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violencia obstetricaBrasil - Blogueiras Feministas - [Pamela Sobrinho] “Era manhã de sábado, a ansiedade para ter o meu bebê era grande. Já haviam me dito que iriam antecipar o parto, pois meu bebê estava ficando muito grande e a preferência era o parto normal.


As horas foram passando e nada. Tenho diabetes e ninguém, nem médicos ou enfermeiros apareciam no quarto para monitorarem minha glicose, se não fosse os membros da minha família não sei o que teria acontecido. No inicio da madrugada as dores começaram e a equipe médica havia desaparecido, quando solicitava uma ajuda as palavras eram as mesmas: é assim mesmo não há nada o que possamos fazer. Por fim, apareceu uma médica, quando ela foi fazer o exame de toque, justo no momento que eu estava tendo uma contração, pedi para parar porque estava doendo muito, ela, grosseiramente, tirou as luvas e foi embora, não voltou mais para me atender. Ao longo das horas vi enfermeiras ignorarem as pacientes.

Sabemos que as dores do parto pode ser bem difíceis, mas palavras amigas ajudam a confortar o momento, especialmente quando o medo toma conta. Mas o pior estava por vir, na sala de parto, meu bebê não nascia, não havia passagem suficiente no meu corpo para ele e, depois de 32 duas horas no hospital, 8 horas após o rompimento da bolsa, o médico disse ao anestesista que iria tentar o parto normal, mas que se não desse iriam tentar uma cesárea. Como assim? Eu estava no limite, o meu bebe não podia ficar mais na minha barriga e eles não sabiam se seria parto normal ou cesárea? Assim continuou meu parto, num determinado momento, a mesma médica que havia me machucado no exame de toque apareceu e subiu na minha barriga para ajudar o bebê a nascer, existe um procedimento médico correto para fazer isso, e não foi o que ela fez. Já ouvi casos de crianças que morreram por causa deste procedimento e meu instinto de mãe falou mais alto, gritei para ela sair dali, ela saiu.

No momento do nascimento meu filho não chorou, o desespero tomou conta de mim, o pior dos absurdos, não havia pediatra na sala de parto. Meu bebê engoliu liquido, ficou sem respirar e teve uma paralisia braquial (o braço direito não se movimentava). Sua nota ao nascer (de 0 a 10) foi 2, os enfermeiros salvaram sua vida, ele ficou 15 dias na UTI Neonatal. Por sorte não teve nenhuma consequência grave, fizemos 1 ano de fisioterapia, 3 vezes por semana, hoje ele mexe o braço, mas ainda fazemos acompanhamento neurológico e cardiológico para ver se não ficou nenhuma sequela. Digo que contamos muito com a sorte, ele é um guerreiro, porém, a violência obstétrica traz sequelas psicológicas e consequências financeiras, tudo poderia ter sido evitado se a equipe do hospital fosse mais humana”. (S.R.S. – Mãe).

A violência obstétrica é muito comum em nosso país, mas pouco se fala sobre o assunto. Recentemente, tivemos o caso de Adelir, que foi retirada de casa pela polícia e obrigada por decisão judicial a realizar uma cesárea. São inúmeras as denuncias de mulheres que tem seu parto em frente hospitais, nos corredores ou nos banheiros dos mesmos, por falta de atendimento, como foi o caso de Leilane Nascimento da Silva, de 22 anos, em abril no Rio de Janeiro.

Esse é um crime que pode atingir pessoas em todos os âmbitos da sociedade, porque ocorre tanto em hospitais públicos como particulares. Porém, sabemos que mulheres pobres, negras e indígenas são as principais vítimas, recebem o tratamento mais cruel, muitas vezes por só terem como opção o tratamento ofertado pelo sistema de saúde pública, onde o racismo é bem presente. A violência obstétrica ocorre de diversas formas, desde a rispidez no atendimento até a negação de procedimentos. É muito comum, por exemplo, que mulheres negras e pobres não recebam anestesia no parto normal. Entre as mulheres de classes sociais mais altas é comum o incentivo desnecessário a cesariana, por meio de pressão psicológica.

Segundo dados da Fundação Perseu Abramo, uma a cada quatro mulheres sofre violência obstétrica. Mas, o que essa violência significa? Significa agressões físicas e morais contra a mulher. Quando um médico ou médica faz um procedimento desnecessário como o exame de toque de maneira violenta, o uso do fórceps (uma espécie de pinça, utilizado na medicina obstétrica para auxiliar a retirada do bebê por alguma razão em que a contração natural não é suficiente para o parto) aparelho proibido no Brasil, a episiotomia desnecessária (o corte na região genital para aumentar a passagem para o bebê), a cesariana sem o consentimento da paciente, dentre outros tantos procedimentos realizados de maneira errada por profissionais durante o parto, além da violência moral, aquela na qual há xingamentos a mulher, como chama-la de fresca, por exemplo, ou negar atendimento.

Para resolver esses problemas há iniciativas como a Lei do Parto Humanizado (PL 08/2013) que já foi aprovado no Senado Federal e aguarda votação na Câmara dos Deputados. A Câmara também analisa o PL 5304/2013, que obriga os serviços de saúde a permitirem a presença da doula no parto. Alguns estados, como São Paulo, já sancionaram leis que instituem o parto humanizado, mas apesar das boas intenções, há ainda dificuldades para que a escolha da mulher seja respeitada por completo, como afirma Debora Delange em entrevista à Rádio Brasil Atual:

“Em algumas situações percebe-se que a mulher pode perder o direito de escolha quando o médico arbitra que há risco para o feto, por exemplo. Ou a mulher tem direito de escolha ou não tem. Se é alguém que vai arbitrar sobre alguma escolha, que seja ela própria. Hoje a restrição da escolha da mulher existe, mas não é institucionalizada. No momento em que aparece no texto da lei, dando essa prerrogativa para o médico, acaba institucionalizando a perda do direito da mulher.” Referência: Especialistas alertam para contradições da lei paulistana que garante parto humanizado.

Se a violência obstétrica é tão comum e deixa tantas marcas, por que as mulheres não denunciam? Infelizmente, o momento do parto é tido como um momento de dor e sofrimento. São pensamentos patriarcais que nos remetem a ensinamentos religisos de que a mulher deve sofrer as dores do parto para pagar o pecado de Eva. Por um pensamento e uma cultura antigos e desatualizados, por uma medicina desumana, milhares de mulheres e bebês morrem ou sofrem alguma violência física e/ou moral.
O machismo interfere na medicina e mais uma vez o corpo das mulheres, assim como sua autonomia, não são respeitados. A maioria das mulheres não denunciam esta violência por medo, por estarem num momento de fragilidade, por não serem apoiadas, por falta de provas e, o mais comum, pela falta de conhecimento do que é a violência obstétrica. É assustador ouvir os relatos do descaso e das situações de negligência.

Lendo e relendo sobre o assunto, encontrei um trabalho super bacana denunciando a violência obstétrica em forma de arte, chama-se: 1:4 Retratos da Violência Obstétrica, de Carla Raiter e Caroline Ferreira. É um projeto fotográfico que busca materializar as marcas invisíveis deixadas por esse tipo de violência e traz à luz uma reflexão sobre a condição do nascimento no Brasil e as intervenções desnecessárias que ocorrem no momento do parto.

Esse é um dos meios que as mulheres têm utilizado para denunciar tal crime, a principal forma de alertar é a divulgação do tema para debate e compreensão. Só assim, conhecendo nossos diretos e o que é necessário ou não no momento do parto é que podemos dar voz e autonomia as mulheres e além de capacitar melhor os profissionais envolvidos. Temos que entender que este não é um problema isolado, também faz parte da nossa luta diária de combate a violência contra a mulher e tem que ser uma das causas de luta do feminismo.

Pamela Sobrinho é economista no Sistema S, editora na revista Betim Cultural, blogueira, mulher, feminista, sem denominações religiosas, mas amante do respeito e da igualdade. Escreve no blog: O que há por trás da Economia.

Foto: Carla Raiter.


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