Especificamente para o orçamento do ano vindouro, está estimada a destinação de R$ 1.996.720.118.
Gastos que podem ser considerados realmente passíveis de melhorar a qualidade de vida do povo carioca, como os direcionados à conservação ambiental, são muito tímidos.
Não estão aí computados os incentivos fiscais, que incidem em uma desoneração tributária para os investimentos privados nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Incentivos que, igualmente, comprometem a arrecadação futura do Estado do Rio de Janeiro. Olimpíadas para quem? Qual o seu “legado”?
Somem-se aos valores mencionados R$ 7,07 bilhões de isenção fiscal às montadoras de automóveis e distribuidoras de bebidas, projetados no orçamento estadual de 2016, como noticiou O Dia.
Adicionem-se ainda cerca de R$ 1,3 bilhão para os setores de siderurgia, metalurgia, mineração, material de construção, energia elétrica, produtos alimentícios, farmacêuticos e de perfumaria, apenas nas regiões centro-sul fluminense e metropolitana.
Outros setores, em diferentes macrorregiões do estado, não deixam de receber as mesmas benesses às custas do povo e dos servidores.
A sistemática desoneração tributária concedida ao grande capital e os vultosos gastos envolvidos nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016, em boa medida, explicam o estado de falência a que chegou o Rio de Janeiro, sob a batuta peemedebista.
Roberto Bitencourt da Silva é historiador e cientista político.